Por Eduardo Magossi — De São Paulo
12/09/2022 05h03 Atualizado há uma hora
Ao se esforçar para flexibilizar suas políticas monetárias, Japão e China colocam-se na contramão dos apertos agressivos que vêm sendo realizados no resto do mundo, principalmente nos Estados Unidos e na Europa, o que amplia a divergência na trajetória de suas moedas.
Depois que o presidente do Federal Reserve (Fed, o banco central americano), Jerome Powell, reiterou durante o simpósio de Jackson Hole, no fim de agosto, que continuará apertando os juros até colocar a inflação na meta, o presidente do Banco do Japão (BoJ), Haruhiko Kuroda, veio a público no mesmo evento para dizer que o banco central japonês manterá sua postura de juros baixos, mesmo às custas da desvalorização do iene. A moeda japonesa já perde mais de 30% em um ano, com o dólar cotado a 142 ienes, a menor cotação em 25 anos.
Na China, o banco central tem cortado os juros e a quantidade de reservas cambiais que os bancos precisam manter para evitar uma maior desvalorização do yuan frente ao dólar, em meio a medidas para acelerar a economia, que dá sinais de desaceleração.
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Na queda de braço entre Ocidente e Oriente, o dólar se fortalece e acaba afetando países como o Brasil, quanto mais se amplia a divergência de política monetária entre os países, diz Marcelo Fonseca, economista-chefe do Opportunity Total. Segundo ele, à medida que esse diferencial se alarga, os países emergentes têm de manter juros altos, depreciando suas moedas e aumentando sua inflação.
“Esses países acabam por estender o ciclo de aperto monetário, desaquecendo suas economias. Além disso, o fortalecimento do dólar coloca pressão na moeda dos emergentes e provoca saída de capital de maneira generalizada, não só em países exportadores de commodities, como também os importadores de commodities, que sofreram um grande impacto em sua conta corrente”, diz. Desde Jackson Hole, em 26 de agosto, os investidores estrangeiros já sacaram quase R$ 3 bilhões do mercado secundário do B3, dos quais R$ 1 bilhão apenas em setembro, até o dia 2.
Para Homin Lee, estrategista de macro do banco Lombard Odier, essa divergência entre Ocidente e Oriente é fruto principalmente das políticas do Japão e da China. “O impacto disso já tem sido observado nas moedas. Tomando o Brasil como referência, o real não se desvalorizou tanto desde o início do ano, apesar de ter passado por muita volatilidade”, diz. O real cedeu 6% ante o dólar desde o início do ano, comparado com 24% do iene e 9,5% do yuan. Lee afirma que o caso do Brasil é bastante único, uma vez que o país vem tentando arduamente defender sua credibilidade no combate à inflação no âmbito da política monetária nos últimos anos.
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“Vimos a taxa Selic em níveis muito altos e provavelmente veremos a inflação talvez se acalmar um pouco à medida que avançamos. Em termos de crescimento, o país foi definitivamente auxiliado por esse boom de commodities e se saiu muito bem dadas as circunstâncias. Acreditamos que parte do crédito vai para a política monetária mais disciplinada adotada pelo país”, disse. O economista lembra, contudo, que parte desses ganhos com commodities vem da demanda da China, que ocupa lugar de destaque nas perspectivas para mercados emergentes por ser o principal importador de matérias primas – e que o Brasil pode sofrer com a desaceleração chinesa.
“O Brasil tem relação muito próxima da China, com quem mantém uma forte relação comercial com exportação de commodities”, diz Fonseca, do Opportunity Total. Cerca de 70% da pauta de exportação brasileira é dependente do comércio de commodities, e o cenário de dólar elevado – fortalecido pela divergência de políticas monetárias – não é positivo para matérias primas. “Ele deprime o valor das commodities e aumenta o custo do carrego, e não existem sinais de uma recuperação rápida do crescimento chinês.”
Andrew Tilton, economista-chefe para Ásia Pacífico da Goldman Sachs, diz que desvalorizações acentuadas do iene e yuan – provocadas pela divergência monetária – provavelmente teriam repercussões para outras economias da Ásia. “Se o amplo bloco asiático de moedas desvalorizasse significativamente em relação ao dólar, o corolário seria um dólar amplo muito mais forte, que está associado a condições de financiamento em dólar mais difíceis e, mais geralmente, a condições financeiras globais mais apertadas.”
Em relação ao Brasil, Tilton diz que, em um ambiente de inflação alta, os potenciais efeitos adversos da depreciação da moeda sobre a dinâmica de preços muitas vezes superam o potencial impulso para a competitividade das exportações na mente dos formuladores de políticas. “Isso cria uma razão adicional para apertar a política monetária na medida em que o real participa de uma depreciação cambial mais ampla em relação ao dólar e outras moedas importantes. Vimos a fraqueza do câmbio desempenhar um papel maior nas decisões de aperto de política em todo o cenário dos países emergentes nos últimos meses”, explica.
Fonseca, do Opportunity, ressalta que o cenário para o Brasil é mais desafiador. “Para um produtor de bens industrializados, o cenário é benéfico porque o país fica mais competitivo e vai conseguir exportar mais. Mas não é o caso de um produtor de commodities”, diz. Segundo ele, o México será beneficiado. “À medida que a economia do México se reequilibra, terá um aumento da exportação de manufaturados para os EUA, mas no caso do Brasil, que está ligado a uma dinâmica de crescimento chinês, o quadro é negativo, vai encarecer nossas importações e não vai facilitar as exportações”.
Fonte: Valor Econômico

