Por Arthur Cagliari, Matheus Prado, Gabriel Roca e Gabriel Caldeira — De São Paulo
19/09/2023 05h03 Atualizado há 6 horas
O mercado começou a se preparar para uma série de decisões de política monetária nesta semana, com ênfase nas reuniões do Banco Central do Brasil e do Federal Reserve (Fed, dos EUA), e adotou um tom mais cauteloso nos negócios ontem. As bolsas em Nova York terminaram praticamente estáveis, enquanto o Ibovespa encerrou a sessão em queda, em dia de leve alta dos juros futuros. O câmbio, porém, destoou do comportamento mais cuidadoso e deu prosseguimento à retirada de prêmio, o que levou o dólar a cair contra o real.
“É pouco provável que o Copom abra a porta para uma queda de 0,75 ponto percentual nos juros nesta semana. Embora a inflação subjacente tenha continuado a cair, os dados de crescimento permanecem fortes. Nesse contexto, acreditamos que o real deverá apresentar um desempenho superior, uma vez que os termos de troca também permanecem favoráveis”, diz a estrategista Andrea Kiguel, do Barclays, em nota enviada a clientes. Ontem, o dólar à vista encerrou o pregão negociado a R$ 4,8556, em queda de 0,31%.
O desempenho do real, inclusive, tem chamado a atenção de participantes do mercado. Neste mês de setembro, o dólar acumula queda de 1,91% contra a moeda brasileira, mas registra alta contra a maioria das divisas de mercados emergentes e desenvolvidos.
Para o economista-chefe do PicPay, Marco Antonio Caruso, o cenário externo deu um alívio para o real, que continua a se beneficiar do ainda alto diferencial de juros. “A visão negativa com a China parece ter atingido um pico. Os últimos dados da economia chinesa vieram melhores que o esperado. Coincidentemente ou não, os preços do minério de ferro valorizaram algo em torno de 7% até aqui, enquanto os do petróleo, que é importante para a nossa arrecadação, avançaram 9%”, nota. Ontem, os preços do barril do petróleo tipo Brent se aproximaram de US$ 95.
A alta de preços das commodities pode ser uma explicação para a melhor performance do real. “A visão mais otimista com commodities pode ter levado fundos multimercados brasileiros a adotar uma estratégia um pouco mais ‘vendedora’ de dólar”, afirma Caruso. Dados da B3 mostram que, na semana passada, a posição vendida em dólar futuro, dólar mini, swap cambial e cupom cambial (DDI) do investidor institucional local aumentou US$ 1,73 bilhão.
Além disso, o economista diz que indicadores econômicos nos EUA, que indicam uma desaceleração “tranquila” da economia, podem ser outro motivo para o atual desempenho positivo do real. “A queda dos números de vagas em aberto, do relatório Jolts, está mostrando que os EUA estão supostamente tendo menos pressão salarial, porque vagas que não são preenchidas estão fechando, mas sem gerar desemprego”, diz. “E um pouso suave combina com dólar fraco, ao menos no curto prazo.”
A perspectiva de fluxo também segue no radar de participantes do mercado. Enquanto o governo se prepara para a emissão de “green bonds”, importantes participantes do mercado têm reafirmado o otimismo com os ativos locais após o estresse observado no mês de agosto.
Os estrategistas do J.P. Morgan, por exemplo, reabriram posição aplicada nos juros futuros. “Há espaço para que a curva de juros continue a se beneficiar do ciclo de cortes e para que o mercado precifique uma taxa terminal mais baixa”, dizem. O banco aposta na taxa do DI para janeiro de 2026 a 9,10%.
Ontem, porém, o dia foi de alta dos juros futuros. A taxa do DI para janeiro de 2026 subiu de 10,075% para 10,11%. Nesse contexto, o Ibovespa fechou em queda de 0,40%, aos 118.288 pontos, enquanto, em Nova York, o índice Dow Jones avançou 0,02%; o S&P 500 ganhou 0,07%; e o Nasdaq terminou com alta de 0,01%.
A bolsa local aproveitou a realização de lucros do minério de ferro para uma correção nas ações de empresas relacionadas a commodities metálicas, um dos setores com maior peso no Ibovespa. As ações ordinárias da Vale fecharam em queda de 1,18%.
“O mercado acreditava no início do ano que a China ia reancorar o crescimento do mundo sozinha, se decepcionou e adotou um pessimismo possivelmente exacerbado, o que pode ter criado boas assimetrias. Não estamos hiperotimistas, mas os preços parecem descontados. Ademais, os últimos dados foram melhores e o governo continua falando de estímulos”, diz o responsável pela mesa de ações do BTG Pactual, Jerson Zanlorenzi.
O desempenho do Ibovespa, porém, teve ajuda do petróleo, que puxou para cima as ações da Petrobras: as ordinárias tiveram alta de 1,25% e as preferenciais, de 0,71%, com a distribuição de dividendos também no radar de investidores. Na sexta-feira, a ministra do Planejamento e Orçamento, Simone Tebet, lembrou que os proventos da companhia não foram computados no Orçamento enviado pelo governo ao Congresso e podem ajudar a fechar as contas.
“O petróleo também se beneficia da atividade aquecida nos EUA e da restrição de oferta. Isso ajuda, é claro, as ações da Petrobras, que seguem com preços atrativos, mesmo que o investimento na companhia sempre venha com o ‘disclaimer’ em relação aos riscos de governança”, afirma Zanlorenzi.
Fonte: Valor Econômico

