Depois de renderem até 250% do CDI por vários meses ao longo do ano, os fundos de debêntures incentivadas levaram um tombo em outubro. Uma correção dos prêmios de risco, que tiveram alta relevante nos últimos dias do mês, fez o retorno ficar abaixo do CDI ou até no campo negativo. Embora o movimento dos spreads (diferença da taxa para o título público de referência) tenha sido visto como saudável por gestores, já que as taxas pagas por esses papéis estavam muito reduzidas, o impacto no rendimento das aplicações levantou o temor de um aumento significativo nos resgates desses fundos. Nessa hipótese, a mexida poderia se tornar ainda maior.
Eduardo Alhadeff, sócio e chefe de investimento (CIO) de crédito da Ibiuna diz que a redução dos spreads em agosto e setembro havia sido excessiva e a reavaliação das emissões pode tornar as taxas mais condizentes com o risco de crédito. Mas ele vê com preocupação o risco de saída de recursos. “O importante agora é monitorar resgate e captação dos fundos, pois uma saída mais pronunciada dos investidores pode gerar uma pressão vendedora de debêntures, que faria os spreads de crédito abrirem novamente e que poderia gerar mais resgates devido à performance fraca, iniciando um ciclo vicioso.”
Como os fundos estão com bastante caixa, Alhadeff avalia que é possível que haja um fluxo comprador nos próximos três meses. O sócio da Ibiuna afirma que o fundo da gestora rendeu 0,20% no mês (o equivalente a 15% do CDI), porque a exposição a papéis mais longos, com spreads muito negativos – os que mais sofreram no mês – era pequena e a parte da carteira não incentivada garantiu bons ganhos, principalmente os bonds offshore de emissores da América Latina.
Entre os resultados negativos no mês está, por exemplo, o fundo Safra Debêntures Incentivadas CP, com -0,64% em outubro, depois de garantir ganho de 2,67% (219% do CDI) em setembro. No ano, o acumulado é 12,37% (105,77% do CDI). Já o Daycoval Debêntures Incentivadas FIF teve rendimento negativo de 0,4% no mês passado, enquanto em setembro havia rendido 163% do CDI (2%). No ano, acumula ganho de 11,7% (100,2% do CDI).
O retorno do fundo Itaú Debêntures Incentivadas CDI CP caiu de 2,88% (236% do CDI) em setembro para 0,49% (50% do CDI) em outubro. No ano, rende 13,7% (117% do CDI). Outro exemplo é o XP Juros Ativos CDI Debêntures Incentivadas CP, cujo ganho caiu de 1,79% em setembro, ou 147% do CDI, para 0,12% em outubro (9,64% do CDI). No ano, o ganho acumulado é de 13,68% (117,48% do CDI).
O BB RF Debêntures Incentivadas CDI, por sua vez, ficou quase no zero a zero, com 0,02% em outubro (1,86% do CDI), frente a 1,87% (153% do CDI) em setembro, e acumula 11,58% no ano (99,03% do CDI). O Bradesco Deb Inc CDI teve ganho de 0,43% (35,51% do CDI), contra 2,23% (182,90%) em setembro; no ano tem retorno de 12,97% (110,89% do CDI). E o fundo Santander Incentivado CDI ficou ligeiramente negativo, em 0,06%, enquanto em setembro havia rendido 2,62% (214% do CDI). No ano, o retorno está em 14,20% (121,41% do CDI).
A alta dos prêmios de risco começou na segunda metade de outubro, depois de as taxas atingirem em 16 de outubro o menor patamar em dois anos, de 0,81 ponto percentual em média, abaixo da NTN-B. No dia 24, os spreads subiram 0,49 ponto em média, para 0,32 ponto abaixo do rendimento do papel federal, segundo dados da área de pesquisa do Banco ABC Brasil. No jargão do mercado, o spread sobe quando o valor do título cai e vice-versa. Com o preço mais baixo, a cota do fundo é reajustada para um valor menor, refletindo o mercado. Em carta a clientes, a gestora Ibiuna vê influência, na correção, da menor pressão compradora que se deu com o fechamento de fundos de investimento dedicados e a não aprovação da MP 1.303, que tratava do fim da isenção tributária da classe.
Em outubro, os fundos de papéis incentivados captaram R$ 15,2 bilhões, segundo relatório mensal do ABC Brasil. Com o resultado, a captação líquida da categoria ultrapassou a marca de R$ 100 bilhões e agora soma R$ 106,3 bilhões no ano. Já os fundos de crédito privado registraram captação líquida de R$ 22,6 bilhões no mês passado, a maior desde outubro de 2024 e 31% acima do resultado de setembro (R$ 17,2 bilhões). No ano, os aportes já superam os saques em R$ 98,6 bilhões.
De acordo com Christopher Galvão, analista da Nord Investimentos, nos últimos dois anos, os fundos de crédito privado foram destaque em desempenho, uma dinâmica que foi se retroalimentando. Quanto mais captavam, mais compravam papéis no mercado, o que elevava o preço e reduzia os spreads. “No último mês, vimos uma queda insustentável, que levou a essa correção. Ainda assim os spreads estão muito baixos, e na nossa visão não estão compensando o risco de financiar uma empresa”, avalia.
Galvão diz que os fundos não vão repetir a mesma performance dos últimos dois anos, porque os spreads não vão mais cair na mesma magnitude. “O investidor não deveria olhar somente para a rentabilidade nos dois últimos anos, mas avaliar como esses fundos podem se comportar nos próximos dois anos. Esse é o momento para ter muito mais cautela em relação à classe de crédito privado como um todo”, diz.
Fonte: Valor Econômico

