4 Aug 2023 BIANCA LIMA
Bancos rejeitam tabelamento ou teto para taxas de juros do cartão. Varejo não quer diminuir número de parcelas.
A busca por uma solução para os juros cobrados no rotativo docartão de crédito, de longe a linha de financiamento mais cara hoje no País, colocou em campos opostos as instituições financeiras e o comércio. Os bancos rejeitam a possibilidade de tabelamento ou de se estabelecer um teto para as taxas, e dizem que a construção de uma saída passa por algum tipo de restrição às compras parceladas sem juros. O problema é que o parcelamento sem juros no cartão é um dos motores das vendas no varejo.
O Estadão apurou que a equipe econômica considera essa negociação complexa e que ainda não há um desenho fechado. Mas que as tratativas estão avançando, inclusive com a participação do Congresso. Na quarta-feira, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, afirmou que governo, bancos e varejo estão “sentados em uma mesa” para discutir saídas para o “maior problema de juro” no Brasil. E disse que uma proposta será apresentada em até 90 dias.
Dados do Banco Central (BC) relativos a junho mostram que a taxa média do rotativo está em 437,2% ao ano. Ou seja: em 12 meses a dívida mais do que quintuplica. Algumas financeiras ainda chegam a cobrar quase 1.000%, segundo o BC.
O rotativo do cartão é um tipo de crédito oferecido ao consumidor quando ele não faz o pagamento total da fatura até o vencimento. O exemplo mais conhecido é o pagamento do valor mínimo da fatura, mas isso vale para a quitação de qualquer quantia menor do que o valor integral.
O vice-líder do governo na Câmara, deputado Alencar Santana (PT-SP), é relator de um projeto de lei que vai receber o conteúdo do Desenrola, programa do governo federal de renegociação de dívidas (criado inicialmente por meio de medida provisória), e já avisou que tratará também da questão do rotativo. “Fazer o Desenrola e não tratar do problema do rotativo é o mesmo que não fazer nada. Você desenrola a pessoa para ela se enrolar de novo”, diz. Ele pretende apresentar um parecer em duas semanas, no máximo.
Ex-presidente da Câmara e hoje à frente da Confederação Nacional das Instituições Financeiras (CNF), Rodrigo Maia diz que, para mexer no rotativo, é necessário reorganizar o “outro lado do produto”, que é o parcelado sem juros. “Não adianta mexer em apenas uma das pontas.”
Em evento organizado pelo Bradesco BBI no início de abril, o presidente da Federação Brasileira de Bancos (Febraban), Isaac Sidney, afirmou que o modelo de tabelamento de juros, em uma indústria como a de cartão de crédito, era o “menos aconselhável”. Em nota, a Febraban disse que os bancos têm como prioridade a redução do custo de crédito, mas “sem a adoção de medidas artificiais”. •
A queda do desemprego no segundo trimestre, de 8,8% para 8,0%, traz certos recados para quem acompanha os rumos da economia e do mercado de trabalho no Brasil.
Este é o nível de desemprego mais baixo para o período desde 2014, que aparece numa conjuntura de atividade econômica relativamente frouxa, da qual se esperaria fraca demanda por mão de obra e não esse resultado poderoso. Além disso, a automação, a digitalização e o comércio eletrônico são grandes desempregadores de pessoal, como pode ser avaliado no setor bancário e no comércio varejista.
É preciso entender as explicações para esse fato, surpreendente apenas nas aparências. O agronegócio vem avançando como gerador de empregos. No primeiro trimestre de 2023, a população ocupada no setor somou 28,1 milhões de pessoas, 27% do total de ocupações.
Certos analistas de pensamento voltado para o passado continuam propalando que o agro tem baixa propensão a contratar pessoal. Não conseguem enxergar que as áreas de apoio à agropecuária, como armazenamento, transporte, assistência técnica e serviços pessoais, criam enorme quantidade de postos de trabalho. A demanda não é apenas de tratoristas e de operadores de drones, mas também por trabalhadores do setor de serviços (manicures, encanadores, etc.)
Mas é preciso compreender que o mercado de trabalho passa por revolução, pela automação, pelo uso de aplicativos e pela terceirização. É fenômeno que se acentuou com a pandemia; não começou com ela.
Muitos argumentam que essa revolução precariza as relações de trabalho. É verdade. A atividade informal continua superior a um terço da força de trabalho; muitos trabalhadores de aplicativos ganham a vida sob baixas condições e o subemprego é cada vez maior.
No entanto, mais precário do que o chamado trabalho precarizado é o desemprego. E este está caindo. Deste ponto de vista – e apenas dele –, a precarização está diminuindo e não o contrário.
A revolução do trabalho que muitos sindicalistas se recusam a ver é um problemão para a condução da política econômica e social. Cada vez mais trabalhadores não recolhem ou recolhem parcialmente a contribuição para a Previdência Social. Como não dispõem de plano de saúde, sobrecarregam o Sistema Único de Saúde (SUS).
São problemas que necessitam de urgente tratamento. O que não se pode fazer é o que têm pretendido tantos sindicalistas e o ministro do Trabalho, Luiz Marinho: tentar enquadrar essas novidades na CLT, como se dos anos 40 até agora nada de substancial no mundo e nas relações empregatícias tivesse mudado. •
Fonte: O Estado de S. Paulo

