Por Victor Rezende, Augusto Decker, Gabriel Caldeira e Matheus Prado — De São Paulo
14/06/2023 05h02 Atualizado há 5 horas
O forte rali observado nos ativos brasileiros nas últimas semanas deu espaço, na sessão de ontem, a uma correção nos mercados domésticos, sobretudo nos juros futuros, que se ajustaram em alta firme. O exterior contribuiu para o movimento, diante da disparada das taxas dos Treasuries, o que também levou o Ibovespa a realizar lucros. O câmbio, porém, passou ileso e, mesmo sem muito fôlego, a apreciação do real teve continuidade, na medida em que o viés positivo dos agentes com a moeda brasileira segue em curso.
É com ansiedade que os agentes do mercado aguardam a decisão de política monetária do Federal Reserve (Fed) hoje à tarde. No entanto, isso não impediu o mercado de juros americano de exibir volatilidade acentuada na sessão de ontem, onde a taxa da T-note de dez anos teve forte alta, ao subir de 3,740% para 3,828%, maior nível desde 9 de março.
Passadas as discussões sobre o teto do endividamento público dos Estados Unidos, o mercado começa a embutir nos preços um cenário de aperto de liquidez, na medida em que o Tesouro americano começa a recompor o seu caixa. Os sinais emitidos pelo Tesouro indicam emissões robustas à frente e, como consequência, os agentes começam a exigir prêmios maiores, o que pressiona os Treasuries.
Como consequência, também o mercado doméstico foi afetado e, ontem, a taxa do DI para janeiro de 2027 passou de 10,535% para 10,745%; e a do DI para janeiro de 2029 escalou de 10,90% para 11,13%. No entanto, embora os Treasuries tenham contribuído com parte do estresse no mercado local, os investidores aproveitaram a alta das taxas para corrigirem excessos, ao se ter em vista que a curva de juros brasileira era negociada nos níveis mais baixos desde dezembro de 2021.
O exterior, assim, ajudou em um movimento de realização de lucros que também afetou a bolsa brasileira. Por aqui, o Ibovespa fechou em queda de 0,51%, aos 116.743 pontos, enquanto em Wall Street o Dow Jones subiu 0,43% e o S&P 500 avançou 0,69%. O índice eletrônico Nasdaq, inclusive, deixou em segundo plano o aperto dos juros dos Treasuries de longo prazo e encerrou o pregão em alta de 0,83%.
Com a queda de ontem, o Ibovespa deu fim a uma sequência de sete pregões consecutivos de ganhos, em um movimento bastante surpreendente e que teve como base a avaliação de que, em agosto, o Banco Central pode começar a reduzir a Selic. As divergências são crescentes entre os agentes econômicos, no momento em que boa parte dos analistas mantém um tom cauteloso e indica a reunião de setembro para o início de um ciclo de flexibilização.
Nesse sentido, declarações do diretor de organização do sistema financeiro e resolução do Banco Central, Renato Dias Gomes, em entrevista ao jornal “O Estado de S.Paulo”, foram lidas como mais conservadoras e ajudaram a impor alta aos juros de curto prazo. Ontem, a taxa do DI para janeiro de 2024 subiu de 12,995% para 13,075%. Mesmo assim, a curva de juros continuava a precificar 88% de chance de uma redução de 0,25 ponto na Selic em agosto.
Na visão do economista-chefe da Reag Investimentos, Marcelo Fonseca, as declarações de Dias Gomes e comentários feitos na segunda-feira pelo presidente do BC, Roberto Campos Neto, são consistentes com a possibilidade de a Selic começar a ser reduzida em agosto. “De certa forma havia uma franja no mercado que via possibilidade de início da flexibilização já em junho, e essas declarações dirimiram essa ideia”, afirma. “Mas acho que a ideia de que o cenário irá evoluir para uma situação que permite corte em breve está mantida.”
Fonseca também observa que, nas últimas semanas, o mercado de juros como um todo respondeu de forma consistente aos sinais recentes. Ele lista a aprovação da proposta de arcabouço fiscal na Câmara dos Deputados; a melhor composição da inflação corrente; e à percepção de que o centro da meta de inflação deve continuar em 3%. “Agora, acredito que o mercado está se acomodando a esse novo quadro”, diz Fonseca. “Não há alteração de cenário.”
Embora o dia tenha sido de correção na bolsa e nos juros, o câmbio conseguiu se segurar na tendência positiva recente e anotou mais um pregão de valorização, embora bastante tímida. O dólar fechou em queda de 0,08%, cotado a R$ 4,8624 no mercado à vista no fim do dia, após ter ido a R$ 4,84 na mínima da sessão. A fraqueza global da moeda americana e os preços das commodities ajudaram o câmbio doméstico, no momento em que os agentes ainda reservem algum otimismo em relação ao real em prazos mais longos.
Em revisão de cenário publicada ontem, a economista Iana Ferrão, do BTG Pactual, cortou a projeção para o dólar no fim do ano de R$ 5,30 para R$ 5,10, mas apontou que “o avanço da agenda tributária tem potencial de apreciar a taxa de câmbio para patamar inferior a R$ 4,80 por dólar no fim de 2023”. Já os economistas do Itaú Unibanco reduziram a projeção para o dólar no fim do ano de R$ 5,15 para R$ 5. (Colaboraram Arthur Cagliari, Letícia Simionato e Igor Sodré)
Fonte: Valor Econômico

