Costa, do Cubo Itaú: presença em Montevidéu para atrair mais players da América Latina — Foto: Divulgação
Polos efervescentes de inovação globais atraem cada vez mais grandes multinacionais brasileiras com investimentos robustos em centros de pesquisas no exterior, especialmente nos Estados Unidos, China, Reino Unido e Alemanha. Esses hubs de inovação, mais do que atrair startups, são iniciativas de “contaminação e validação” para novas ideias, tanto para produtos como para novas rotas de processos.
Carlos Alberto Fonseca de Moraes, diretor-executivo de P&D Investimentos da farmacêutica EMS, destaca que o principal centro de inovação disruptiva (radical) da companhia está em Atlanta, nos Estados Unidos, com as suas controladas Brace Pharma e Vero Biotech. “O olhar da empresa está voltado para quatro principais frentes de inovação hoje: remédios genéricos de alta complexidade; inovação incremental (novas associações e formas farmacêuticas); biotecnológicos (com a Bionovis, empresa de alta tecnologia na qual a EMS possui participação) e a inovação radical, nos Estados Unidos”, elenca Moraes.
A EMS detém hoje o maior centro de P&D farmacêutico da América Latina, em Hortolândia (SP), com mais de 650 pesquisadores. Para 2025, os investimentos locais da EMS em P&D estão previstos em pelo menos R$ 700 milhões, quando o número de pesquisadores e PhDs deve saltar para 914, em Hortolândia. “O grande marco da inovação da EMS em 2024 aconteceu em agosto, quando inauguramos a Rio Biopharmaceuticals Brasil Ltda. (RBBL).
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Carlos Alberto Fonseca de Moraes, diretor-executivo de P&D investimentos da EMS: “O Lyberdia introduziu a EMS em uma nova era na neurociência” — Foto: Divulgação
A fábrica é a primeira com tecnologia de ponta para produzir e comercializar, no mundo, moléculas como liraglutida e semaglutida, destinadas ao tratamento de obesidade e diabetes tipo 2. A RBBL irá garantir à EMS inovação na produção de peptídeos, especialmente os análogos de GLP-1 injetáveis. O GLP-1 é um hormônio fisiológico produzido pelo intestino (incretinas), liberado na presença de glicose, que sinaliza ao cérebro que estamos alimentados, diminuindo o apetite. Ele aumenta os níveis de insulina e equilibra os níveis de açúcar no sangue”, diz Moraes.
O mais recente projeto de inovação da EMS, em 2024 foi o lançamento do Lyberdia, indicado para o tratamento do TDAH e transtornos alimentares, que, além de portfólio completo em cápsulas da molécula de dimesilato de lisdexanfetamina, trouxe também para o mercado nacional a versão em gotas (inédita no mundo), que permite individualizar a dosagem conforme a necessidade terapêutica de cada paciente. O Lyberdia introduziu a EMS em “uma nova era” na neurociência e reforça o portfólio da empresa para o sistema nervoso central e amplia a sua atuação em psiquiatria e neurologia.
As multinacionais brasileiras têm projetos de inovação de ponta no exterior que já conseguiram, inclusive, investimentos diretos dos governos locais. É o caso da centenária GerdauCotação de Gerdau, maior produtora de aço do Brasil. Segundo Gustavo França, diretor global de TI e digital da Gerdau, a companhia participa de um projeto nos Estados Unidos que pesquisa o uso de hidrogênio em escala industrial na produção de aço. A iniciativa recebeu um investimento de US$ 10 milhões — o maior valor já destinado pelo governo norte-americano a estudos de descarbonização sobre o uso do hidrogênio em escala industrial. A pesquisa está sendo conduzida pela Purdue University, com o apoio da Linde (líder global em gases industriais) e de empresas produtoras de aço. Os testes são realizados na planta da Gerdau em Monroe, Michigan.
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França, da Gerdau: uso de hidrogênio em escala industrial na produção de aço — Foto: Divulgação
Na Gerdau, as projeções de Capex estratégico e Ebitda potencial anual somam R$ 9,2 bilhões. Desses valores, R$ 3,4 bilhões já foram investidos e R$ 5,8 bilhões estão projetados para os próximos anos, até 2027. A Gerdau destina o equivalente a 5% de sua receita para a área de inovação.
A aproximação com o ecossistema de startups amplia a inovação aberta dentro da siderúrgica. Entre as iniciativas significativas está a Gerdau Challenge FIEMG LAB, em parceria com a Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais. Há ainda associação com outros parceiros, como o Distrito, a maior plataforma de transformação e inovação aberta do país, e o Conecta Caldeira, programa de inovação aberta do Instituto Caldeira, onde a Gerdau lança desafios corporativos para resolução por startups no ecossistema de inovação. Além disso, desde sua criação, em 2020, a Gerdau Next, tornou-se o braço de novos negócios, adjacentes ao aço, em quatro clusters estratégicos: construtech, sustentabilidade, mobilidade e tecnologia. “Nos últimos anos, temos ampliado a sinergia entre as empresas que compõem o portfólio Next e startups, que inclui, por exemplo, cinco empresas de propriedade integral e oito joint ventures com grandes empresas no Brasil, México e América do Norte. Através da Gerdau Next Ventures, com o fundo de ‘corporate venture capital’, já realizamos investimentos em startups brasileiras, mexicanas, colombianas e norte-americanas”, conta França.
