Por Toni Sciarretta — De São Paulo
08/11/2022 05h03 Atualizado
Uma disputa de mercado entre a Binance e a FTX, respectivamente a primeira e a sétima maior corretora de criptoativos do mundo, motivou uma corrida dos investidores contra a menor delas, respingou sobre projetos de todo um ecossistema de blockchain parceiro e ainda abreviou o rali das principais moedas digitais que tinha começado no final da semana passada.
O caso chama a atenção para a intricada rede de relacionamentos comerciais e participações cruzadas entre diferentes players, facilidade de conversão das moedas digitais e poder de mercado de determinados agentes de um setor, até então, percebido como descentralizado e competitivo.
Tudo começou quando o CEO da Binance, Changpeng Zhao, conhecido como CZ, foi ao Twitter no domingo dizer que iria vender os tokens nativos que detinha da rival FTX, do bilionário Sam Bankman-Fried, atribuindo a decisão a “revelações recentes”, sem explicitar quais seriam essas revelações. Uma reportagem do site “Coindesk”, do início do mês, afirmava que a Alameda, uma das empresas do grupo de Bankman-Fried, tinha a maior parte de suas reservas em tokens da FTX, chamados FTT.
Estimativas do mercado apontam que a Binance teria cerca de US$ 530 milhões nesse token. Os ativos são parte de um pagamento de US$ 2,1 bilhões recebidos pela Binance após vender sua participação na FTX no ano passado.
Além de fazer o valor dos tokens da FTX desabar, o caso levou outros investidores a desconfiarem da saúde financeira da FTX e a pedirem resgate de outros ativos digitais mantidos na corretora. Apenas em ether, moeda da Ethereum, a FTX teria tido resgates da ordem de 300 mil (US$ 471,3 milhões), segundo a CryptoQuant, que pesquisa volumes nas blockchains.
A FTX é uma gigante do segmento, responsável por comprar várias empresas insolventes no atual “inverno” dos criptoativos. Sam Bankman-Fried chegou a ser comparado com a figura de John Pierpont Morgan pelo resgate da crise bancária de 1907. Segundo a Bloomberg, Bankman-Fried tem uma fortuna avaliada em US$ 15,4 bilhões, enquanto CZ soma cerca de US$ 18,9 bilhões.
Diante das insinuações, Bankman-Fried recorreu também ao Twitter, transformando o caso em um bate-boca por meio da rede social na qual a Binance acaba de entrar como uma das sócias do empresário Elon Musk. “Um concorrente está tentando nos perseguir com rumores falsos”, disse Bankman-Fried em um tuíte. “A FTX está bem. Os ativos são bons”, completou.
A credora de criptomoedas Nexo resgatou cerca de US$ 177 milhões em ether e US$ 10,8 milhões em stablecoin USDC da FTX nas últimas 24 horas, enquanto a gestora de ativos Arca retirou mais de US$ 31 milhões em ether e USDT, segundo a Nansen, que pesquisa volumes nas blockchains.
A CEO da Alameda, Caroline Ellison, foi também ao Twitter negar a informação sobre as reservas da empresa, afirmando que tinha mais de US$ 10 bilhões em outros ativos, e ainda se ofereceu para recomprar os tokens de CZ por US$ 22 numa operação privada.
Desde o domingo, quando o bate-boca veio a público, o token FTT desabou 12,5%, de US$ 25,50 para US$ 22,30. O caso teve efeito nas principais criptomoedas, que tiveram um final de semana positivo após um pequeno rali desde a decisão de política monetária na última quarta-feira.
O bitcoin, que foi negociado a US$ 21.417 no domingo, caiu quase 4% e voltou ontem a US$ 20.575. O desempenho do segmento contrastou com a alta em Wall Street. A bolsa de Nova York encerrou o dia com ganho de 1,31% no índice Dow Jones e de 0,96% no S&P 500. A Nasdaq subiu 0,85%.
Como a FTX tem uma fatia relevante em tokens da Solana, uma blockchain alternativa em custo e velocidade ao Ethereum, investidores também passaram a vender a moeda nativa dessa rede, temendo que a corretora fosse se desfazer desses ativos. A moeda da Solana, a SOL, chegou a desabar mais de 12%.
Fonte: Valor Econômico

