14 Sep 2023
ADRIANA FERNANDES
Em análise no Congresso, o projeto de Orçamento apresentado pelo governo para 2024 entrou na mira de economistas, que cobram mais detalhes sobre as estimativas usadas para fixação de despesas e receitas no texto. Do lado dos gastos, por exemplo, existe a projeção de que o valor atribuído para o pagamento de benefícios do INSS estaria subestimado entre R$ 10 bilhões e R$ 20 bilhões.
A projeção é rechaçada pela equipe econômica, que espera uma economia de R$ 10 bilhões com a adoção de medidas de combate à fraude na liberação dos benefícios. Um grupo de trabalho de revisão de gastos federais foi criado ontem pela ministra do Planejamento e Orçamento, Simone Tebet, com prazo de 12 meses para concluir seu trabalho.
No caso do pagamento de benefícios do INSS, economistas veem diferença de até R$ 20 bi
As dúvidas de economistas também passam pelas chances de o governo alcançar a receita prevista com as medidas arrecadatórias anunciadas nas últimas semanas, o que aumentaria o risco de a equipe econômica ter de rever a meta de déficit zero estipulada para o próximo ano. O próprio governo estima a necessidade de pelo menos R$ 168 bilhões (veja quadro nesta página) em receitas extras para as contas públicas em 2024.
Ex-secretário do Tesouro Nacional e hoje economista da gestora ASA Investments, Jeferson Bittencourt calcula que a estimativa de gastos com a Previdência está R$ 20 bilhões abaixo do que deveria – valor que poderia aumentar se o governo conseguir cumprir a promessa de zerar até o fim do ano a fila de espera (de 1,69 milhão de pedidos).
Como o novo arcabouço fiscal tem um teto para as despesas, Bittencourt avalia que um gasto obrigatório maior com os benefícios da Previdência acabará pressionando as chamadas despesas discricionárias (não obrigatórias, como investimentos).
Como resultado, ele prevê ruídos políticos na hora que o governo tiver de contingenciar (bloquear) despesas do Orçamento para acomodar gastos obrigatórios que, eventualmente, foram subestimados. “O problema é político. Como consideramos que o governo vai respeitar o limite de despesa do arcabouço, o fato de algumas despesas estarem subestimadas pode ser constrangedor”, diz ele. No projeto de Orçamento enviado ao Congresso no dia 31 de agosto, o gasto previsto com os benefícios do INSS foi fixado em R$ 913 bilhões.
Já o especialista em contas públicas Gabriel Leal de Barros, sócio e economista-chefe da Ryo Asset, estima uma diferença de pelo menos R$ 10 bilhões no gasto do INSS. Com a redução da fila, afirma ele, esse valor poderia chegar a R$ 20 bilhões.
Os dois economistas avaliam que haverá mais pressão para mudança da meta e são cautelosos em relação à capacidade de o governo obter resultados significativos com a prometida operação pente-fino nos benefícios da Previdência. “Todo mundo promete e poucos entregam. Quem entregou R$ 18 bilhões (de corte) foi o governo Temer”, afirma Leal.
RECEITAS. Há uma cobrança também de mais detalhes sobre o cálculo das projeções de receitas com as medidas tributárias. Bittencourt estima que o governo deva conseguir apenas R$ 80 bilhões dos R$ 168 bilhões em arrecadação extra perseguida pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad.
Para ele, a proposta de mudança na tributação das subvenções do ICMS não será aprovada (mais informações na pág. B2) e nem o fim do instrumento chamado Juros sobre Capital Próprio (JCP) – uma forma alternativa de remunerar os acionistas que pode ser deduzida do imposto a pagar pelas empresas.
O ex-secretário do Tesouro questiona ainda as estimativas de arrecadação com a reformulação do Conselho de Administração de Recursos Fiscais (Carf) – o tribunal de recursos da Receita Federal, que voltou a contar com o “voto de qualidade” –, de R$ 54,70 bilhões. Por outro lado, aponta que a manobra do governo de antecipar para este ano parcela de R$ 9,4 bilhões de compensação a Estados e municípios por perdas com a desoneração do ICMS vai dar um alívio do lado das despesas no ano que vem.
Fonte: O Estado de S. Paulo

