A corrida por ofertas de debêntures incentivadas, desencadeada pela decisão do governo de tributar títulos isentos a partir de 2026, tem levado bancos de investimento a revisar suas expectativas para o mercado de dívida neste ano. Embora não se espere que o recorde de emissões de 2024 seja superado, a diferença entre os volumes dos dois anos tende a ser menor do que se previa há alguns meses.
“Antes dessas medidas para os isentos, esperávamos uma queda mais acentuada das emissões no mercado de capitais, de cerca de 20%. Hoje, a expectativa é de uma redução de 10%”, diz Samy Podlubny, chefe da área de dívida do UBS BB.
Matheus Licarião, responsável por emissões locais no Santander, também espera que as captações de 2025 fiquem acima das expectativas, “com um volume muito maior de operações de liability management [gestão do passivo] tanto com ofertas de títulos incentivados quanto de institucionais”, diz.
O maior interesse das companhias, segundo Licarião, não é explicado exclusivamente pelas mudanças na tributação, mas também pelos níveis atuais das taxas dos títulos, ou seja, da remuneração paga aos investidores. “Os spreads estão tão achatados que fazem com que potenciais emissores não deixem passar uma boa oportunidade de acessar o mercado.”
Ao longo de 2024, foram emitidos R$ 473,7 bilhões em debêntures, considerando tanto os títulos incentivados quanto os títulos corporativos comuns, que não têm isenção fiscal para o investidor. Desse volume, quase 29%, ou seja, R$ 135,1 bilhões corresponderam aos papéis com incentivo, criados para financiar projetos de infraestrutura.
Após uma tendência de desaceleração no início deste ano, o volume de debêntures alcançou R$ 192,6 bilhões no primeiro semestre, sendo R$ 74,5 bilhões em títulos incentivados – o maior montante semestral alcançado por esse tipo de debênture na história, segundo a Anbima, associação das instituições que atuam nos mercados financeiro e de capitais.
O ganho de protagonismo das debêntures incentivadas deve ser ainda maior nos próximos meses, com a expectativa de as empresas anteciparem operações planejadas para 2026, um ano eleitoral. Além disso, fatores como a instabilidade no ambiente externo também podem impulsionar operações, como destaca a agência de classificação de riscos Moody’s Local em relatório recente sobre dívidas corporativas.
Em julho, o número de emissões de debêntures incentivadas teve um comportamento dentro do esperado, mas várias ofertas foram ajustadas em tamanho, devido ao interesse dos investidores, disse Getúlio Lobo, chefe de renda fixa e híbridos do banco de investimento da XP, ao Valor em entrevista no mês passado. “Algumas operações que antes de ir para a rua tinham um tamanho ‘X’, foram incrementadas em meio ‘X’ ou chegaram até ao dobro do volume pensado inicialmente.”
Além dessa sobredemanda, os bancos esperam que o volume e o número de operações aumentem nos próximos meses, mas principalmente no quarto trimestre, diz Podlubny. “Hoje, o grande mercado, para aqueles que podem usar esse instrumento, é a captação incentivada”, afirma, considerando o nível de taxas e o apetite dos investidores.
Para Licarião, as emissões não devem ser concentradas apenas no setor elétrico, que geralmente lidera as captações com debêntures incentivadas, mas incluir outros. “Como não é uma onda, mas um momento de oportunidade, qualquer companhia elegível deve tentar emitir”, diz.
As operações, porém, dependem da existência de um lastro “que não é infinito”, pondera Felipe Wilberg, diretor de renda fixa e produtos estruturados do Itaú BBA. “A empresa tem que ter um projeto e esse projeto tem que ser aprovado”, diz.
O executivo relata ter participado de mais conversas sobre potenciais emissões incentivadas e afirma acreditar que o ritmo agitado continuará até o fim do ano, “mas talvez sem um aumento exorbitante na demanda.”
Até o momento, a captação dos fundos que investem em crédito privado sustentam as perspectivas positivas para o mercado. “Houve um momento, no início do ano, em que o mercado deu uma mexida, mas logo depois os fundos voltaram a captar e estão captando R$ 13 bilhões, R$ 14 bilhões todo mês. Isso é dinheiro que precisa de papel”, afirma Podlubny.
A captação dos fundos em julho foi a maior desde outubro de 2024, tanto para a classe de fundos de crédito tradicionais, quanto para os fundos de crédito focados no mercado de debêntures de infraestrutura, o que tem pressionado novamente os spreads dos papéis, destacam os gestores da Ibiúna em carta enviada a investidores na última semana.
Segundo a Anbima, os fundos de renda fixa registraram entradas líquidas de R$ 21,2 bilhões em julho, quase o dobro dos R$ 10,8 bilhões observados em junho.
Fonte: Valor Econômico

