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Depois de sucessivos recordes de captação de fevereiro para cá nos fundos de debêntures incentivadas, que dão isenção de Imposto de Renda a pessoas físicas, grandes gestoras tiveram que colocar o pé no freio. Em um cenário de spreads (diferença entre os juros pagos pelo papel e o título público de referência) bastante reduzidos por causa da grande demanda, as assets dos maiores bancos privados do país, Itaú, Bradesco e Santander, fecharam fundos para captação, medida que já havia sido adotada por Kinea e Sparta. Já a BTG Pactual Asset adotou a estratégia de manter os fundos em banho-maria e não vem fazendo qualquer esforço de captação.
No Bradesco, o fechamento foi comunicado aos clientes na última quarta-feira, quando o patrimônio dos dois fundos de debêntures incentivadas da asset atingiu R$ 9 bilhões, após captar R$ 3,5 bilhões neste ano. “Não falta papel no mercado, mas temos visto spreads muito apertados. A regra número um é fechar para preservar a rentabilidade dos atuais cotistas”, diz Ricardo Eleuterio, diretor da asset. “O crédito privado tem brilhado em todos os segmentos, da alta renda ao varejo, e as debêntures incentivadas são as protagonistas, com uma explosão na procura.”
Na Itaú Asset, o fundo suspenso, o Itaú Debêntures Incentivadas CDI, começou o ano com R$ 2,8 bilhões em patrimônio líquido e em menos de três meses chegou a R$ 6,8 bilhões. De acordo com a gestora, o objetivo foi “a preservação de valor para os cotistas atuais do fundo”. A empresa manteve abertos outros quatro fundos de incentivadas, mas com perfis diferentes.
No Santander, são quatro fundos, que começaram o ano com R$ 3 bilhões e hoje têm R$ 5 bilhões. Fechados ao longo dos últimos dois meses, um deles chegou a reabrir na semana passada, mas em poucos dias atingiu a capacidade máxima novamente e voltou a cerrar as portas. Guilherme D’Aurea, gestor de crédito privado da Santander Asset, explica que a legislação determina que o fundo mantenha 85% do patrimônio em incentivadas, mas o atual cenário não permite garantir a qualidade de retorno dos títulos, mesmo com a isenção fiscal. “Estamos confortáveis com a carteira agora, mas sem uma previsibilidade de ofertas que permita captar valores mais altos. Portanto, não vislumbramos novas janelas para aportes.”
Assim como D’Aurea, nenhum dos gestores diz conseguir prever quando o mercado vai se normalizar. “A gente sabe que não vai construir portfólio com a mesma perspectiva de retorno do ano passado, mas ainda assim é preciso controle”, afirma D’Aurea. Para Eleuterio, o fechamento das captações pelas assets de bancos pode até ajudar a equilibrar demanda e oferta no curto prazo, já que são as que vêm recebendo a maior parte dos investimentos, mas ele também vê o cenário muito nebuloso. “Não há espaço para pensar em normalizar as estruturas atuais.”
Segundo relatório da área de pesquisa do Banco ABC Brasil, em 2024 até maio os fundos de infraestrutura somam captação líquida positiva de R$ 32,8 bilhões, recorde da série histórica, iniciada em 2022. O patrimônio líquido total atingiu R$ 117,8 bilhões em 581 fundos, enquanto em maio do ano passado era de R$ 45,7 bilhões em 266 produtos. “Tivemos uma mudança estrutural, com menos emissões de títulos e certificados bancários. Várias empresas aproveitaram e anteciparam emissões para captar a preços muito baixos. É normal que haja essa ressaca agora”, avalia Roberto Dumke, chefe de pesquisa do banco.
Ele se refere à mudança nas regras por parte do Conselho Monetário Nacional (CMN), em fevereiro, que restringiu a emissão de Letras de Crédito Imobiliário (LCIs), do Agronegócio (LCAs), Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRIs) e do Agronegócio (CRAs), reduziu drasticamente o volume disponível para aplicações e levou a essa migração para as debêntures isentas.
Com as gestoras evitando comprar os papéis a qualquer preço, com casos até de retorno oferecido abaixo da NTN-B (cerca de IPCA mais 6% ao ano), o volume distribuído a mercado nas emissões primárias atingiu em maio o menor patamar do ano. Pelo relatório do ABC, apenas 49% do total de R$ 61,9 bilhões em operações foram vendidos, bem abaixo dos 66% de abril. No secundário, os spreads estão nos menores níveis desde 2022, em 60 pontos-base (ou 0,6 ponto percentual) acima da NTN-B, ainda conforme o estudo.
“Os gestores estão segurando as compras e os bancos, encarteirando os papéis”, avalia Dumke. Ulisses Nehmi, CEO da Sparta, vê “racionalidade” nas gestoras. “Tem sobrado muita coisa na mão dos coordenadores. Houve alguma euforia na precificação pós-CMN e o mercado não aceitou.” A Sparta, que tem R$ 13 bilhões sob gestão, fechou dois fundos para captação, um em fevereiro e outro em abril. O Sparta Debêntures Incentivadas Inflação, por exemplo, que há um ano tinha PL de R$ 180 milhões, iniciou o ano com R$ 450 milhões e somava R$ 1,5 bilhão quando vedou novos aportes, em 30 de abril.
Na Kinea, do grupo Itaú, são R$ 11 bilhões em infraestrutura, sendo quase R$ 8 bilhões em fundos que fecharam para captação em março, após ingressos de R$ 1 bilhão em 45 dias. O restante, R$ 2,8 bilhões, está num fundo listado na B3. “O interesse estava sensivelmente maior do que nossa capacidade de alocar bem”, diz Aymar Almeida, sócio da gestora. “A gente vai retornar a captar quando e se conseguir originar operações de baixo risco com bons prêmios.”
A BTG Asset, por sua vez, não chegou a registrar a avalanche vista em gestoras de bancos de varejo, mas a forte aceleração levou a empresa a manter seus fundos em “ponto morto”, comenta Eduardo Arraes, sócio e responsável pelos fundos de crédito. Com R$ 1 bilhão em três fundos abertos – volume que dobrou neste ano -, a asset optou por fazer apenas uma emissão de R$ 500 milhões para o fundo listado na B3 em abril, que agora tem PL de R$ 2 bilhões. “Fomos cautelosos. Temos tentado surfar nesse mercado de forma conservadora, evitando a tentação de captar a qualquer custo, porque alocar está difícil. Vejo um segundo semestre forte de oferta, mas não dá para precisar quando vai reativar.”
Fonte: Valor Econômico