A Gerdau está investindo também em um programa de conectividade pioneira na indústria de produção de aço, dentro dos aportes do conceito da indústria 4.0. Recentemente, finalizou a implantação da tecnologia 5G privada na unidade de Ouro Branco (MG), a maior operação da companhia no mundo. Com a tecnologia 5G, houve um salto na digitalização da empresa, o que permitirá à Gerdau expandir seus investimentos em avanços como veículos autônomos e telecontrolados, internet das coisas e inteligência artificial.
Outra multinacional, a WEG, de Jaraguá do Sul (SC), mantém seu ritmo de investimentos anual em P&D em 2,6% da sua receita líquida. Em 2023 esse montante foi de R$ 832,5 milhões, segundo Rodrigo Fumo, diretor-superintendente da WEG Motores Industriais. Desde 2020, a WEG iniciou mais de cem projetos em parcerias com universidades do Brasil e do exterior, principalmente na Alemanha, China, Estados Unidos e Portugal. O foco de inovação dessas parcerias são mobilidade elétrica, soluções digitais e conectividade, eficiência energética e industrial, energias renováveis e soluções sustentáveis.
No momento, em andamento na inovação na WEG, estão os motores ultracompactos com uso de material nanocristalino (parceria com a CBMM, líder de nióbio). Esses motores de fluxo axial apresentam projeto compacto e, nos testes, o material nanocristalino com nióbio reduziu em 53% as perdas totais do motor, aumentando em 6,7% seu rendimento. Há também projeto de aerogerador (eólico) de 7 MW (parceria com a Petrobras), que se tornará a maior máquina em operação no mercado brasileiro. Outra parceria é com a Horse, para aprimoramento da tecnologia Range Extender, que combina a propulsão de um veículo elétrico (EV) com um motor de combustão interna para comerciais leves. A WEG possui atualmente 32 centros de pesquisa e customização de produtos espalhados pelo mundo com cinco mil engenheiros.
A centenária Suzano, líder global de celulose, tem sete centros de pesquisa, sendo quatro no Brasil e três no exterior: Limeira (SP), com foco em biorrefinaria; Aracruz (ES), com foco no desenvolvimento de celulose; Jacareí (SP), com foco em P&D florestal; Itapetininga (SP), unidade da nova subsidiária Futuragene, de biotecnologia florestal; Burnaby (Canadá), voltado a biorrefinaria, como o desenvolvimento de aplicações para lignina celulose microfibrilada; Rehovot (Israel), destinado a estudos avançados em biotecnologia florestal; Xangai (China), inaugurado em 2023, de desenvolvimento de soluções para clientes na Ásia e conexão ao ecossistema de inovação chinês. A Suzano emprega 195 cientistas e PhDs na área de P&D, sendo 30 deles no exterior, e gasta 1% da sua receita líquida em inovações.
A vocação florestal da Suzano a levou expandir sua atuação para produção de fibras têxteis a partir da árvore como alternativa natural ao poliéster, derivado do petróleo, e ao algodão. “Nesse segmento temos uma joint venture com a finlandesa Spinnova, chamada Woodspin, e neste ano adquirimos participação na Lenzing, empresa austríaca especializada em fibras sustentáveis. Também adquirimos da Pactiv Evergreen duas fábricas localizadas nos Estados de Arkansas e Carolina do Norte, nos Estados Unidos”, enumera Fernando Bertolucci, vice-presidente-executivo de sustentabilidade, pesquisa e inovação da Suzano, que destina 1% da sua receita líquida anualmente para P&D.
Na Volvo, baseada em Curitiba (PR), o maior quinhão dos investimentos no Brasil é para P&D. Entre 2023 e 2025, os aportes programados são de R$ 1,5 bilhão, voltados principalmente para o desenvolvimento de produtos e serviços, além de melhorias no complexo industrial de caminhões, ônibus, motores, transmissões e cabines. “O maior montante está indo para projetos de descarbonização, com veículos pesados elétricos ou movidos a combustíveis menos impactantes, como o biodiesel”, comenta Alexandre Parker, diretor de assuntos corporativos da Volvo.
Entre os projetos inovadores “nascidos no Brasil”, está o primeiro ônibus urbano biarticulado elétrico do país, que será produzido no Paraná a partir de 2025 e que foi desenvolvido pelas engenharias brasileira e sueca. Batizado de BZRT (Bus Zero Rapid Transit), é o maior veículo elétrico do mundo (até 28 metros/250 passageiros), com zero emissões de CO2. A fábrica de Curitiba será a base de exportações desse modelo.
Um dos maiores “hubs” privados do Brasil, o paulistano Cubo Itaú, inaugurou em setembro o Cubo de Montevidéu para atrair mais atores do ecossistema da América Latina. O Uruguai foi escolhido, segundo Paulo Costa, CEO do Cubo, pelo seu potencial de casos de startups bem-sucedidas como a dLocal, o primeiro unicórnio do país que agora tem capital aberto e demonstra bom desempenho na Nasdaq. Outro passo importante foi o lançamento do Cubo AI, hub em colaboração com AWS, Microsoft, Itaú, Google, Nvidia e Oracle e apoio da McKinsey & Company, cujo objetivo é acelerar o amadurecimento do ecossistema por meio do fomento da adoção da inteligência artificial generativa. O Cubo AI terá quatro pilares: o primeiro focado em conteúdo para educar o público sobre as possibilidades dessa tecnologia; o segundo são iniciativas práticas para execução de testes e trocas de experiências. “Olhamos com mais atenção para 11 setores por meio dos hubs: Cubo Agro, Cubo AI, Cubo Smart Mobility, Cubo Construliving, Cubo Health, Cubo Logistics, Cubo Retail, Cubo Education, Cubo Fintechs, Cubo Maritime & Port e Cubo ESG”, informa Costa.
Fonte: Valor Econômico