A economia da China tem um novo problema: o desemprego em alta. A taxa subiu pelo terceiro mês seguido, segundo dados divulgados nessa segunda-feira (18). O número oficial, agora em 5,3%, voltou ao patamar de julho, depois de os aumentos de dezembro e janeiro terem revertido quase meio ano de quedas no indicador.
A alta no desemprego é apenas mais um dado da rodada de indicadores divulgados em Pequim hoje. A maioria foi positiva: a produção industrial teve um belo aumento em janeiro e fevereiro, em comparação aos mesmos meses de 2023 e grandes fluxos de investimento chegaram às fábricas.
Segundo economistas, os dados sinalizam que a economia se beneficia de estímulos governamentais modestos, mas será preciso fazer mais para garantir uma recuperação durável. “Agora não é hora de complacência”, disse Ting Lu, economista-chefe do Nomura, em Hong Kong.
O aumento do desemprego vem acompanhado de evidências de queda na média de horas de trabalho na China, algo que economistas costumam interpretar como sinal de que as pessoas estão subempregadas, ou trabalhando bem abaixo de seu potencial.
Uma preocupação já há muito tempo tem sido o desemprego entre os jovens, que em junho superou os 21%. Logo depois desse anúncio, a agência de estatísticas da China deixou de publicar dados sobre o desemprego entre os jovens de 16 a 24 anos, atribuindo a decisão a problemas metodológicos que pretendia resolver.
Em janeiro, começou a publicar uma nova versão, que colocou o desemprego dos jovens em pouco menos de 15% em dezembro. Hoje, um porta-voz da agência disse que a nova versão não será publicada junto com o indicador geral de desemprego a cada mês, mas divulgada em seu site de dois a três dias depois.
Combinados, esses sinais do mercado de trabalho indicam bolsões de fraqueza na economia chinesa, que sente os benefícios do apoio do governo à indústria, mas continua a ter dificuldades diante do consumo apenas moderado e do longo declínio do mercado imobiliário.
A enxurrada de dados desta segunda-feira reforçou essas diferenças. Há números mostrando que o crescimento das vendas no varejo desacelerou em janeiro e fevereiro e que o investimento em imóveis diminuiu, enquanto a produção industrial e o investimento em prédios, fábricas e outros ativos fixos aumentaram.
O dado mais recente do desemprego é “definitivamente uma preocupação”, disse Julian Evans-Pritchard, chefe do departamento de economia chinesa na firma de análises Capital Economics, em Cingapura. “Embora os dados publicados hoje no geral tenham sido razoáveis, está claro que o consumo interno continua fraco e que a melhora é em grande medida impulsionada pelas exportações e por investimentos estatais financiados por apoio fiscal.”
A economia da China expandiu-se 5,2% em 2023, um resultado modesto para os padrões chineses. Para 2024, os líderes do país, estabeleceram como meta um crescimento de 5%, em uma reunião anual no início de março.
Muitos economistas a consideram ambiciosa demais. O desempenho de 2023 foi ajudado por uma comparação favorável com 2022, ano de forte desaceleração em razão dos lockdowns contra a covid-19 em grandes cidades, como Xangai. A economia se beneficiou da reabertura após Pequim acabar com os rígidos controles contra a covid-19, um impulso que não se repetirá em 2024.
Crise do setor imobiliário
O setor imobiliário continua sendo o maior obstáculo para o crescimento chinês. O investimento e a construção imobiliária chegou a representar 25% ou mais da da produção econômica anual na China. Agora, entretanto, o início de novas construções está parado, as vendas desabaram e os preços estão em queda.
As vendas de novas residências caíram 32,7%, em valor, no período de janeiro a fevereiro em comparação aos mesmos meses de 2023, segundo os dados de hoje, uma queda bem maior do que a de 6% registrada para todo o ano de 2023. Em área útil, caíram 25% em comparação ao primeiro bimestre de 2023, enquanto os inícios de novas construções pelas incorporadoras de imóveis recuaram 29,7%.
Por sua vez, o declínio do mercado imobiliário vem prejudicando o consumo, que ficou aquém das expectativas no pós-pandemia, uma vez que as famílias têm optado por poupar mais e gastar menos em meio à queda dos preços e das vendas de imóveis. As vendas no varejo em janeiro e fevereiro subiram 5,5% na comparação anual, um resultado razoável, mas abaixo da alta de 7,4% registrada em dezembro.
A agência de estatísticas da China costuma agrupar janeiro e fevereiro para abrandar as distorções das festividades do Ano Novo Lunar chinês, quando muitas empresas fecham as portas e os trabalhadores deixam as grandes cidades para visitar suas famílias.
O governo chinês tem resistido à ideia de responder aos desafios da economia com políticas de grandes estímulos como as adotadas no passado, por temer que tais medidas poderiam reacender um frenesi no mercado imobiliário.
Em vez disso, optou por direcionar dinheiro para a indústria. O investimento do setor privado subiu apenas 0,4% nos primeiros dois meses de 2024, mas o investimento total saltou 4,2%, impulsionado por dinheiro governamental. O investimento em serviços e indústria de alta tecnologia cresceu 10%, de acordo com os dados.
A esperança é que a aposta redobrada na competência industrial da China impulsione o crescimento econômico, ao mesmo tempo em que a economia se livra da dependência excessiva em relação ao mercado imobiliário. Embora a China venha tendo rápido sucesso em segmentos como os de equipamentos de energia renovável e automóveis, especialmente veículos elétricos, seu foco na competitividade das exportações por meio de empréstimos subsidiados à indústria e preços baixíssimos vem alimentando tensões comerciais com outros países.
Louise Loo, economista-chefe da China na firma de análises Oxford Economics, disse que o aumento do desemprego sinaliza que, embora as empresas estejam elevando a capacidade produtiva graças ao auxílio do governo, elas não estão vendo demanda suficiente para justificar a contratação de mais pessoal. Ela estima que o desemprego chinês estaria em torno a 4% se a economia estivesse operando com potencial pleno.
“Vejo isso como um sintoma de fraqueza na demanda”, disse Loo.
(Colaboraram Xiao Xiao e Grace Zhu, de Pequim)
Fonte: Valor Econômico

