A inflação brasileira chegou num ponto em que a discussão agora é se o Banco Central (BC) estará disposto a seguir o receituário tradicional da política monetária e segurar as rédeas da economia. Na transição de Roberto Campos Neto para Gabriel Galípolo no comando do BC, a dúvida é o quanto o novo presidente conseguirá driblar as pressões do governo que não abre mão de crescimento, segundo gestores de recursos.
Em comum, os nomes que participaram do fórum de investimentos do UBS hoje, é que depois dos resultados das eleições municipais, eles já estão olhando para efeitos potenciais da sucessão presidencial em 2026.
“A grande pergunta que todo mundo se constrange em fazer é se o BC estará disposto a causar a desaceleração da atividade no Brasil. Quando o hiato é positivo, com crescimento acima da capacidade, precisa esfriar a economia e todo mundo sabe que o discurso [do presidente] Lula é ‘não abro mão do crescimento’, há uma dicotomia na maneira de quem coloca os óculos do ciclo político e de quem coloca o óculos do ciclo econômico”, disse Bruno Coutinho, sócio-gestor da Mar Asset. “Se o BC não toma a decisão que precisa, fica na carona do fiscal e cria-se não uma dominância fiscal, mas política.”
Para Coutinho, o governo Lula “já cruzou o Rubicão” com a proposta de emenda constitucional (PEC) das transição, que despejou muito dinheiro na economia e explica porque é tão difícil fechar o buraco das contas públicas. “Uma hora, esse excesso de atividade ia bater na inflação. Apesar do protagonismo fiscal, o grande problema é a inflação, o Brasil está engravidando de inflação”, afirmou. “Tem falta de credibilidade da política econômica, a fiscal mais a monetária, a resultante disso é que a economia não está entregando o que promete entregar.”
Para Felipe Guerra, sócio-fundador e principal executivo da Legacy, o BC está muito “atrás da curva” e deveria ter subido a Selic já em julho. À medida que a desancoragem das expectativas de inflação aumenta, fica muito difícil “consertar, é muito penoso”. O gestor comentou que o modelo do BC aponta uma inflação de 3,6% para 2025, “totalmente fora da realidade”. A Legacy tem nas suas contas um IPCA de 5,5%. “A convicção que a gente tem é que o BC vai ter que subir os juros se não quiser ver a coisa pior e evoluir para um regime de desorganização.” Para ele, a Selic tende a ficar alta até o desfecho das eleições de 2026.
A resolução dessa história, enfatizou Coutinho, vem com um novo ciclo político. Ele disse estar razoavelmente otimista com uma candidatura de centro-direita, com eventual vitória do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Podemos). “O mercado deve trazer isso para o preço, mas precisamos atravessar até lá.”
Para ele, o resultado das eleições municipais, com votação mais pró-direita e com grande peso dos evangélicos, já foi um elemento importante para a percepção do presidente Lula. A questão é que o resultado econômico aparentemente positivo até aqui não tem se refletido em ganhos de popularidade.
Coutinho ponderou que havia razões para Lula não seguir o roteiro tradicional de promover ajuste fiscal nos dois primeiros anos de governo, colocando a inflação na meta, reacelerando nos dois últimos para ganhar um novo mandato. Ele voltou ao Planalto após um empate técnico com o adversário, o ex-presidente Jair Bolsonaro, já assumiu com um nível de rejeição alto e encarou a invasão dos poderes da República por bolsonaristas no 8 de janeiro, logo depois da posse.
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Fonte: Valor Econômico

