Por Isabel Filgueiras, Valor Investe — São Paulo
20/11/2023 06h00 Atualizado há um dia
Os fundos de índice negociados em bolsa, mais conhecidos pela sigla em inglês ETFs (Exchange Traded-Funds) já formam uma indústria de US$ 10 trilhões em investimentos em todo o mundo. Para se ter uma ideia do tamanho desse montante, ele é quatro vezes maior que a estimativa do FMI para o PIB do Brasil em 2023.
Apesar de grande, o produto tem potencial para se tornar ainda maior, segundo especialistas. No Brasil, eles também se multiplicam, mesmo em momentos de estresse do mercado, como na pandemia. Entre 2019 e 2023, o número de investidores nessas carteiras, no país, quase quintuplicou.

A maior parte deste crescimento se explica pelos custos mais baixos para desenvolver, manter e distribuí-lo aos investidores. A variedade de fundos de índice de renda fixa e renda variável, muitos temáticos, atende desde os mais conservadores até os mais arrojados.
Para o pequeno investidor, esses fundos se tornam um aliado na hora de diversificar a carteira sem precisar de tanto dinheiro. É possível investir com menos de R$ 100, por meio de cotas negociadas na bolsa. Para os institucionais, que são os gestores de fundos que compram em maior escala, eles também se apresentam como ferramenta de redução de custos.
“Ninguém consegue fazer gestão global sem ETF. O produto existe para dar exposição de forma padronizada, barata e fácil a uma coisa que não é simples de fazer – uma carteira diversificada e calculada”, afirma Bruno Stein, diretor geral da Global X ETFs no Brasil.
“Um exemplo disso é um dos primeiros ETFs, que segue o índice S&P 500, com ações das 500 maiores empresas americanas. Como alguém ia conseguir comprar todas? É mais fácil só investir no ETF e já alcançar essa exposição diversificada por um preço acessível”, completa.
De acordo com dados da empresa de consultoria e pesquisa ETFGI, existem mais de 10 mil ETFs em bolsas de diversos países, desde aqueles que seguem carteiras teóricas tradicionais, como S&P 500 ou o Ibovespa, até os mais nichados, que investem em empresas de blockchain ou inteligência artificial. Há sempre uma novidade no radar. A mais aguardada dos últimos meses é a entrada de grandes empresas de gestão no universo das criptomoedas, justamente por meio do lançamento de fundos de índice.
No Brasil, o mercado de ETFs, apesar do grande crescimento nos últimos anos, ainda é considerado incipiente, englobando um patrimônio de R$ 41 bilhões, entre produtos de renda fixa, renda variável e criptomoedas. A quantia é menos de 10% do que os brasileiros têm guardado na velha caderneta de poupança, que tem um saldo de R$ 960 bilhões, mesmo após recorde de saques, segundo dados de outubro do Banco Central. Em 2019, o patrimônio em ETFs era de R$ 30 bilhões (ver gráfico).
Por ainda estar pouco disseminado e ser de fácil acesso a quase todo tipo de investidor, a tendência é que continue crescendo em ritmo forte por aqui. Nos últimos quatro anos, o número de investidores em ETFs saiu de 111 mil para 503 mil. O volume de recursos investidos nesses produtos também se manteve estável, mesmo em períodos desafiadores para o mercado, como na pandemia.
Depois do fim do ciclo de alta da Selic, os pequenos investidores voltaram a ter uma parcela maior do patrimônio investido em ETFs. Em 2023, no acumulado até outubro, 22% do dinheiro aplicado nesses fundos vêm de pessoas físicas, ante 18% em 2021. Com a queda de juros à vista, a tendência é de que eles se tornem mais atrativos e mantenham forte disputa de recursos com gestores tradicionais.
Por que é mais barato?
As taxas de administração mais baixas que os fundos tradicionais estão entre os principais motivos para a disseminação dos ETFs, que em sua maioria possui uma gestão passiva. Ou seja, não exigem uma estratégia de constante vigilância para gerar retornos acima do mercado.
Diferentemente da gestão ativa, que dá ao gestor a flexibilidade necessária para tentar superar os índices de referência, a gestão passiva dos ETFs replica uma determinada carteira teórica, como o Ibovespa. Esses fundos, geralmente, não têm o intuito de ganhar nada além do índice, apenas buscam uma rentabilidade o mais próximo da referência. Nem mais, nem menos. Basta seguir um conjunto de regras predeterminadas no momento de construção do índice.
Os ETFs não exigem tantos custos de manutenção. Já um gestor ativo requer pelo menos um bom time de analistas. O tempo e o esforço para escolher ações ou títulos com maior potencial de superar o mercado têm um preço e ele é repassado para o investidor em forma de taxas.
