11 Nov 2022 ANDRÉ BORGES LAURIBERTO POMPEU
O presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT) fez ontem um discurso com críticas à “tal da estabilidade fiscal”, ao defender que é preciso colocar a questão social à frente de temas que interessam, segundo ele, apenas ao mercado financeiro. O petista também questionou por que ter meta de inflação e não ter uma meta para o crescimento do PIB.
“Por que as pessoas são levadas a sofrer por conta de garantir a tal da estabilidade fiscal desse País? Por que toda hora as pessoas falam que é preciso cortar gastos, que é preciso fazer superávit, que é preciso fazer teto de gastos? Por que as mesmas pessoas que discutem teto de gastos com seriedade não discutem a questão social neste País?”, questionou ele, em discurso no Centro Cultural Banco do Brasil, onde se reúne a equipe de transição de governo.
A reação dos investidores foi imediata. A Bolsa de Valores, que já havia iniciado o dia em baixa por conta de fatores como a indefinição sobre o comando da área econômica no novo governo e o resultado do IPCA de outubro (de 0,59%, acima das previsões), recuou ainda mais, para fechar em queda de 3,35%, aos 109.775 pontos.
Na outra ponta, o dólar avançou 4,14% e bateu em R$ 5,39. Ao lado do peso argentino, o real foi ontem uma das poucas moedas a perder valor frente ao dólar. O índice DXY (que mede o desempenho da moeda americana frente a seis divisas fortes) caiu mais de 2%, refletindo o resultado das eleições parlamentares nos EUA.
Questionado no fim do dia sobre essa reação, Lula chamou os agentes do mercado financeiro de “sensíveis”. “Nunca vi mercado tão sensível quanto o nosso. É engraçado que esse mercado não ficou nervoso com quatro anos de Bolsonaro”, respondeu. Depois, publicou a declaração nas redes sociais com o título “Podem ficar tranquilos”.
FORA DO TETO. Como mostrou o Estadão, ganhou força na equipe de transição do novo governo a opção de retirar, de forma permanente, todas as despesas com o Auxílio Brasil (que deve voltar a ser chamado de Bolsa Família) do teto de gastos – regra que atrela o crescimento das despesas do governo à inflação. Para o setor financeiro, a saída que vem sendo negociada, e que passaria pela edição do que foi batizado como Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da Transição, pode deteriorar a trajetória de sustentabilidade da dívida pública.
Durante seu discurso, Lula disse que é preciso mudar a forma de encarar determinados gastos que são feitos pelo poder público. “É preciso mudar alguns conceitos. Muitas coisas que são consideradas como gastos neste País precisam passar a ser encaradas como investimento. Não é possível que se tenha cortado dinheiro da Farmácia Popular em nome de que é preciso cumprir a meta fiscal, cumprir a regra de ouro”, disse o petista. Críticos à expansão sem controle das despesas afirmam, porém, que a responsabilidade fiscal é o que permite mais gastos para o social, ao se economizar com a conta de juros da dívida.
Lula chorou e chegou a interromper sua fala quando citou um trecho do discurso que fez em sua vitória de 2002, ao comentar o tema da fome, que voltou à pauta nacional. “Se quando eu terminar esse mandato cada brasileiro estiver tomando café, almoçando e jantando, eu terei cumprido, outra vez, a missão da minha vida”, disse o presidente eleito. “Restabelecer a dignidade do povo é a única razão de eu voltar.” •
Fonte: O Estado de S. Paulo

