Ainda são incertos os efeitos da tributação dos fundos fechados sobre a indústria de fundos de investimento. Enquanto alguns consideram que os super-ricos vão liquidar seus fundos exclusivos e migrar para outras aplicações, outros acreditam que o impacto será limitado a um primeiro momento. Após adiamentos, o projeto de lei que tributa os fundos fechados e offshores (PL 4.173/23) foi aprovado na Câmara dos Deputados em 25 de outubro, e seguiu para o Senado Federal.
O PL prevê estender para os fundos fechados (que geralmente são exclusivos) a tributação semestral do Imposto de Renda (IR) que incide sobre os rendimentos da carteira. Hoje, o investidor de varejo já paga essa tributação, conhecida como come-cotas, mas os investidores de fundos fechados não. Contam, portanto, com o diferimento do imposto, o que aumenta os rendimentos. Esse benefício será extinto para as categorias de multimercados e renda fixa. Fundos de ações (FIAs), ETFs, fundos de investimento em participações (FIPs) e fundos de recebíveis (FIDCs) poderão manter o benefício se forem considerados entidades de investimento. o benefício se forem considerados entidades de investimento. Fundos de ações (FIAs) ficaram fora do come-cotas, independentemente de serem considerados entidades de investimento. Os investidores pagarão 15% de IR quando fizerem resgates. Fundos Imobiliários (FIIs) e Fundos de Investimento nas Cadeias Produtivas Agroindustriais (Fiagros) manterão a isenção do IR se contarem com pelo menos cem cotistas e se listados em bolsa.
O projeto aprovado prevê também a tributação do estoque de rendimentos acumulados pelos fundos fechados, sobre o qual incidirá uma alíquota de 8% para o investidor que fizer ainda este ano a opção pelo recolhimento do imposto (que poderá ser parcelado em 4 vezes). Caso ele espere para o ano que vem, a alíquota passa a ser de 15% (e o IR pode ser pago em 24 vezes). Érico Pilatti, sócio do Cepeda Advogados, explica que tanto o come-cotas quanto a tributação do estoque podem ser questionados na Justiça, pois tratam da tributação de uma renda que ainda não existe (e, portanto, se está tributando, em última análise, o patrimônio) e porque a tributação retroativa afronta princípios constitucionais. “A tendência é que os investidores façam as contas para ver se vale a pena judicializar a questão, até mesmo porque isso tem custos”, afirma.
Esta também é a percepção de Victória Siqueira, responsável pela área de wealth planning na Portofino Multi Family Office. Com a alíquota de 8%, ela diz que a maioria dos investidores provavelmente vai preferir pagar o imposto e depois avaliar o que fazer com o fundo. Siqueira explica que a liquidação de um fundo seria tributada em 15%, e que, portanto, é mais vantajoso esperar a aprovação do PL, pagar 8% de imposto e depois estudar uma possível liquidação do fundo. Ela lembra, ainda, que o Senado poderá fazer modificações no texto aprovado pela Câmara.
A liquidação dos fundos pode ser um dos efeitos da tributação porque se estima que só vale a pena manter fundos fechados com patrimônios superiores a R$ 15 milhões. Muitos fundos menores, portanto, poderão ser extintos. Outra alternativa é a cisão das carteiras de renda fixa e renda variável, minimizando a parcela do patrimônio sujeita ao come-cotas (que não incidirá sobre os fundos de ações enquadrados como entidade de investimento). “Quem ainda não tinha feito a cisão, fez agora. O que não é possível fazer é mexer no perfil de risco do investidor por causa da tributação”, avalia Siqueira.
Marco Bismarchi, sócio e gestor de portfólio da Tag Investimentos, considera que a tributação do estoque em um primeiro momento provocará saídas da indústria, já que, para pagar o imposto, muitos terão que sacar recursos dos fundos. Na Tag, por exemplo, considerando o patrimônio de R$ 100 milhões em fundos exclusivos, o pagamento do imposto sobre o estoque corresponderia a R$ 3,5 milhões. No entanto, ele diz que a decisão será caso a caso e que ainda não é possível antecipar os movimentos dos investidores.
Para fins sucessórios, explica Pilatti, o Fisco entende que os fundos fechados podem registrar antecipação da herança a valor de custo (em vez de a valor de mercado), o que reduz o imposto sobre doações e heranças (ITCMD). Para o advogado, embora o impacto tributário do come-cotas seja relevante, outros aspectos dos fundos fechados, como a governança e a questão sucessória, também atraem os investidores e podem reter os recursos na indústria.
Outra hipótese é a migração dos super-ricos para fundos de previdência, que continuam isentos dos come-cotas. Mas Marcelo Mello, CEO da SulAmérica Vida, Previdência e Investimentos, não espera ver uma migração expressiva nessa direção. Nos fundos fechados de clientes de altíssima renda, estes acabam discutindo com os gestores sobre a alocação dos recursos. Na previdência, Mello diz que as seguradoras não terão disposição para aceitar a ingerência dos cotistas.
Fonte: Valor Econômico

