A economia, junto com a imigração e a idade avançada do presidente, são os maiores problemas de Biden na campanha eleitoral. Uma pesquisa do jornal “The Washington Post” divulgada nesta semana indica que apenas 30% dos americanos aprovam a condução da economia por Biden, o menor patamar da sua Presidência.
Ainda segundo esse levantamento, 74% acham que a economia não vai muito bem ou vai mal, apesar do baixíssimo desemprego, na casa de 4%. Entre os pontos mais negativos, na percepção dos americanos, estão o preço dos alimentos (91% acham que não vai bem ou vai mal), o preço dos combustíveis (87%) e a renda média dos trabalhadores (75%).
E é justamente aí que o petróleo caro poderá causar mais estragos à aprovação de Biden. O aumento do petróleo eleva imediatamente os preços dos combustíveis nos EUA, que já estão perto do maior nível em um ano.
Além disso, a alta dos combustíveis, se se mantiver, tende a se propagar pela economia, atingindo os demais preços, incluindo alimentos. Uma alta geral de preços elevaria a preocupação com a inflação e poderá fazer o Fed (o banco central americano) elevar mais os juros, com impacto negativo na economia.
O preço do barril de petróleo, que em junho chegou a US$ 71,4 (Brent, principal referência global), vem subindo desde então e atingiu ontem US$ 96,55. Muitos analistas especulam que deve chegar logo a US$ 100.
A Opep+ (que reúne a Organização dos Países Exportadores de Petróleo mais dez outros grandes exportadores, incluindo a Rússia) começou a cortar a produção de petróleo em abril, para tentar elevar os preços. Mas a demanda continuou fraca e os preços não subiram. Em julho, o grupo reforçou essa política com um corte ainda maior da Arábia Saudita, o maior exportador mundial. Isso coincidiu com um aumento da demanda global e os preços começaram a subir. Neste mês, a Rússia (segundo maior exportador) e Arábia Saudita concordaram em estender os seus cortes voluntários de produção até o final deste ano.
Além do corte em si, chamou a atenção do mercado a aparente facilidade de russos e sauditas de chegarem a um acordo. No passado, os dois países tinham dificuldade de alinhar suas políticas de produção.
A economia desses dois países depende fortemente do petróleo, e ambos têm interesses imediatos em elevar o preço da commodity, para aumentar a receita.
A Arábia Saudita está embarcando num ambicioso programa de investimentos públicos, que tem como objetivo transformar a economia do país. Isso inclui a construção de uma nova cidade, Neom, futurística e sustentável, ao custo estimado de US$ 500 bilhões.
Já a Rússia está às voltas com uma guerra muito mais longa do que previa na Ucrânia e passou de superávit para déficit nas contas públicas, estimado em 2% do PIB neste ano. Com o apoio ocidental à Ucrânia, não se espera que a guerra acabe tão cedo.
Mas é muito provável que o cálculo político também esteja embutido na equação do preço do petróleo. Tantos sauditas como russos têm interesse na derrota de Biden nas eleições do ano que vem.
Para a Rússia, a vitória de Trump seria o caminho mais curto para vencer a guerra na Ucrânia. O republicano já disse que pretende rever o apoio militar e financeiro dos EUA aos ucranianos. O presidente russo, Vladimir Putin, e Trump se elogiaram mutuamente em várias ocasiões.
Já a Arábia Saudita tem uma aliança histórica com os EUA, mas, para o novo líder do país, o príncipe Mohamed bin Salman, Biden é um aliado incômodo. As relações entre os dois são muito ruins. Em 2019, Biden chamou o príncipe de “pária”, pelo assassinato do jornalista dissidente Jamal Khashoggi. O regime saudita vem desde então se aproximando da Rússia e da China e rejeitou um pedido americano de aumentar a produção de petróleo quando a Rússia atacou a Ucrânia, em 2022, o que fez disparar a cotação da commodity. Já as relações do príncipe com Trump eram ótimas e de mútuo apoio.
Trump tem aproveitado a alta do preço dos combustíveis nos EUA para criticar Biden. Ele acusa o presidente de sacrificar o consumidor americano em favor da política climática, ao dificultar uma maior extração de petróleo no país — Trump rejeita a tese do aquecimento global causado pelo homem e promete produzir o máximo de petróleo possível. Ele diz ainda que resolveria a crise com a Rússia, o que contribuiria para baixar os preços do petróleo.
Biden tem poucas opções de ação para enfrentar o petróleo a US$ 100. Em março de 2022, no início da guerra da Ucrânia, ele autorizou o uso das reservas estratégicas dos EUA para tentar reduzir o preço. Mas o resultado foi pouco efetivo e deixou as reservas baixas, o que dificulta uma nova liberação de petróleo.
A melhor política seria reduzir a dependência dos EUA do petróleo importado, seja pela redução do consumo, seja pelo uso de energias alternativas, mas isso levaria muito tempo.
Uma alternativa de curto prazo seria estimular um aumento na produção interna e na de países aliados. Mas parece haver pouca margem para um aumento rápido e na escala necessária. A produção nos EUA já está batendo recorde histórico, chegando perto de 13 milhões de barris por dia. E os dois países com maior capacidade ociosa são Venezuela e Irã, mas ambos têm regimes hostis aos EUA e próximos da Rússia. Washington vem tentando uma aproximação com a Venezuela, mas ainda sem resultados importantes.
Um fator que depreciaria o petróleo seria uma redução da demanda na China. Mas a economia chinesa, que vinha desacelerando, deu alguns sinais de melhora nas últimas semanas.
Outro fator que reduziria as cotações seria uma recessão nos EUA, com queda de demanda, mas isso quase certamente significaria a derrota de Biden nas eleições de 2024.
Fonte: Valor Econômico

