O momento passou sem alarde. A China Evergrande, uma incorporadora imobiliária que já representou o auge do poderio econômico da China, foi formalmente retirada da Bolsa de Valores de Hong Kong nesta segunda-feira, 25.
A Evergrande, que estreou no mercado financeiro de Hong Kong há 16 anos, já foi a incorporadora imobiliária que mais cresceu em um país repleto de promessas de lucros para os investidores. Ela será lembrada como uma das empresas mais endividadas do mundo, cujo colapso levou o sistema financeiro chinês à beira do abismo.
A empresa testou a política de longa data de Pequim de “grande demais para falir” em relação às suas maiores empresas. Ela destruiu a tolerância do governo com empréstimos descontrolados por parte de corporações gigantes. E o colapso da Evergrande em 2021, com mais de US$ 300 bilhões em dívidas, expôs as vulnerabilidades da economia chinesa e sua dependência do setor imobiliário como motor de crescimento.
Agora, o que resta é a carcaça de um gigante corporativo — 1,3 mil projetos imobiliários ainda não concluídos em mais de 280 cidades e centenas de milhares de compradores de imóveis ainda esperando por seus apartamentos. Além disso, há uma longa fila de credores, desde empresas na China que trabalharam para a Evergrande até investidores em Londres e Nova York que apostaram nela, ainda esperando para serem reembolsados.
No ano passado, uma juíza de Hong Kong ordenou que a Evergrande fosse desmantelada. Ela nomeou a Alvarez & Marsal, uma empresa especializada em falências que já havia ajudado a liquidar o Lehman Brothers, para realizar a tarefa. Após um ano e meio de trabalho, os liquidatários, dois executivos da Alvarez & Marsal, deram pequenos passos para ajudar os credores estrangeiros a receberem pequenas parcelas do que lhes é devido.
Os documentos mais recentes divulgados publicamente pela Evergrande demonstram os desafios.
Os credores tomaram centenas de medidas legais contra os projetos da Evergrande na China, e dezenas de ativos foram congelados. Em alguns casos, investidores ou governos locais assumiram o controle dos empreendimentos. É difícil para os liquidatários de Hong Kong recuperar ativos para outros credores devido à complexa estrutura empresarial da Evergrande, com milhares de subsidiárias.
Para extrair dinheiro do que resta da Evergrande, os liquidatários precisam assumir o controle de cada subsidiária, uma por uma. A Alvarez & Marsal assumiu até agora o controle de mais de 100 empresas e ativos no valor de cerca de US$ 3,5 bilhões.
Mas apenas cerca de US$ 255 milhões dos US$ 45 bilhões que os credores em Hong Kong afirmam que lhes são devidos foram recuperados. E os liquidatários alertaram que até mesmo o valor de alguns dos ativos apreendidos está em questão, lançando “sérias dúvidas sobre os valores, se houver, que podem ser finalmente realizados em benefício dos credores da empresa”.
Os liquidatários estão buscando outra via legal para tentar extrair dinheiro da Evergrande: processando o ex-presidente, Hui Ka Yan, sua esposa, Ding Yu Mei, e o ex-diretor executivo da Evergrande, Xia Haijun. Um processo em andamento em Hong Kong, com audiências fechadas ao público, tem como alvo US$ 6 bilhões em ativos que Hui e outros executivos pagaram a si mesmos nos anos após a abertura de capital da Evergrande em Hong Kong.
É um estudo sobre os excessos de uma era passada no setor imobiliário chinês, outrora livre e desenfreado. Até agora, o caso tem se concentrado principalmente nas esposas de Hui e de Xia. Ele foi detido em 2023 e, desde então, as autoridades o multaram em US$ 6,5 milhões e o acusaram de “organizar fraude”.
Um processo recente apresentado ao tribunal alegou que Xia Haijun, que foi multado em US$ 2 milhões e banido dos mercados financeiros por uma importante autoridade reguladora chinesa por fraude com títulos, está escondendo ativos no valor de US$ 24 milhões em várias casas e carros de luxo na Califórnia.
Uma dessas propriedades, em Irvine, vale US$ 6,3 milhões e foi comprada em abril de 2022, um mês depois que a Evergrande adiou repentinamente seus resultados anuais para 2021 e disse que US$ 2 bilhões em empréstimos haviam sido apreendidos pelos bancos, segundo documentos judiciais. Vários meses depois, Xia renunciou ao cargo devido ao que a empresa disse ter sido um plano para canalizar US$ 2 bilhões de uma subsidiária para uma de suas empresas listadas em Hong Kong.
Apenas alguns meses antes de Xia ser multado em março de 2024, sua esposa gastou US$ 14,5 milhões em uma mansão em Newport Beach, de acordo com documentos judiciais. Ele disse ao tribunal que não tem nada que valha mais do que US$ 6,4 mil.
Fonte: Estadão

