O mercado de data center cresce de forma acelerada no Brasil, impulsionado pelo aumento da demanda por armazenamento e processamento de dados, resultado da digitalização de serviços, avanço da computação em nuvem, internet das coisas e inteligência artificial generativa. A capacidade atual é de aproximadamente 800 megawatts (MW) e pode triplicar com os incentivos do Regime Especial de Tributação para Serviços de Data Center (Redata) no Brasil, na avaliação da Associação das Empresas de Tecnologia da Informação e Comunicação e de Tecnologias Digitais (Brasscom).
“Enxergamos um crescimento de até três vezes, e esse número pode ser ainda maior se o Brasil fizer exportação de serviços. Nossa expectativa é que essa potência aumente para 2,4 gigawatts, ou 2,4 mil MW, até 2030”, estima Affonso Nina, presidente da Brasscom.
Hoje, há 194 data centers comerciais, segundo a Associação Brasileira de Data Centers (ABDC). A potência de tecnologia da informação (TI) já comissionada nesses equipamentos representa cerca de US$ 7,4 bilhões em investimentos em infraestrutura – incluindo construção civil, sistemas elétricos, refrigeração, equipamentos e demais instalações críticas – e aproximadamente US$ 1,8 bilhão por ano em contratos de colocation, serviços prestados por operadores de data center que alugam infraestrutura para empresas de tecnologia. Cerca de 74% do parque é dessa modalidade.
Matheus Rodrigues, sócio-líder do Centro de Excelência em Engenharia de Telecomunicações da Deloitte, estima que a receita do setor com colocation em 2024 foi da ordem de US$ 2 bilhões no Brasil (cerca de R$ 12 bilhões), gerando uma arrecadação de impostos de aproximadamente R$ 3 bilhões. De forma direta e indireta (construção, fabricação de equipamentos, consultoria, operação, instalação, integradores), Rodrigues calcula que a atividade gere cem postos de trabalho por MW.
/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_63b422c2caee4269b8b34177e8876b93/internal_photos/bs/2025/c/m/dzYUHkTmK3CqQGTkjo6A/rev-infra-20251031-058-arte-data-center.jpg)
Já a ABDC projeta que, somando a base instalada e os novos projetos, o setor alcance algo próximo a US$ 6 bilhões por ano em faturamento para operadores de data centers. Se a expansão estimada se materializar nos próximos dez anos, a receita bruta seria de cerca de US$ 43 bilhões, com investimentos em infraestrutura (Capex) estimados em US$ 24 bilhões.
O mercado é composto por diferentes tipos de operador, classificados como hyperscale (grandes data centers, que rodam aplicações na nuvem); data centers para processamento de inteligência artificial (tanto para treinar modelos como para rodar as aplicações de inferência); wholesale (operadores que prestam serviços para grandes clientes); data centers de borda (edge), que ficam localizados mais próximos dos dispositivos e usuários finais, reduzindo a latência); e os data centers de menor porte, que atendem empresas regionalmente ou rodam aplicações de seus sistemas de gestão e produção. “Todos esses data centers são importantes e foram contemplados no Redata”, observa o presidente da Brasscom.
Já a ABDC destaca o potencial do Brasil para se tornar um hub de data centers. “As empresas de TI, inquilinas dos operadores de data center, oferecem serviços como SaaS, computação em nuvem e inteligência artificial e têm faturamento e investimentos muito superiores. Apenas o Capex em hardware costuma ser até dez vezes maior do que o dos operadores de data center”, comenta Renan Lima, presidente da ABDC.
As empresas privadas também veem oportunidades. “A política é muito bem-vinda. Somos do setor de infraestrutura digital e hoje grande parte dos dados é processada fora do Brasil, porque é mais barato contratar fora do que aqui”, afirma Luciano Fialho, vice-presidente de desenvolvimento corporativo e energia da Scala Data Centers. O setor estima que 60% do serviço de cloud consumido no país é processado no exterior.
A medida proposta pelo governo reduz a carga de impostos sobre servidores, CPUs, GPUs e outros equipamentos e antecipa efeitos da reforma tributária, isentando empresas de tributos como IPI, PIS/Pasep e Cofins na compra de equipamentos de tecnologia, além de zerar tarifas de importação para itens sem produção nacional. Em troca, as companhias deverão investir na indústria nacional, direcionar recursos para pesquisa e desenvolvimento e utilizar energia renovável e recursos naturais de forma sustentável.
