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Confrontado com uma piora do cenário econômico e das condições financeiras desde setembro, o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC) deve se ver obrigado a ser mais agressivo no processo de aperto iniciado há 45 dias. Uma aceleração do ritmo de alta da Selic para 0,5 ponto percentual é dada como certa no mercado financeiro, que tem revisado para cima as expectativas para a trajetória da taxa básica de juros e, ainda assim, continua a projetar uma inflação cada vez mais distante do centro da meta de 3% ao longo do horizonte relevante.
Das 125 instituições financeiras consultadas pelo Valor, apenas três veem um aumento menor, de 0,25 ponto, no juro básico nesta semana. Todas as outras esperam que o Copom seja mais célere e eleve a Selic em 0,5 ponto, a 11,25% ao ano, já que há uma sensação de deterioração relevante do ambiente econômico. A lista de motivos é extensa: o câmbio sofreu depreciação adicional e já encosta em R$ 5,90 por dólar; a inflação corrente mostra uma composição mais negativa; o mercado de trabalho segue aquecido; e a desancoragem das expectativas de inflação se intensificou no Boletim Focus e no mercado de inflação “implícita”.
O resultado do levantamento guarda semelhança com o que o mercado tem embutido nos preços dos ativos. Na curva de juros, a probabilidade de um aumento de 0,5 ponto está em 74%, contra 26% de chance de uma alta de 0,75 ponto. Já no mercado de opções digitais, a possibilidade de um aumento de 0,5 ponto terminou a sexta-feira em 86%, enquanto as chances de um aperto ainda mais agressivo, de 0,75 ponto, ficaram em 10%.
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O superintendente de pesquisa econômica do Itaú Unibanco, Fernando Gonçalves, avalia que houve mudanças “importantes” desde setembro que justificam a aceleração do ritmo de aperto e cita como exemplo a desvalorização da taxa de câmbio. Se, na reunião passada, o BC utilizou no cenário o dólar a R$ 5,60, agora o câmbio a ser incorporado nos modelos coloca a moeda americana a R$ 5,75.
“Isso embute um impulso importante para a inflação. Também estamos vendo um mercado de trabalho cada vez mais apertado; expectativas de inflação acima da meta; e ainda há uma incerteza grande sobre o processo eleitoral nos Estados Unidos, que, a depender do resultado, também dá uma noção de que os juros podem cair menos por lá. Tudo isso traz uma visão de uma taxa um pouco maior no Brasil”, afirma Gonçalves.
O processo de revisão para cima nas expectativas do mercado para a Selic teve início após o Relatório de Inflação (RI) do terceiro trimestre mostrar de forma detalhada as projeções do Copom, que seguem acima da meta ao longo de todo o ano de 2026 e até mesmo no primeiro trimestre de 2027. Isso levou parte do mercado a interpretar, portanto, que o nível necessário de juros para levar a inflação de volta a 3% deveria ser ainda maior.
Para que a inflação venha a convergir à meta de 3% dentro do horizonte relevante, o Copom teria de aumentar a Selic para, pelo menos, 15% no atual ciclo de aperto monetário, observa o economista-chefe da XP Asset Management, Fernando Genta, cuja projeção oficial aponta para um juro básico bem menor, em torno de 13% em meados do próximo ano.
Na visão de Genta, o ciclo de aperto teria de compensar não somente a política fiscal expansionista, mas também o efeito do último ciclo de queda dos juros, que levou a Selic de um pico de 13,75% para 10,5% entre agosto de 2023 e maio deste ano. “Não acho que esses 15% são exagerados. O problema é o quanto de desinflação a gente tem que colocar numa economia que está crescendo acima do seu potencial”, diz o economista, que já foi secretário adjunto no então Ministério da Economia.
Assim, Genta acredita que o BC tende a optar por uma convergência mais longa da inflação à meta, com um ciclo de aperto mais contido, que leve a Selic a 13% em um ritmo de elevação de 0,5 ponto percentual – a começar pela reunião desta semana. “Quando eu olho o atual conjunto de informações, acho que ele deveria fazer ainda mais rápido, mas as sinalizações dos diretores não vão nessa direção”, afirma.
Durante a participação de dirigentes do BC em reuniões em Washington no âmbito do encontro anual do Fundo Monetário Internacional (FMI) e do Banco Mundial, a impressão de participantes do mercado foi de que o sarrafo para um ritmo ainda mais agressivo de aperto, de 0,75 ponto, era bastante elevado neste momento, o que fortificou as apostas em um ciclo com altas de 0,5 ponto na taxa de juros.
Apesar disso, a curva de juros tem precificado um ciclo cada vez mais extenso. Na sexta-feira, o mercado precificava um ciclo que coloca a Selic entre 13,75% e 14% em 2025 – o que, portanto, levaria o juro básico de volta aos níveis vistos até 2023, quando o BC deu início ao processo de flexibilização.
