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Ao manter a projeção de inflação no horizonte relevante em 3,4%, o Copom passa a mensagem de que os cortes de juros ainda permanecem distantes. Essa foi a mensagem mais conservadora embutida no comunicado da decisão de ontem, segundo o economista-chefe da JGP, Fernando Rocha, e deve ter como efeito a retirada das apostas de que a Selic comece a ser cortada ainda em 2025.
Valor: Qual foi a impressão geral do comunicado?
Fernando Rocha: A impressão geral é que ele foi bem minimalista e evitou fazer comentários adicionais ao que já havia sido dito. Mexeu no parágrafo que indicava que estava “continuando a interrupção” e [disse] que agora seguirá vigilante para ver se a manutenção é suficiente para convergência da inflação. Fica um português melhor.
Valor: A alteração era esperada?
Rocha: Sim. Antes dava a ideia de que o Copom estava em um ciclo de alta e parou para avaliar. Como ele já estaria parado há duas reuniões, não fazia sentido manter a frase. O BC não está mais subindo, está parado, portanto, ele reafirmou algo que, para mim, era óbvio. Não vejo muito conteúdo informacional nisso. Apenas fica mais arrumado e coerente com a realidade.
Valor: As projeções no horizonte relevante se mantiveram em 3,4%…
Rocha: Existia a expectativa de boa parte do mercado que a projeção pudesse ir para algo como 3,2% ou 3,3%. Mas a projeção não se mexeu. Essa parte pode ser considerada como mais ‘hawkish’ [conservadora].
Valor: O BC conseguirá afastar a ideia de proximidade dos cortes?
Rocha: Acredito que sim. Principalmente porque manteve a projeção em 3,4%. Quando ele fala que a inflação está “ao redor da meta”, ele se refere a algo como 0,1 ou 0,2 ponto. Se está dizendo que está com 0,4 ponto de inflação acima do centro da meta, 18 meses à frente – que é um período bastante longo – ele passa a impressão de que o corte de juro não é iminente.
Valor: Espera reflexos da decisão no mercado amanhã?
Rocha: A curva deve “abrir” na parte curta. A parte longa pode até cair, porque o Copom passou essa impressão mais ‘hawkish’.
Valor: Houve melhora no câmbio e nas expectativas de inflação do último Copom para cá. Mesmo assim, a projeção não caiu. Indica que houve revisão do hiato?
Rocha: Provavelmente. Quando tentamos replicar o modelo sem mudar o hiato, ele mostra uma projeção menor. A inflação corrente veio mais baixa, o câmbio e as expectativas melhoraram. Então, provavelmente, o BC revisou o hiato por ter concluído que não iremos ver aquela trajetória projetada antes. Ainda não há sinais de abertura do hiato provenientes do mercado de trabalho, que é um componente importante.
Valor: O Copom usa a revisão do hiato para passar uma mensagem?
Rocha: O modelo não é escrito em pedra. Há flexibilidade para fazer uma calibragem e passar a mensagem que ele deseja. O modelo guarda essa flexibilidade e, provavelmente, o Copom usou para sinalizar que não está satisfeito com a trajetória do hiato e com as projeções de inflação a ponto de deixar o mercado pensar que o corte está próximo. Passa a impressão que os cortes estão distantes.
Valor: Os cortes de juros em dezembro estão fora da mesa?
Rocha: O mercado chegou a precificar os cortes em dezembro, já tinha reduzido essa expectativa, mas começa a ficar bem improvável. Para cortar, ele já precisaria dar uma afrouxada na comunicação. Dada a postura mais conservadora de agora, com a inflação distante da meta, parece pouco tempo para mudar até lá. Deve empurrar a expectativa para janeiro ou março, onde está a maioria das apostas.
Valor: É uma estratégia correta?
Rocha: Acredito que sim. Parece ‘barato’ fazer o que ele está fazendo, já que o processo penoso de subir os juros já foi feito. O BC sinaliza que está fazendo o trabalho e que vai criar a ociosidade necessária para, quando começar o ciclo, começar com bastante margem. É um trabalho de manual.
Valor: Quando os cortes da Selic devem começar?
Rocha: Minha expectativa está em janeiro há um bom tempo. Estamos vendo atividade desacelerar. Chegamos a ter um PIB de 2,5% e estamos com 2,2% em 2025, e já cortamos bastante nossas projeções de inflação. Chegamos a ter 5,8% e temos 4,7% em 2025, com 4,2% para o ano que vem. Mas ainda não temos condições claras para um corte neste momento. Em janeiro, já teremos um segundo semestre todo de atividade mais fraca e pode ser que a inflação já mostre um caminho melhor do que estamos imaginando. Abriria espaço para tirar o excesso de aperto e chegar mais perto do neutro.
Valor: Qual o tamanho do ciclo?
Rocha: Temos um ciclo de 3 pontos percentuais, mas brinco que não vou acertar o tamanho. Isso é um pouco do cenário de estar com um pé no forno e a cabeça na geladeira. A eleição vai ser determinante pela expectativa de política fiscal. Se houver a crença de uma política fiscal mais austera, vão colocar mais cortes no preço e pode ser possível cortar mais por conta do câmbio e da queda nas expectativas. Gera um ciclo virtuoso. Se o consenso for de continuidade na política fiscal, a expectativa deve ser a de que não haverá nem mesmo espaço para os 3 pontos.
Fonte: Valor Econômico

