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A taxa de desemprego caiu no trimestre móvel terminado em agosto para 6,6%, menor patamar em mais de uma década, enquanto a abertura líquida de vagas com carteira assinada chegou em 232.513 em setembro. Os dados mais recentes da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (Pnad) e do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) indicam um mercado de trabalho bastante aquecido, mas economistas alertam esse dinamismo pode ser ainda maior, sugerindo que o aperto monetário retomado pelo Banco Central talvez seja insuficiente para controlar a inflação.
Isso porque, paralelamente à trajetória positiva do emprego, os rendimentos vêm crescendo a taxas ainda mais altas, especialmente quando se consideram horas trabalhadas, alerta o economista Daniel Duque, do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV Ibre). Os dados foram constatados em um levantamento sobre mercado de trabalho feito pelo economista para a última edição do Boletim Macro, de setembro.
Duque argumenta que essa alta se deve a uma tendência generalizada de redução da jornada média nos últimos anos, puxada especialmente pelo setor informal. No universo dos empregos sem carteira assinada, a renda por hora trabalhada cresceu 18,8% em termos reais desde o início de 2022, frente a 13,4% no setor formal. Em termos anuais, esses percentuais significam um crescimento médio de 7,1% e 5,8%, respectivamente.
Os serviços domésticos e de alojamento e alimentação no mercado informal foram as atividades com maior redução de jornada e, consequentemente, alta da renda. Enquanto serviços domésticos tiveram diminuição de 3,4% da jornada e alta de 7,9% da renda, os de alojamento e alimentação viram o tempo de trabalho cair 1,5% e a renda crescer 14,8%.
Serviços no setor formal como educação e saúde e administração pública tiveram crescimento da jornada média de 1% e 0,7%, respectivamente, e aumento da renda de quase 20% cada.
“Todos os sinais apontam para uma situação de bastante aperto do mercado trabalho. Primeiro, vemos os salários em si crescendo bastante. Além disso, as horas trabalhadas estão caindo. E caíram significativamente no último ano para algumas ocupações, o que mostra que o salário-hora está aumentando ainda mais”, diz Duque. “O exercício que fiz mostra que o aumento da renda é maior quando consideramos que as pessoas têm trabalhado menos nos últimos dois anos.”
Ele diz que a evidência de redução de jornada é mais forte no setor informal porque nele é mais fácil de se ajustar o número de horas trabalhadas. Além da redução da jornada, um outro elemento que explica em parte por que a hora ficou mais clara no mercado informal é a expansão de programas sociais, argumenta.
“Os trabalhadores agora precisam de um salário maior para aceitar um trabalho”, diz Duque, ao se referir a um salário que supere o benefício recebido. “Os programas têm um peso, mas sem o mercado de trabalho aquecido isso não ocorreria. Os dois elementos, portanto, explicam o cenário atual.”
Para Lucas Assis, economista e analista da Tendências Consultoria, o rendimento médio mensal real habitualmente recebido no trabalho principal mostrou alta significativa em muitas categorias no trimestre de junho a agosto, na comparação com o mesmo período do ano passado.
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Na indústria, o crescimento foi de 7,3%, ou mais R$ 215, na construção, de 6,3%, ou mais R$ 148. No comércio, reparação de veículos automotores e motocicletas, a alta foi 4%, ou acima de R$ 103.
Em transporte, armazenagem e correio, o crescimento foi de 4,8%, ou mais R$ 138, em administração pública, defesa, seguridade social, educação, saúde humana e serviços sociais, houve alta de 4,6%, ou acima de R$ 196. Outros serviços subiram 6,7% (mais de R$ 156).
Na categoria com carteira de trabalho assinada houve crescimento de 3,4% (R$ 99), enquanto na sem carteira, a alta foi de 8,4%, ou mais de R$ 173. Empregados no setor público, incluindo servidor estatutário e militar, tiveram crescimento de 3,4%, mais do que R$ 159, e os por conta própria, alta de 7%, acima de R$ 171.
“Em termos conjunturais, em momentos de expansão da economia, há maior oferta de postos de trabalho relativamente melhores, ampliando o número de recém-contratados com aumento salarial, em decorrência da migração proveniente de postos de trabalho piores”, diz Assis.
“O quadro atual, embora positivo para a demanda, intensifica desafios futuros, como a escassez de mão de obra e os riscos inflacionários. Não por coincidência, o aquecimento do mercado de trabalho é um dos fatores que justificam o recente ciclo de aperto monetário.”
Os indicadores de superaquecimento do mercado de trabalho acendem um alerta em relação à inflação futura e ao ciclo da taxa básica de juros, afirma Leonardo Porto, economista-chefe do Citi Brasil. Para ele, os dados mais recentes são inequívocos na direção de mostrar não apenas que o mercado está muito aquecido, mas também a ausência de sinais de desaquecimento no curto prazo.
“O desemprego em agosto chega à mínima histórica, no número dessazonalizado, com salários nominais subindo 9,6%, o que significa uma alta real de 5%. Números do Caged de agosto mostram criação de vagas cima de 100 mil, o que significa patamar acima do necessário para estabilizar o desemprego, sugerindo, então, que essa taxa continuará caindo”, diz.
Somam-se a isso, diz, pressões salariais como mais uma evidência de que talvez estejamos nos aproximando do limite da ociosidade do mercado de trabalho. Esse cenário, afirma, levou a autoridade monetária a iniciar a alta de juros em setembro, ciclo que deve continuar.
“É inequívoco que subir os juros continuará ocorrendo. A dúvida é sobre a velocidade e o tamanho dessa alta”, diz.
Porto prevê que o ciclo de alta que começou em setembro seja de 150 pontos base e se estenda até janeiro, quando a Selic atingiria 12%. Na próxima reunião, em novembro, a alta esperada é de 50 pontos.
Esse cenário, diz, contempla apreciação do real, por causa da diferença da taxa básica de juros do Brasil e de países ricos, e queda das expectativas de inflação – cuja mediana subiu para 4,35%, frente à meta de 3%, segundo o Relatório de Inflação do Banco Central, divulgado no fim de setembro.
Não estão descartados, contudo, riscos que possam levar a um aperto da política monetária ainda maior.
“Até agora, a apreciação do câmbio foi muito tênue e ainda não houve queda na expectativa de inflação. Isso eleva a chance de o Banco Central ter de acelerar o ritmo de alta para 50 pontos na próxima reunião, o que faria o ciclo como um todo superar a nossa projeção de 150 pontos base”, diz.
Porto, que espera uma taxa de juros de equilíbrio na casa de dois dígitos, prevê que o BC suba os juros até 12%, começando a cortá-los somente no quarto trimestre de 2025. A perspectiva é que a Selic permaneça em 10,50% no horizonte de longo prazo.
Para inflação, a projeção do Citi é de 4,4% de IPCA neste ano e de 3,8% no ano que vem.
Fonte: Valor Econômico

