Por Guy Faulconbridge, Gleb Stolyarov e Darya Korsunskaya — Reuters, de Moscou
29/06/2023 05h02 Atualizado há 6 horas
Quando uma das forças mercenárias mais brutais do mundo marchava sobre Moscou, alguns membros da elite russa temiam que a potência nuclear estivesse à beira do que o presidente russo, Vladimir Putin, disse que poderia ter sido uma guerra civil.
Enquanto Putin enfrentava o maior desafio público de seus 23 anos como líder supremo, alguns jatos particulares saíam de Moscou, segundo dados de rastreamento de voos e uma fonte com conhecimento do assunto.
Um dos temores era de que, se entrasse em Moscou, o grupo mercenário Wagner, de Yevgeny Prigozhin, tentaria assumir o controle da economia e desencadearia mais uma redistribuição de ativos na Rússia, o maior fornecedor mundial de recursos naturais.
Quando Prigozhin suspendeu a ofensiva, a pouco mais de 200 km de Moscou, um medo diferente se instalou: o de que Putin, furioso com sua humilhação, decidisse endurecer e adotar medidas de retaliação contra aqueles que a seu ver não eram leais o suficiente.
“Todo mundo realmente se borrou de medo”, disse uma fonte familiarizada com o pensamento nos níveis mais altos das elites empresariais e políticas russas, que muitas vezes se sobrepõem. “Qualquer pessoa que tivesse algo a perder estava extremamente tensa.”
Segundo outra fonte de alto escalão em Moscou, o medo tomou conta das elites nas tumultuadas horas do sábado e muitos correram para fazer planos de como tirar suas famílias de Moscou.
Durante o motim, jatos particulares saíam de Moscou e russos buscavam sacar dinheiro
Essa fonte afirmou que era evidente que a autoridade de Putin fora afetada. Mas ressalvou que ainda era muito cedo para tirar conclusões mais abrangentes sobre os acontecimentos que, na sua opinião, não pareciam fazer completo sentido.
“A velocidade e a gravidade do que quer que isso [o motim] tenha sido deixou todos profundamente chocados, inclusive no Kremlin”, acrescentou essa fonte.
Em entrevistas à Reuters, cerca de uma dúzia de membros da elite russa relatou seu nervosismo enquanto se desenrolava o motim, o maior desafio interno para o Estado russo desde o golpe de 1991 contra Mikhail Gorbachev, quando a União Soviética desmoronou.
O temor e as reações dessas pessoas dão uma ideia da profundidade das fissuras dentro da Rússia de Putin após 16 meses de guerra na Ucrânia, guerra que não mostra sinais de terminar tão cedo.
“Uma nova realidade começou na Rússia”, disse uma terceira fonte à Reuters, ao ser indagada sobre o que acontecera. Para ela, é possível que as consequências plenas do motim fracassado ainda estejam para acontecer.
Durante o desenrolar do motim, russos buscaram sacar quantidades expressivas de rublos e tentar obter dinheiro em moedas estrangeiras em 15 regiões da Rússia. Em média, a demanda por moeda estrangeira e dinheiro vivo cresceu cerca de 30%, mas nas regiões do sul, perto de onde o motim acontecia, e nas grandes cidades, a demanda disparou em 70% a 80%, de acordo com uma atualização anunciada pelo primeiro vice-premiê russo, Andrei Belousov.
Os preços das passagens aéreas de Moscou para destinos como Belgrado, Istambul e Dubai também inflacionaram. Jatos vinculados a pelo menos dois grandes empresários e um alto funcionário do governo partiram de Moscou em 24 de junho, segundo dados de rastreamento de voos.
O deputado do Parlamento russo Dmitry Gusev escreveu à agência nacional de transportes aéreos para exigir que ela divulgasse os nomes de empresários e políticos famosos que saíram da Rússia em aviões em 24 de junho.
Apenas umas poucas horas depois, um acordo foi fechado para permitir que Prigozhin e alguns de seus combatentes fossem para a vizinha Belarus.
A Rússia, aparentemente, tinha evitado o pior.
Mas entre a elite agora há o medo de que Putin tente assegurar sua posição e remova aqueles que ele acha que não demonstraram sua lealdade com ardor suficiente.
“Cabeças vão rolar”, disse outra fonte de alto escalão. “Eles vão reparar em quem ficou em silêncio, quem não se manifestou em apoio à unidade e ao presidente.”
Fonte: Valor Econômico
