Por Adriana Cotias, Valor — São Paulo
31/10/2022 16h17 Atualizado há 12 horas
Os investidores estrangeiros avaliam com melhores olhos o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, candidato eleito para um novo mandato em janeiro, do que o atual presidente, Jair Bolsonaro, segundo Rogério Xavier, sócio-fundador da SPX Capital, que tem uma das suas bases em Londres.
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“Não me matem, sou só o mensageiro, mas o estrangeiro tem preferência por Lula por ele ter uma agenda mais amigável do ponto de vista do meio ambiente, das ideologias de gênero, da questão das armas e da política externa”, afirmou ao participar de evento da Empiricus Investimentos.
Ele comentou que a pauta ESG (de responsabilidade ambiental, social e de governança) não é balela, que lá fora os investidores a levam a sério. “O Brasil, por mais que pudesse ter razão nos argumentos, a maneira autoritária como colocava, que ninguém tem nada a ver com isso, que a Amazônia é nossa, foi afastando o estrangeiro. Quando olho para o Brasil de hoje — não tenho preferência política por nenhum dos dois —, vejo o investidor voltando com uma atenção maior sobre o Brasil.”
O fato de não caminhar para um regime autoritário, à maneira de Turquia ou Hungria, tirou da frente um dos riscos, e aproxima o país de seus vizinhos nas Américas, em especial os Estados Unidos. “[O presidente Joe] Biden [dos EUA] cumprimentou imediatamente o Lula após o resultado e praticamente a América Latina recebeu o presidente Lula com felicitações. A parte do relacionamento diplomático, que não estava tendo nos últimos quatro anos, se restabelece.”
Xavier fez a ressalva de que o novo governo terá uma tarefa dificílima pela frente porque vai encontrar um quadro fiscal delicado, e precisar muita habilidade para formar sua equipe. “Estou convicto de que ele sabe que foi eleito com ajuda da centro-esquerda, se não fizer um movimento caminhando para o centro, corre o risco grande de ter dificuldade à frente na condução do seu governo.”
Esse diálogo consiste em avançar na pauta de reformas num momento em que o cenário externo é desfavorável. “O mundo não vai nos ajudar, e a gente tem uma chance. O BC fez um excelente trabalho, no final colocou a taxa de juros inequivocadamente positiva em termos reais, vai trazer a inflação para baixo, vai colher os frutos em breve em relação ao objetivo da meta. Se conseguir colocar pessoas de qualidade na equipe ministerial, acredito que isso vá acontecer, o Brasil pode se sobressair neste mundo complicado.”
Na bolsa, ele afirmou que em conversas com seus colegas há a percepção que as ações estão extremamente atrativas. “O preço, aliado à estabilidade política do país por algum tempo, pode fazer o Brasil um grande atrator de investimentos. Tenho visão relativamente otimista com o que pode acontecer nos próximos meses, vejo disposição do investidor estrangeiro, o Brasil está ‘underweight’ [posição abaixo da média de mercado] na maioria das casas, o preço está bom, falta a política ajudar.”
Xavier prefere, porém, aguardar os nomes que vão compor a equipe econômica, bancos públicos e as principais autarquias, entrar mais atrasado na bolsa, do que “dar um cheque em branco”.
Por ora, o ativo considerado mais interessante a seus ver são as notas do Tesouro atreladas à inflação, que “oferecem uma oportunidade única porque o nível de taxa de juro real que o país paga é incompatível com a situação fiscal”. Se o Brasil seguir nessa toada, a inflação acabará sendo maior e vai comer parte do juro real implícito nos preços de mercado, disse. “Ou bem o Brasil faz as coisas certas e o juro cai pelo motivo bom, ou não consegue avançar e a inflação fica mais alta [levando] o juro real para baixo por dominância fiscal.”
Essa é a razão de o gestor da SPX ainda não ter exposição direcional em estratégias ligadas a juro nominal. Xavier calcula que o máximo de taxa real que o Brasil suporta pagar é de 3%, para uma economia que cresça a 2%.
Na cena internacional, ele mencionou haver preocupações de todos os lados. O estresse recente que se viu no Reino Unido mostrou que existe um determinado nível de juros que afeta a estabilidade financeira, com diversos bancos centrais defendendo que os Estados Unidos não conduzam a política monetária americana de forma isolada, levando em conta os efeitos em outras economias. Se o Fed fizer um ajuste menor do que o necessário para controlar a inflação, a curva de juros de médio e longo prazo não vai ficar inclinada para baixo, o que significa pressão para puxar os juros, deteriorando os preços dos ativos financeiros. Se for adiante no ciclo, pode criar uma crise financeira em outros países. “O Fed vai trabalhar a partir de agora com extremo cuidado, com um olho na inflação e outro nos efeitos colaterais.”
Trata-se de uma situação muito difícil de manejar na gestão de recursos de terceiros, disse Xavier, porque não é necessariamente a divulgação de um ou outro dado financeiro que vai mover os preços de mercado enquanto a autoridade faz o seu ajuste fino.
Fonte: Valor Econômico