No caso de fundos de gestão ativa, os investidores podem esperar taxas de administração mais elevadas, muitas vezes variando entre 1% e 3% ao ano. Sem falar nas taxas de performance que são cobradas se o fundo superar o índice de referência (ou “benchmark”, no jargão do mercado). E é isso (essas taxas) que pode corroer os ganhos, atrapalhando o desempenho desses produtos financeiros.
Por outro lado, os ETFs cobram valores de 0,02% a 1,30% de taxas. É assim que, mesmo com uma proposta mais moderada de remuneração, os fundos de índices conseguem retornos favoráveis, porque no fim das contas, a rentabilidade líquida (aquela após os descontos das taxas) se torna maior.
Algoritmo que trabalha por você
“Temos um time de finanças e tecnologia. Une-se os dois mundos, que é o que gostamos de chamar de ciência financeira. Nós pegamos esse conhecimento e automatizamos as regras. No fim, é como se transformasse a cabeça de um gestor num algoritmo”, afirma João Fernandes, executivo de pesquisa quantitativa da Teva Índices. A empresa brasileira desenvolve índices para o mercado de ETFs nacional.
A partir dessa gestão robotizada, em que um algoritmo passa a trabalhar sozinho após ser devolvido, os custos se tornam menores. Com o aumento no interesse por ETFs, os produtos vêm evoluindo. Todos ano surgem novos fundos de índices temáticos, sempre de acordo com a demanda e de olho no movimento do mercado mundial. Em 2023, o destaque foi para aqueles que investem em papéis ligados à indústria de inteligência artificial, que brilhou com a chegada do ChatGPT e do Bard AI, do Google.
Assim, as empresas de índices passaram a realizar testes e montar novas carteiras, ao gosto do mercado. “Fazemos estudos quantitativos e qualitativos para que nosso índice dê um retorno satisfatório dentro daquele tema”, explica Stein, da Global X.
Gestão ativa ou passiva?
Apesar do sucesso dos ETFs, há gestores excelentes que podem, sim, bater o mercado e enxergar uma diferença entre preço e valor dos ativos para obter lucro em cima dessa percepção. É o chamado alfa, o saldo positivo de algumas operações que faz com que os investidores alcancem um retorno acima da média.
O problema é que esses gurus são raros, difíceis de encontrar. De acordo com um levantamento da Teva Índices, quanto mais longo o prazo, maior a dificuldade de encontrar fundos de gestão ativa que superem as referências. Em um intervalo de três anos, apenas 18% dos fundos ativos abertos e com mais de 150 cotistas superam o Ibovespa. Em cinco anos, o percentual vai para 24%, mas após dez anos, somente 12% deles conseguem o prometido alfa.
“É possível selecionar gestores que conseguem bater o índice de referência. Mas não é fácil achar essas pessoas que conseguem superar a média de forma consistente. São muito procurados e não conseguem receber mais recursos porque não dão conta de gerir o volume de recurso”, afirma Luiz Fernando Araújo, gestor e presidente da Fincap Investimentos.
Segundo o executivo, os ETFs são ferramentas importantes para os gestores, mas a evolução desse mercado também gera um desafio para os profissionais.
“Veremos um filtro mais rigoroso para os gestores ativos, só os mais eficientes terão capacidade de sobreviver e captar recursos. Vão precisar comprovar a capacidade de gerar retorno acima da média. O ETF é um agente depurador, vai filtrar as melhores casas e os melhores profissionais com mais capacidade de entregar retorno”, pontua.
Os excelentes gestores são aproveitados até mesmo dentro da indústria de fundos de índice. Nos Estados Unidos, berço dos ETFs e país onde eles estão mais desenvolvidos, já há o conceito de “ETFs ativos”, que são fundos que replicam estratégia de gestores de renome e negociam as cotas em bolsa. As regras do mercado brasileiro ainda não permitem que isso se repita por aqui. No entanto, o GURU11, ETF do Inter faz algo similar, reunindo composições de fundos de sucesso, dos “gurus do mercado”.
Para Araújo, os ETFs vão continuar crescendo, por serem um produto versátil, que viabiliza investimentos de forma mais ágil e menos custosa. “Não tem comissão, não tem custo de distribuição e vai continuar crescendo. É um produto muito eficiente nesse aspecto, quando você é um gestor e não tem tempo para fazer a seleção de ativos, você aloca em um ETF”, destaca.

No detalhe, há ainda um outro fator de vantagem para os ETFs no Brasil: o imposto reduzido. Diferentemente dos fundos tradicionais, que seguem uma tabela regressiva de taxação que vai de 22,5% a 15% sobre os ganhos, os fundos de índice têm imposto fixado em 15%, sem importar quanto tempo o dinheiro fique aplicado neles.
Fonte: Valor Investe

