Com a percepção de que os ativos locais estão baratos e que ocorre um redirecionamento nos fluxos globais de investimentos, o investidor estrangeiro tem olhado cada vez mais com interesse para o Brasil. Entretanto, seja em ações, dívida ou fusões e aquisições (M&As), pelo menos em um primeiro momento, esse fluxo deve ficar concentrado nas grandes empresas, que na bolsa são as chamadas “blue chips”, mas que em movimentos como o atual também são apelidadas de “monstros de fluxo”.
“Quando a gente fala desses investidores estrangeiros que estão buscando oportunidades no Brasil, hoje eles estão buscando nomes bastante conhecidos, as empresas que têm um valor de mercado maior e que têm um nível de liquidez maior. Porque é uma maneira fácil de eles aportarem recursos e também tirarem recursos, se for o caso. Então, no curto prazo, o que a gente vai ver é na verdade uma concentração maior. Quem já tem uma liquidez grande, vai provavelmente aumentar. É esse fenômeno que muitas vezes a gente chama de ‘flow monster’ [monstros de fluxo]. Em um momento como este de mais volatilidade, mais incerteza, elas acabam atraindo ainda mais fluxo”, afirma Renato Ejnisman, chefe do SantanderCotação de Santander Corporate and Investment Banking (CIB).
Ejnisman chegou no SantanderCotação de Santander há três anos, após uma passagem de quase 16 anos pelo Bradesco. Sob sua batuta estão diversas verticais, como banco de investimento, tesouraria, corporate (relação com grandes empresas), “cash management”, corretora e emissão de dívida global (desde bônus externos a “project finance” e operações estruturadas). Aproveitando um investimento global maior do grupo na área de investimentos, ele também reforçou o time na operação brasileira, trazendo nomes como Thiago Rocha (ex-Credit Suisse) e Daniel Cunha (BGC). O Pipeline, site de negócios do Valor, noticiou que o SantanderCotação de Santander deve trazer também Thomas Krautz (vindo do Morgan Stanley), mas o banco não confirma essa informação.
Na semana passada, o SantanderCotação de Santander CIB realizou em São Paulo sua 26ª conferência anual. o Evento reuniu 120 das maiores empresas brasileiras, mais de 500 clientes do private bank e cerca de 500 investidores institucionais, incluindo 65 internacionais, o que foi um recorde. “Esse interesse do investidor estrangeiro é curioso, mas o Brasil está relativamente barato e há um redirecionamento nos fluxos mundiais. Antes você tinha uma concentração muito forte nos Estados Unidos. Essa concentração não vai deixar de existir, mas ela vai ser diluída, e parte disso vai para os emergentes. O Brasil tem hoje um ‘share’ dentro dos emergentes por volta de 4%, mas já foi muito maior, de quase 16%”, diz.
Ejnisman aponta que a participação do Brasil entre os emergentes hoje está muito próxima ou quase abaixo daquela do México, sendo que a economia brasileira é maior e mais diversificada. “Os investidores estrangeiros estão aqui porque eles querem entender onde estão as oportunidades”, afirma. Em emissões de bonds, ele afirma que houve alguma antecipação antes do tarifaço de Donald Trump contra o Brasil, mas que o pipeline para o segundo semestre ainda é muito robusto. “O mercado lá fora tem demanda, especialmente para as empresas mais conhecidas, os emissores frequentes.”
Em M&A, o executivo diz que o volume de operações deve crescer 10% este ano, e que, do pipeline do SantanderCotação de Santander, 70% são de operações internacionais. “O M&A tem um racional mais de longo prazo, de acreditar que, seja pelo aumento do nosso mercado consumidor, seja pela qualidade do nosso ‘management’, seja pelo histórico de respeito a contratos… a gente vê ainda muito interesse de empresas estrangeiras no Brasil”. Recentemente, o SantanderCotação de Santander assessorou, por exemplo, a aquisição dos ativos de cobre que pertenciam à BHP no Brasil pela Corex, em uma transação que avaliou os ativos em US$ 465 milhões (cerca de R$ 2,6 bilhões).
Já em ações, o mercado brasileiro está há quase quatro anos sem um IPO (oferta inicial de ações) e houve uma saída muito grande de recursos de fundos de ações e multimercados. Ainda assim, o chefe do SantanderCotação de Santander CIB acredita que parte desse volume pode voltar com uma rotação de setores dentro dos portfólios, por exemplo. “Num primeiro momento pode ser que tenhamos ofertas de follow-on, e aí no ano que vem voltemos a ver alguma atividade de IPO. Dá para afirmar que não vai mais ter IPO até as eleições ou no ano de 2026? Acho que é um pouco cedo demais para a gente afirmar isso. Mas é difícil ver com clareza algum IPO no curto prazo”.
Enquanto isso, o mercado de dívida doméstica vive um “tsunami de atividade” desde o ano passado, nas palavras do executivo, com uma busca muito grande por títulos incentivados, o que tem mantido os spreads bastante baixos. “Um cenário de juro a 15% já começaria a colocar em estresse uma empresa com uma relação dívida/ebitda de três vezes. Seria de se esperar que o investidor cobrasse um spread maior, mas tem tanta demanda, especialmente para emissões boas, que isso comprime os spreads.”
Na parte de corporate, Ejnisman diz que o cenário de juro muito elevado pode pressionar algumas empresas, especialmente em setores como o agro e varejo. Ainda assim, diz que não há nenhum caso novo mapeado de possível problema. “Hoje o principal elemento que a gente começa a olhar uma empresa com mais lupa e acompanhar de perto é a alavancagem. É um cenário para acompanhar de perto, mas não acho que tenha nenhum caso ‘jumbo’ para aparecer”, diz.
Fonte: Valor Econômico