Com uma dinâmica de inflação corrente que não tem ajudado e diante do estresse mais recente do câmbio, o economista-chefe para Brasil do Barclays, Roberto Secemski, vê um “claro risco de alta” à sua projeção para a Selic, que chegaria a 12% no fim do ciclo.
No entanto, a redução do impulso fiscal, sinais incipientes de possível desaceleração da atividade econômica e algum alívio na pressão salarial vista nos últimos dados de emprego levam o banco britânico a manter, por ora, a expectativa por mais dois aumentos de 0,5 ponto nos juros, seguidos de uma alta final de 0,25 ponto em janeiro.
Acho que ele [BC] deveria fazer ainda mais rápido, mas as sinalizações dos diretores não vão nessa direção”
Secemski, inclusive, se mostra atento à comunicação a ser empregada pelo Copom nesta semana, ao notar que a reunião se dará em um contexto de alta volatilidade tanto pelo risco fiscal local quanto no mundo devido à eleição nos EUA. “O Copom terá de escolher entre deixar a comunicação em aberto, como fez em setembro, sem dar um ‘guidance’ para ter credibilidade, ou indicar a intenção de manter o ritmo na decisão seguinte.”
Há um “trade-off” nessas escolhas, nota Secemski. Caso a comunicação do Copom permaneça sem um sinal claro sobre os passos seguintes, o economista avalia que um possível efeito colateral seria uma reação da curva de juros em que se incorporem cenários de aceleração do ajuste em dezembro. Ou, se o comitê optar por indicar que deseja manter o ritmo de 0,5 ponto em dezembro e, assim, criar um “teto” nas apostas na curva de juros, “o mercado, que anda muito estressado e sensível, poderia entender o guidance como um passo limite, o que seria contraprodutivo no momento em que o BC busca aumentar a credibilidade”.
O cenário de Secemski é o de que a autoridade monetária optará por deixar o cenário em aberto, “até por conta da volatilidade doméstica no campo fiscal, à espera de novidades, e pela indefinição das eleições nos EUA”. Na visão do economista do Barclays, o BC deve optar por uma comunicação mais flexível e que não se atenha a uma prescrição futura específica.
O tom da comunicação do BC, nesse sentido, precisará continuar “duro”, avalia o economista-chefe para Brasil do Bahia Asset Management, Luiz Felipe Maciel, ao esperar que as projeções de inflação do Copom mostrem deterioração adicional, mesmo com os juros mais altos embutidos no Focus.
Além disso, Maciel não enxerga uma diminuição relevante do estímulo fiscal em 2025, o que deve manter a economia aquecida e a inflação, pressionada. “Há estímulos em benefícios à população mais propensa a gastar. Tem uma injeção fiscal em curso e Estados e municípios também estão gastando”, diz. Se o governo entregar um ajuste fiscal relevante, no entanto, o BC poderia ter algum alívio, já que “seria um primeiro sinal concreto, desde que o governo assumiu, de que os gastos podem ser menores”.
De qualquer forma, na conjuntura econômica atual, o balanço de riscos aponta para juros ainda mais elevados do que a projeção de 13% do Bahia Asset, avalia Maciel. “Com a taxa de desemprego indo a 6%, todo mundo vai ter que revisar as projeções de inflação”, afirma.
Embora tenha considerado equivocada a decisão do BC de retomar o aperto das condições monetárias em setembro, o diretor de investimentos (CIO) da TAG Investimentos, André Leite, avalia que a Selic deve subir a 12,5% até o fim do ciclo, o que seria suficiente para, no modelo do BC, levar a inflação para 3,15% caso os juros permaneçam em níveis elevados por um longo período. Contudo, de acordo com Leite, a pressão política sobre a autoridade monetária deve crescer a partir do segundo semestre do ano que vem e os cortes de juros devem começar a partir de setembro, levando a Selic para 10% em 2026.
“Esses 13,5% precificados pelo mercado levariam a projeção de inflação para mais perto de 2% do que de 3% no horizonte relevante. Mas, mesmo com os 12,5% que projetamos, ele não vai conseguir ficar 18 meses com esse juro parado. Vai ter uma pressão gigantesca. Na virada do primeiro para o segundo semestre, vai crescer a pressão para cortar. No nosso desenho, o BC começa a cortar os juros em setembro de 2025 e vai cortando até chegar em uma taxa de 10% em 2026. Acreditamos que o início do processo de corte de juros será mais político do que técnico”, diz.
Do ponto de vista da comunicação, Leite avalia que, no momento, “a bola está no campo fiscal”. “É uma reunião muito mais para ganhar tempo do que para fazer um grande movimento de política monetária”, afirma.
Fonte: Valor Econômico

