Por Daniela Chiaretti*, Valor — Dubai
04/12/2023 16h11 Atualizado há 20 horas
Para que o mundo em desenvolvimento e as economias emergentes se preparem adequadamente aos desafios da crise climática serão necessários US$ 2,4 trilhões ao ano, sem contar as demandas da China. Não só: os governos, o setor privado, os bancos de desenvolvimento e a filantropia terão que agir para permitir que o fluxo de investimentos seja acelerado e o sistema implementado.
Para tanto é preciso foco e criar plataformas que agreguem os esforços dos vários setores. Outro tópico será criar espaço fiscal e lidar com as restrições causadas pelo endividamento de países pobres e vulneráveis, que os impede de investir na emergência climática.
Outro ponto é dar centralidade aos recursos domésticos, ancorando a sustentabilidade na macroeconomia. A eliminação de subsídios que causam danos ao ambiente e taxas para o carbono podem dar receita e financiar a transição.
Essas são algumas recomendações de “A climate finance frameawork: decisive action on the Paris Agreement”, estudo lançado hoje na COP28, de Dubai, e copresidido pelo economista britânico Nicholas Stern, professor da London School of Economics (LSE).
Stern se tornou famoso em 2006, ao publicar o “Relatório Stern”, que considerou a mudança do clima como uma externalidade econômica.
O estudo lançado hoje na COP28 é o segundo relatório elaborado por um grupo de 30 especialistas em finanças climáticas (Independent High-Level Expert Group on Climate Finance – IHLEG) que receberam a tarefa dos presidentes de COPs de recomendar maneiras para estimular que as finanças públicas e privadas sejam destinadas a apoiar o cumprimento do Acordo de Paris.
O primeiro relatório do grupo foi lançado na COP27, em Sharm el Sheikh e estimou o volume de recursos necessário para assegurar uma transição energética justa, adaptação aos impactos climáticos e resiliência, perdas e danos, e à conservação e restauro da natureza. Para isso, seriam necessários US$ 2,4 trilhões em investimentos por ano em 2030, nas economias emergentes e em desenvolvimento, sem contar a China.
Isso quer dizer um nível de investimentos quatro vezes superior aos atuais. “O mundo está muito fora dos trilhos das metas do Acordo de Paris, como o Global Stock Take mostra”, diz o sumário executivo do relatório. “A razão principal é o investimento insuficiente em áreas fundamentais, principalmente nas economias emergentes e nos países em desenvolvimento.”
“Não investimos o suficiente para que isso aconteça. O que é que precisamos fazer acontecer? Uma transição energética, que é adaptação, resiliência, perdas e danos e, sobretudo, a conservação e recuperação da natureza? É isso que temos de fazer”, disse Stern em entrevista à imprensa.
“Com uma combinação de poupança interna e externa é perfeitamente possível. Estamos falando de financiamento com um propósito, que é o de cumprir as metas de Paris”, seguiu o economista. “A primeira coisa é desbloquear esses investimentos, que não se realizam.”
“Não se realizam porque a percepção de risco das pessoas é fazer coisas para obter receitas. Mas, sobretudo, não se realizam porque não existe financiamento para ajudar a reduzir, gerir e partilhar esse risco, incluindo as cláusulas de dívida”, continuou Stern.
O estudo diz que “apesar da clara oportunidade que investimentos em escala vão dar para um crescimento melhor e mais sustentável”, estes recursos estão travados”.
“Estamos apresentando aqui um caminho para algo muito diferente dos modelos sujos e disruptivos do passado, uma forma muito mais eficaz de reduzir a pobreza de maneira sustentável”, seguiu Stern. “O sucesso parece muito bom, para além de reduzir fundamentalmente os terríveis riscos das alterações climáticas. O fracasso parece realmente terrível. Se nos aproximarmos dos 2,5⁰ C ou 3⁰C estamos falando da destruição de civilizações inteiras, de centenas de milhões de pessoas que terão de se deslocar. Temos que ser claros quanto aos riscos que corremos se falharmos, mas não falhemos”, disse Stern.
Izabella Teixeira, ex-ministra de Meio Ambiente do Brasil e atual copresidente do International Resources Panel, é uma das autoras. “Esse relatório é importante para os processos econômicos fora das COPs”, disse Izabella, no lançamento do estudo. “Financia-se a perda de valor da natureza atualmente, não se financia a natureza pelo seu valor. Para o mundo em desenvolvimento, temos que colocar desenvolvimento junto a isso tudo.”
Ela fez uma provocação: “Para países que não têm alternativa para abandonar os combustíveis fósseis no curto prazo, temos que debater melhor como clima e finanças devem andar juntos, e como provocar uma saída dos maus subsídios e um aumento dos subsídios verdes. Para ter certeza que os investidores sejam atraídos para o caminho certo”.
- A jornalista viajou à COP 28 a convite do Instituto Clima e Sociedade (iCS)
Fonte: Valor Econômico

