Por Jan Wolfe e Mariah Timms, da Dow Jones Newswires — Nova York
20/12/2023 16h32 Atualizado há 18 horas
A decisão do Estado do Colorado de que o ex-presidente Donald Trump não poderá concorrer nas eleições do ano que vem coloca um novo e altamente sensível conjunto de questionamentos constitucionais perante a Suprema Corte dos Estados Unidos, o que provavelmente forçará os juízes a intervir diretamente em uma eleição presidencial de uma forma não vista desde Bush versus Gore em 2000.
A decisão por 4 votos a 3 dos juízes da Suprema Corte do Colorado será quase certamente revista pela Suprema Corte, segundo especialistas jurídicos, e a campanha de Trump disse que vai recorrer.
Os juízes do Colorado colocaram sua decisão em suspenso até 4 de janeiro, antecipando novos litígios. Se Trump recorrer antes disso, a suspensão continuará até que a Suprema Corte decida.
O artigo 3 da 14ª Emenda (feita na época da Guerra Civil) diz que atos de insurreição podem desqualificar alguém para o cargo de presidente. Ações judiciais estão sendo movidas em vários outros Estados, argumentando que Trump é inelegível com base no fato de que ele tentou impedir uma transferência de poder pacífica e incitou a invasão do Congresso dos EUA por uma multidão de apoiadores em 6 de janeiro de 2021. Mas somente no Colorado esse caso teve uma decisão contra Trump.
Os juízes do Colorado reconheceram estar “percorrendo um território desconhecido” e decidindo diversas questões novas como: o que significa ter estado “envolvido em insurreição e rebelião”? Poderá Trump ser desqualificado como insurgente quando ele não foi condenado por tal crime? Deveria caber aos tribunais estaduais decidir sobre a elegibilidade de Trump?
“Este caso clama por uma resolução da Suprema Corte”, disse Jessica Levinson, uma professora de direito eleitoral da Loyola Law School de Los Angeles. “A Corte não pode permitir que as supremas cortes estaduais formem uma colcha de retalhos de decisões. O caso levanta uma importante questão constitucional com consequências urgentes. Eles terão de agir e agir rapidamente.”
Além das questões jurídicas fundamentais, os juízes estão bem conscientes das consequências sísmicas de qualquer decisão nacional que efetivamente impeça Trump de concorrer à reeleição. Um grande número de apoiadores de Trump continua a acreditar nas suas afirmações infundadas de que a eleição de 2020 lhe foi roubada. Uma decisão da Suprema Corte que o mantenha fora da eleição estimulará ainda mais essas tensões.
O caso “exerce uma grande pressão sobre a Suprema Corte”, disse Derek T. Muller, um professor de direito eleitoral da Notre Dame Law School, e aceitá-lo exigirá que os juízes “entrem no mais espinhoso dos emaranhados políticos”.
O caso de maior destaque enfrentado pela Suprema Corte foi a disputa Bush versus Gore em 2000, quando ela reverteu uma recontagem ordenada pelo mais alto tribunal da Flórida, entregando efetivamente a Casa Branca a George W. Bush. Aquela decisão de 5 a 4 contribuiu para a percepção pública da Corte como uma instituição política. “Desde Bush v. Gore, a corte tem sido mais cautelosa em casos políticos evidentes”, disse Muller.
Até agora, a Suprema Corte proporcionou poucos estímulos a Trump em seus esforços para impedir as investigações criminais e do Congresso. Em 2020, rejeitou por 7 a 2 os argumentos de Trump para bloquear uma investigação do grande júri do Estado de Nova York e, em 2022, recusou-se a analisar o recurso de Trump contra a decisão de um tribunal de apelação permitindo a um painel da Câmara dos Deputados analisar os registros da Casa Branca relacionados ao ataque de 6 de janeiro.
Apenas o juiz Clarence Thomas indicou que teria considerado o recurso de Trump naquele caso.
A maioria dos observadores da Suprema Corte disse que os juízes reverterão a decisão do Colorado. “Os juízes não querem que pareça que eles estão tirando essa questão fundamental do eleitorado”, disse Levinson. “A única questão real é qual ponto a Suprema Corte vai reverter.”
Todos os sete juízes da mais alta instância da Justiça do Colorado foram nomeados por governadores democratas, embora o presidente do tribunal, Brian Boatright — um dos dissidentes no caso Trump — fosse um republicano registrado na ocasião de sua nomeação para o tribunal, segundo a imprensa local.
Uma questão provavelmente muito importante é se foi dada a Trump uma oportunidade adequada de ele se defender da alegação no caso do Colorado, de que ele incitou uma insurreição. Trump enfrenta acusações criminais federais por sua tentativa de anular as eleições de 2020, mas ele não foi acusado de incitamento nesse caso, movido pelo promotor especial Jack Smith.
“Posso ver a Suprema Corte preocupada com isso e dizendo que, se você vai desqualificar alguém, você precisa dar a essa pessoa mais oportunidades de se defender, porque isso é uma privação muito importante da liberdade e dos direitos”, disse David Orentlicher, membro da Assembleia Legislativa de Nevada e professor de direito da Universidade de Nevada em Las Vegas.
Orentlicher, um parlamentar democrata, vem argumentando há meses que os esforços para desqualificar Trump poderão estabelecer um precedente preocupante.
Esse foi um ponto central na dissidência do juiz do Colorado Carlos Samour Jr. na decisão de terça-feira. “Mesmo que estejamos convencidos de que um candidato cometeu atos horríveis no passado — ouso dizer, se envolveu em uma insurreição —, é preciso haver o devido procedimento processual antes que possamos declarar esse indivíduo desqualificado para ocupar um cargo público”, escreveu Samour.
“Estou perturbado com o possível caos causado por um sistema imprudente, inconstitucional e sem padrões, no qual cada Estado pode julgar casos de desqualificação do Artigo 3 numa base específica”, acrescentou o juiz.
Fonte: Valor Econômico

