Por Financial Times — Taipé
09/04/2024 15h00 Atualizado há 11 horas
Grandes fabricantes taiwanesas estudam criar uma segunda sede no exterior para garantir a capacidade de continuar operando no caso de um ataque chinês à ilha.
Os planos, na maioria dos casos ainda preliminares, colocam em evidência como os esforços mundiais para proteger as cadeias de abastecimento vêm levando as empresas com papéis cruciais nas redes industriais, em especial as de produtos tecnológicos, a fazer amplas mudanças.
“Temos clientes que estão estudando ou planejando criar segundas sedes”, disse Rauniei Kuo, sócio e chefe da área de administração familiar da KPMG, em Taiwan. As empresas são “industriais [e] atualmente estão procurando por um local para uma segunda sede no Sudeste Asiático, apenas para o caso de uma emergência acontecer em Taiwan, para que tenham um sistema de comando alternativo no exterior que possam ativar imediatamente”.
Há décadas, as fabricantes taiwanesas contratadas por terceiros têm sido a espinha dorsal das cadeias de abastecimento internacionais para dispositivos eletrônicos e seus componentes, como computadores pessoais, telefones celulares, computadores servidores e equipamentos de redes de telecomunicações. Também vêm se infiltrando cada vez mais nos mercados de automação industrial, dispositivos médicos e veículos elétricos.
De acordo com várias fontes envolvidas nas discussões, entre as empresas explorando opções para uma segunda sede no exterior estão a Lite-On e a Qisda, que fabricam componentes eletrônicos e dispositivos para consumidores e para os setores de telecomunicação, automotivo e médico.
A China reivindica Taiwan como parte de seu território e ameaça anexá-la, se Taipé resistir à unificação indefinidamente. Embora especialistas em Taiwan considerem um ataque chinês improvável a curto prazo, a crescente pressão de Pequim e as táticas de intimidação militar levaram muitas empresas estrangeiras e clientes de firmas taiwanesas a iniciar algum planejamento contingencial.
Pressionadas pelo aumento dos custos na China, pela guerra comercial com os EUA e pelo desejo dos clientes de uma “redução da exposição a riscos”, empresas como a Foxconn e a Pegatron, que são fornecedoras da Apple, vêm expandindo as operações no sudeste Asiático, Índia, México, EUA e Europa, em vez da China, onde grande parte de sua capacidade de produção costumava estar concentrada.
De acordo com o chefe das operações em Taiwan de uma firma de consultoria internacional, que não quis ter o nome divulgado, o principal foco de muitas empresas ainda é a diversificação geográfica da produção. Outras mudanças, como a criação de estruturas contingenciais, viriam depois. “Mas, na liderança dos maiores grupos, já começaram as discussões sobre segundas sedes de apoio”, disse o executivo.
Ele disse estar recomendando aos clientes que, no mínimo, repliquem algumas das funções da sede em uma segunda localidade. “Você tem que se perguntar, ‘se um conflito nos obrigar a interromper as operações em Taiwan por seis meses ou um ano, podemos sobreviver?’. Você não precisa ter [um departamento de] relações com investidores lá, mas não pode sobreviver sem [departamentos de] finanças, folha de pagamento e contas a receber”.
O diretor de finanças de uma empresa disse que eles estudam criar uma segunda sede em Cingapura, porque estão expandindo a produção em dois países do sudeste Asiático.
Outras fontes envolvidas em discussões semelhantes disseram que Cingapura, Japão, Suíça e Holanda são opções para receber segundas sedes. Elas descartam os EUA. Embora seja um grande mercado para empresas de tecnologia de Taiwan, o país não é um local adequado para segundas sedes por questões tributárias, segundo essas fontes.
A intensificação dos planejamentos de contingência se insere em uma mudança estrutural maior das empresas taiwanesas, que vem ocorrendo enquanto elas aprendem a operar em diversas novas jurisdições.
A Topco, fornecedora de produtos químicos e peças para fábricas de semicondutores, preparou um plano de dez anos para criar unidades adicionais em várias regiões e para contratar e treinar executivos de nível intermediário que façam uma rotação por diferentes países, disse o coexecutivo-chefe Charles Lee ao “Financial Times”. “Esses gerentes de nível intermediário serão executivos seniores daqui a dez anos”, disse.
Muitas empresas, porém, ainda vêm se mexendo com lentidão, segundo executivos, advogados e consultores.
“Embora sua agilidade tenha ajudado as empresas taiwanesas a sobreviver e a evoluir bem, elas não são boas em planejamento”, disse um consultor.
O fundador da fabricante de computadores industriais Advantech, Chaney Ho, disse que os exercícios militares da China em torno a Taiwan, em agosto de 2022, em resposta a uma visita da então presidente da Câmara dos Deputados dos EUA, Nancy Pelosi, a Taipé, desencadearam as discussões sobre a criação de segundas sedes. Ele argumenta, entretanto, que não há uma necessidade urgente para tais estruturas. “Você pode fazer quase tudo isso virtualmente”, disse.
A Qisda e a Lite-On não atenderam aos pedidos por entrevistas com altos executivos. Um porta-voz da Qisda disse que a empresa não estuda estabelecer uma segunda sede no exterior. A Lite-On não respondeu a um pedido para comentar o assunto.
Fonte: Valor Econômico

