Por Anaïs Fernandes — De São Paulo
14/09/2023 05h01 · Atualizado há 4 horas
O desempenho dos preços de serviços em agosto deixou economistas animados e mais confiantes no processo de desaceleração da inflação em curso, a despeito de o Índice Nacional de Preços ao Consumidor (IPCA) ter subido mais no mês passado do que em julho. Alguns passaram a ver possibilidade de a inflação de serviços ou de suas métricas subjacentes (menos voláteis) fecharem o ano ao redor de 5% ou até abaixo disso.
A inflação de serviços foi de apenas 0,08% em agosto, vindo de 0,25% no mês anterior. Já os serviços subjacentes – categoria que exclui itens como passagens aéreas e mantém aqueles mais ligados ao ciclo econômico e, portanto, à política monetária – passaram de 0,2% para 0,14%, de acordo com a MCM Consultores.
A inflação acumulada em 12 meses nos serviços desacelerou de 5,6% em julho para 5,4% em agosto, o menor resultado desde janeiro de 2022. Os serviços subjacentes, por sua vez, foram de 6,1% para 5,5%, a menor variação desde novembro de 2021.
Ambas ainda estão acima do teto da meta de inflação para 2023, de 4,75%. Na média móvel de três meses anualizada e dessazonalizada – uma forma de suavizar movimentos mensais, mas ainda captar a tendência “na ponta” -, no entanto, os serviços subjacentes passaram de 5,3% em julho para 4,1% em agosto, segundo o Santander.
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“Se a gente seguir com essa dinâmica, é bem provável que a inflação de serviços encerre o ano em torno de 4,5%, o que já entraria no intervalo da meta”, diz Helcio Takeda, diretor de pesquisa econômica da Pezco. “Isso traz algum conforto e segurança no sentido de que a atuação de política monetária está sendo eficiente”, afirma.
O Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central sinalizou na ata da sua última reunião, em agosto, que “uma dinâmica substancialmente mais benigna do que a esperada da inflação de serviços” é um dos fatores que poderiam gerar a confiança necessária para viabilizar uma intensificação do ritmo de corte de juros, hoje em 0,50 ponto percentual.
“É difícil quantificar o que seria uma dinâmica substancialmente mais benigna, mas eu diria que ela está muito mais benigna na inflação de serviços subjacentes”, diz Mirella Hirakawa, economista da AZ Quest.
Sua projeção para a inflação de serviços subjacentes em 2023, que começou o ano em 5,6%, foi caindo desde julho e está ao redor de 5%.
“Desde o Copom de agosto, as projeções para o IPCA de 2023 foram revisadas em 14 pontos-base [0,14 ponto percentual] só por causa dos serviços subjacentes. Embora isso não tenha alterado a previsão de IPCA no ano, por causa da revisão para cima em preços administrados, é uma mudança relevante porque a composição ficou mais benigna”, diz Hirakawa.
No início do ano, a projeção mediana na pesquisa Focus, do BC, para a inflação de serviços como um todo em 2023 era de 5,99%. Em fevereiro, começou a rodar acima de 6%, chegou a 6,24% em março e voltou a ficar abaixo de 6% a partir de junho. Agora, está em 5,5%.
“É bem provável que serviços encerre o ano em torno de 4,5%” — Helcio Takeda
A inflação de serviços ao redor de 5% em 2023 é uma das principais teses da Warren Rena já há algum tempo para projetar um IPCA de 4,7% no ano, dentro do teto da meta de inflação e abaixo do consenso do Focus, que está em 4,9%.
“A qualidade da inflação de agosto foi muito boa, melhor do que esperávamos, mas é apenas como se a desaceleração estivesse sendo mais rápida no curtíssimo prazo. A figura como um todo, para nós, já era de desaceleração dos serviços no segundo semestre”, afirma Andréa Angelo, economista-chefe para inflação da Warren Rena. Na primeira metade do ano, diz, a média mensal da inflação de serviços foi de 0,56%. Na segunda, deve cair para 0,29%, estima.
O principal fator que ajudou a Warren Rena a antecipar esse cenário foi a percepção de que os reajustes nominais de salários passavam, na virada de 2022 para 2023, de um acumulado na casa de 10% para em torno de 5%. “O maior risco, portanto, é esse reajuste acelerar até o fim do ano”, diz Angelo.
Ainda que sua projeção de inflação de serviços de 5,2% em 2023 não se confirme e fique, por exemplo, em 5,5%, “não muda muito a ideia de uma desaceleração contundente no ano”, afirma a economista. Em 2022, a inflação de serviços fechou em quase 8%.
Para Darwin Dib, economista da Gauss Capital, a inflação dos serviços subjacentes deve sair do acumulado em 12 meses atual para 4,9% no fim do ano. A métrica é importante, sobretudo para o BC, porque indica a tendência dos serviços no IPCA, explica ele.
Pelas suas contas, na média móvel de três meses anualizada e dessazonalizada, a inflação dos serviços subjacentes passou de 5,25% em julho para 3,96% em agosto. “Foi uma queda importante. Em 12 meses, a tendência de queda deve se manter até o fim do ano”, diz.
O Itaú Unibanco, que revisou ontem sua projeção de IPCA em 2023 de 5,1% para 4,9% citando, entre outras coisas, a inflação menor de serviços, pondera que, com o mercado de trabalho aquecido, as leituras de serviços devem reacelerar ao longo do segundo semestre. “Mas reconhecemos o risco de que isso não ocorra”, afirma, em relatório, a equipe liderada por Mario Mesquita. A desinflação, dizem, tem sido liderada por itens comercializáveis, mas os últimos IPCA também mostraram alívio em não comercializáveis.
“Em uma economia aberta, bens exportáveis e importáveis têm o câmbio como uma espécie de ‘teto’ para a inflação. A parte do IPCA que não se pode importar é, justamente, a de serviços, e essa cesta é diretamente sensível à demanda agregada”, explica Dib. “É como se fosse o ‘canário da mina’, isto é, um sinalizador de se a demanda está produzindo inflação ou não.”
Mesmo a desinflação de comercializáveis respinga nos serviços, observa Angelo. As baixas em alimentos e na alimentação no domicílio, por exemplo, devem ajudar a inflação de serviços de alimentação (restaurantes, basicamente) a passar de uma média mensal de 0,57% no primeiro semestre para 0,33% no segundo, estima. As quedas nos Índices Gerais de Preços (IGPs), que indexam contratos, e nos preços industriais aos produtores devem contribuir para levar a inflação média mensal de aluguel e condomínio de 0,51% no primeiro semestre para 0,27% no segundo, e a de serviços para veículos (conserto, estacionamento, pintura etc.) de 0,50% para 0,15%.
Fonte: Valor Econômico

