Após ganhar tempo com o adiamento da discussão da proposta de Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), o governo abriu o debate interno sobre a revisão da meta fiscal e do déficit para 2024, ao mesmo tempo em que prepara uma estratégia para tentar blindar o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e reduzir o custo político dessa mudança.
Haddad resiste à alteração na expectativa de que o Congresso vote todas as medidas da equipe econômica para zerar o déficit. Em paralelo, a ala do governo que atua na outra direção, encabeçada pelo ministro da Casa Civil, Rui Costa, defende o envio de uma mensagem ao Legislativo a fim de revisar a meta no texto da LDO.
Circularam nessa terça-feira (31) entre alguns ministros, reservadamente, cálculos preliminares, não oficiais, com a projeção de um déficit de até 0,50% do PIB, que alcançaria o montante de R$ 60 bilhões a R$ 70 bilhões. O índice de até 0,50% do PIB foi verbalizado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva na declaração de sexta-feira aos jornalistas, quando reconheceu a dificuldade do governo de alcançar o déficit zero porque não deseja cortar investimentos ou suspender obras. A afirmação gerou ruído no mercado e no governo, uma vez que ia em direção contrária às seguidas assertivas da equipe econômica de que a meta de déficit zero seria perseguida.
A se confirmar o envio da mensagem do Executivo alterando o texto da LDO, esse documento materializaria a derrota política de Haddad e da equipe econômica na defesa do déficit fiscal zero. Por isso, Haddad e seus aliados no governo correm contra o tempo para que as medidas que tornam possível alcançar a meta mais rigorosa sejam votadas.
Na noite desta terça-feira, Lula reuniu-se com Haddad e o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), para discutir saídas para o impasse. Lula e Haddad pediram a Lira que intervenha na articulação para viabilizar a votação urgente da medida provisória que tributa as subvenções relativas ao ICMS. A matéria foi editada com base em julgamento do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que legitimou a cobrança do imposto federal sobre os benefícios.
No entanto, Lira havia pedido ao Executivo o envio dessa matéria na forma de projeto de lei, porque a bancada do Nordeste e os empresários resistem à nova tributação. O problema é que, via projeto, a nova regra começaria a vigorar somente no ano que vem, reduzindo a projeção de arrecadação. Com a medida provisória, a receita estimada sobe para R$ 35,3 bilhões, elevando as chances de se atingir o déficit zero.
Ala ligada a Rui Costa articula texto para alterar a meta no Parlamento
O Valor apurou, todavia, com fontes do entorno de Lira que, mesmo após essa reunião, os líderes partidários ainda questionam o mérito da proposta, e seguem contrários à votação da medida provisória.
Enquanto Haddad age junto a Lira para que os deputados concordem com a votação da medida provisória das subvenções, a ala liderada por Rui Costa começou a esboçar os termos da mensagem modificando a LDO.
O prazo para o envio deste documento, entretanto, é antes da votação do relatório preliminar do deputado Danilo Forte (União Brasil-CE), que estava prevista para esta terça-feira. Para ganhar tempo, a articulação política do governo manobrou para adiar a reunião da Comissão Mista de Orçamento (CMO), e a votação da LDO ficou para a próxima semana.
O relator da LDO, Danilo Forte, disse a interlocutores, entretanto, que, se o governo perder o prazo do envio da mensagem modificativa da meta fiscal, isso não inviabilizaria eventual acordo para que, mais adiante, ele próprio formalize a mudança. Forte só o fará, todavia, com a condição de que a alteração ocorra mediante acordo amplo do Executivo com os líderes do Congresso.
Um influente ministro disse ao Valor que, além de arbitrar o embate em torno da mudança da meta fiscal para 2024, Lula deveria atuar para proteger o ministro Fernando Haddad e, como consequência, a política econômica do governo. Na avaliação deste ministro, caberia a Lula agir para conciliar dois de seus principais auxiliares, Haddad e Rui Costa, que há muito se digladiam sobre a política fiscal.
Enquanto Haddad tenta passar a imagem de uma gestão comprometida com o rigor fiscal, inclusive para atrair investimentos, Costa defende que haja alguma flexibilização na meta para que, em pleno ano eleitoral, não sejam necessários cortes nos recursos voltados para obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), que tem potencial para gerar emprego e renda.
Na avaliação deste ministro, com trânsito na ala política e na equipe econômica, é preciso encontrar o meio termo entre o rigor defendido por Haddad e a flexibilidade almejada por Costa. Ele diz que esse equilíbrio é possível, sobretudo após a aprovação do novo arcabouço fiscal, que impede que o governo extrapole nos gastos públicos.
Fonte: Valor Econômico

