Por Jason Douglas e Stella Yifan Xie — Dow Jones Newswires, de Cingapura e Hong Kong
24/03/2023 05h01 Atualizado há 5 horas
A pandemia e a deterioração dos laços entre os EUA e a China estão levando a um reordenamento das cadeias de suprimentos globais e muitos países veem uma oportunidade histórica de turbinar o desenvolvimento econômico e criar milhões de novos empregos atraindo parte da produção manufatureira chinesa.
Países de baixa e média renda – como Índia, México, Vietnã, Camboja e Filipinas – estão competindo em subsídios, isenções fiscais e outros benefícios para convencer as empresas de que seu país é a segunda melhor opção depois da máquina industrial que Pequim aperfeiçoou em décadas.
Executivos percorrem o planeta em busca de espaço para fábricas ou alianças locais para reduzir sua dependência da China e seu vasto chão de fábrica – e muitos governos estão fazendo de tudo para recebê-los bem.
“Precisamos participar da diversificação que está ocorrendo no mundo”, disse Héctor Dorbecker, chefe do setor de tecnologia, novas indústrias e assuntos financeiros da embaixada mexicana em Pequim. Ele ajudou a organizar uma visita ao México de uma pequena delegação de executivos de empresas baseadas na China.
O grupo teve uma recepção calorosa, com um verdadeiro desfile de autoridades mexicanas, em uma mostra de como os países estão disputando uma parcela da atividade manufatureira chinesa.
A China consolidou seu domínio sobre a manufatura global durante a pandemia graças ao aumento da demanda por bens de consumo, enquanto as pessoas trabalhavam de casa. O país também aumentou sua participação em produtos manufaturados de alto valor, como automóveis e itens eletrônicos complexos, superando rivais como Alemanha e Japão.
A participação da China na manufatura global era de 31% em 2021, segundo as Nações Unidas, de 26% em 2017. A parcela da Índia era de 3%, a do México de 1,5% e a do Vietnã de 0,6%.
Mas mudanças geopolíticas significam que a China pode ver seu domínio sobre a manufatura global enfraquecer. Empresas foram abaladas pelas disputas comerciais e de segurança entre Washington e Pequim e prejudicadas pelas interrupções das cadeias de suprimentos causadas pela invasão da Ucrânia pela Rússia e a pandemia de covid-19. Muitas estão tentando formar cadeias mais diversificadas que, esperam, sejam mais resilientes em crises futuras.
Os investimentos externos diretos na China caíram 43% em 2022, para US$ 190 bilhões, segundo dados oficiais. A China também representa uma parcela cada vez menor das importações dos EUA, num reflexo da guerra de tarifas e do crescente antagonismo entre as duas maiores economias do mundo. A participação da China nas importações de bens dos EUA caiu de um pico de 22% em 2017 para 17% em 2022, segundo dados da balança americana.
A Apple transferiu parte da produção de smartphones para a Índia e agora considera o Vietnã, onde a Nike e a Adidas já produzem tênis, para fabricar seus relógios e fones de ouvido.
A fabricante de brinquedos Mattel, das bonecas Barbie, ampliou sua fábrica em Monterrey, no México, transformando-a em sua maior unidade de produção do mundo entre 2020 e 2022. A Hisense, fabricante chinesa de produtos eletrônicos e eletrodomésticos, está desenvolvendo um parque industrial na mesma cidade para fabricar refrigeradores, lavadoras de roupas, aparelhos de ar-condicionado e utensílios de cozinha para o mercado americano.
Redirecionar as cadeias globais de suprimentos para longe da China não será fácil, segundo executivos. Os possíveis rivais precisam superar desafios como custos de transporte maiores, equipamentos e processos ultrapassados e infraestrutura inferior.
Na corrida por uma fatia maior da produção industrial global, os países estão competindo não só em custos e geografia, mas também em quem pode oferecer às empresas as melhores regalias enquanto cumprem suas próprias metas de desenvolvimento.
O Camboja reformulou suas leis em 2021, num esforço para atrair mais investimentos externos, com um novo regime com incentivos para a produção industrial em setores como tecnologia avançada, máquinas e peças de reposição e produtos eletrônicos.
Os benefícios incluem isenções de imposto de renda para investidores, deduções fiscais para investimentos e renúncia de impostos alfandegários e outros impostos sobre as importações de equipamentos, segundo uma relatório de 2022 sobre o cenário de investimentos no Sudeste Asiático da Dezan Shira & Associates, que presta assessoria jurídica, contábil e outros serviços para toda a Ásia.
O Vietnã, por sua vez, está oferecendo isenções fiscais para companhias dispostas a investir em áreas mais pobres do país. Também criou taxas preferenciais de impostos para indústrias de alta tecnologia como software e automação, e para grandes investimentos em manufatura, de US$ 250 milhões ou mais, segundo o relatório.
A Índia vem se concentrando em impostos baixos e subsídios governamentais para atrair empresas estrangeiras. Em 2021, a Índia anunciou perto de US$ 1 bilhão em incentivos para convencer empresas a produzirem mais computadores e tablets no país, um esforço para repetir seu sucesso no fomento à produção de smartphones, que gerou bilhões de dólares em investimentos de empresas como Samsung e Foxconn.
Nova Déli também está de olho na produção de semicondutores. O Estado de Gujarat pode receber uma fábrica de semicondutores de US$ 20 bilhões a ser construída pela Foxconn em parceria com a potência indiana de commodities Vedanta Group.
As grandes vantagens do México são sua proximidade com os consumidores americanos e a adesão a uma acordo comercial com os EUA e o Canadá (USMCA) que entrou em vigor em 2020 como sucessor do Nafta, o acordo de livre comércio da América do Norte.
O programa Immex do país, que remonta à década de 60, permite a empresas estrangeiras estabelecer unidades de produção no México e importar matérias-primas e componentes isentos de impostos, desde que os produtos acabados sejam exportados do México.
Um programa separado conhecido como Prosec é voltado para o desenvolvimento de setores como de eletrônicos, automóveis e maquinário. Oferece ao fabricantes tarifas reduzidas sobre as importações, independentemente de os produtos acabados serem exportados ou vendidos no México.
Jacob Rothman, presidente-executivo adjunto da Velong Enterprises, que foi convidado a visitar o México, disse que depois de sua visita de janeiro espera firmar uma nova joint venture com uma fábrica do México para produzir panelas para grandes grupos varejistas dos EUA. Ele disse estar nos estágios finais de negociação e espera investir entre US$ 2 milhões em US$ 5 milhões para equipar a fábrica com novo maquinário. A Velong Enterprises possui seis fábricas na China, uma no Camboja e joint ventures no Vietnã e Índia.
Huang Guohui, presidente da Prowealth Group, uma firma de private-equity baseada em Ghangzhou, na China, também estava na delegação que visitou o México e disse ter ficado impressionado com o empenho das autoridades mexicanas e donos de fábricas para desenvolver o setor industrial do país. “Eles sabem claramente que esta é uma oportunidade histórica”, disse Huang. “O futuro do ‘made in China’ não significa necessariamente que todos os produtos serão fabricados na China”.
Fonte: Valor Econômico