A Scala é um operador de data centers que constrói o prédio, fornece espaço energizado, conectividade, sistema de resfriamento e segurança física e oferece essa infraestrutura para hyperscalers como Amazon, Microsoft e Google processarem grandes volumes de dados. Somente no campus Tamboré, em Barueri (SP), tem seis prédios em operação, três em construção e oito em planejamento, totalizando capacidade para 700 MW. “O Redata está bem estruturado e vem dar competitividade ao processamento de dados”, diz Fialho.
Victor Arnauld, presidente da Equinix, empresa especializada em data centers e serviços de interconexão, elogia a forma como o Redata estruturou os incentivos: “As contrapartidas de pesquisa e desenvolvimento são menores se os data centers forem instalados em regiões onde o governo quer desenvolver. Isso é saudável, porque a grande parte da indústria hoje está concentrada nos grandes centros”. Com mais de 270 data centers em seis continentes, a Equinix avalia acelerar investimentos para atender à crescente demanda. No Brasil, possui oito complexos e investe cerca de R$ 1 bilhão por ano. O empreendimento mais recente é o SP6, em Santana de Parnaíba (SP), previsto para 2026, com capacidade inicial para 1.125 racks.(espécie de prateleiras onde ficam os servidores).
Para Marcos Siqueira, diretor da Ascenty, a política de incentivo já abre oportunidades, mesmo antes da aprovação da Medida Provisória nº 1.318/25 (que instituiu o Redata) pelo Congresso. “Posso afirmar que, nas últimas semanas, as conversas com grandes clientes, tanto americanos como asiáticos, aumentaram significativamente”, relata. Segundo ele, projetos que estavam “congelados” foram acelerados. Além dos incentivos fiscais, a matriz energética limpa é outro atrativo do país, especialmente diante do excesso de geração de energia eólica e solar, que vem levando o Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) a determinar cortes (o chamado curtailment).
A Ascenty tem 25 data centers em operação e investe em média R$ 1,3 bilhão por ano. No Brasil, possui unidades em São Paulo, Rio de Janeiro e Ceará, além de operações no Chile, Colômbia e México. A meta é alcançar 38 data centers até 2029.
Já a Elea Data Centers anunciou recentemente que venceu licitação para fornecer um data center para a Petrobras. O contrato, de R$ 2,3 bilhões e prazo de 17 anos, prevê a implantação de uma estrutura de alta capacidade para hospedar supercomputadores e processar dados científicos das áreas de exploração, pesquisa e reservatórios.
Novos entrantes também estão otimistas com o Redata. “É um avanço muito importante e coloca o Brasil em uma posição muito competitiva”, afirma André Busnardo, diretor comercial da Tecto, unidade de negócios da V.Tal. A empresa atua em modelos de data centers hyperscale e edge, com infraestrutura integrada à rede de fibra óptica da V.Tal, operando quatro data centers no Brasil – um no Rio de Janeiro e três em Fortaleza (CE) – e dois na Colômbia.
O empreendimento mais recente é o Mega Lobster, inaugurado em Fortaleza, voltado para aplicações em IA, nuvem e edge, com potência total instalada de 20 MW e investimento de R$ 550 milhões. O plano de expansão prevê aportes de US$ 1 bilhão em data centers na América Latina, incluindo um novo empreendimento em Santana de Parnaíba (SP), com 200 MW de potência, e unidades em Porto Alegre (RS), Belém(PA) , Salvador (BA), Belo Horizonte (MG) e Brasília (DF).
O mais novo player do mercado é a TIP Brasil, que inaugura em novembro um data center em Campinas (SP), com capacidade para até dois mil racks. A empresa investiu R$ 500 milhões na aquisição, modernização e expansão da estrutura para atender provedores de internet, empresas de segurança e governos, com serviços de colocation e cloud.
A existência de impactos ambientais negativos, especialmente o elevado consumo de água, gera críticas aos data centers. Levantamento da Brasscom, com apoio da ABDC, mostra que 80% dos data centers usam equipamentos de computação em circuito fechado (tecnologia de resfriamento com condensação a ar, com abastecimento único de água). Os outros 20% do parque atual são legados e usam tecnologias antigas de resfriamento a água (como as torres de resfriamento), com consumo constante de água. O consumo total, nas duas modalidades, foi de 0,003% em 2022, e a projeção é de 0,008% em 2029, em relação ao consumo total de água no Brasil.
O consumo de energia elétrica pelos data centers em 2024 foi de 1,7% da eletricidade gerada no país, com previsão de aumento para 3,6% em 2029. “Há um crescimento importante, mas o Brasil tem capacidade de produzir essa energia. O que há hoje é um gargalo na transmissão, de onde ela é gerada para onde é consumida”, informa o presidente da Brasscom.
Fonte: Valor Econômico

