Com o forte saldo comercial, impulsionado especialmente pelo aumento do volume exportado de petróleo e de produtos agropecuários, o Brasil parece viver um novo período de bonança externa. Esse benefício do setor exportador tem como uma das consequências gerar um aumento da capacidade de crescimento do país, aponta relatório do Bradesco. Nesse cenário, há espaço para a demanda doméstica (o consumo das famílias, o consumo do governo e o investimento) crescer acima da variação do PIB sem que isso pressione as contas externas, dizem os economistas Marcelo Gazzano, Myriã Bast e Rafael Martins Murrer. Há sinais de que o processo é estrutural, sendo um trunfo importante para o país. Neste ano, o superávit comercial ficará próximo de US$ 100 bilhões, bem acima dos US$ 62 bilhões registrados em 2022.
O Brasil viveu uma era de bonança externa especialmente entre 2006 e 2013. Nesse período, houve uma alta forte das cotações internacionais de commodities, que levou a um crescimento acelerado dos termos de troca do país (a relação entre os preços de exportação e de importação). Isso impulsionou a diferença entre as vendas e compras externas brasileiras, que seriam quase 4 pontos percentuais do PIB menores do que teriam sido no período sem a elevação dos termos de troca, dizem os economistas do Bradesco.
Esse fenômeno, observam eles, permitiu o avanço da demanda doméstica acima do PIB. Entre 2006 e 2013 o PIB cresceu, em média, 3,9% ao ano, enquanto a demanda interna subiu 5%. O componente que mais se beneficiou desse processo foi a chamada formação bruta de capital fixo (FBCF, medida do que se investe em máquinas e equipamentos, construção civil e inovação). “A taxa de investimento saiu de 17% do PIB em 2006 para 21% do PIB em 2013”, informa o relatório.
Na visão dos economistas do Bradesco, algo parecido pode ocorrer atualmente. A diferença é que, em vez de uma mudança de preços relativos, puxada pelo aumento dos termos de troca, “o movimento aparece no volume exportado”.
As quantidades de petróleo destinadas ao exterior estão cerca de 40% maiores do que as registradas entre 2018 e 2019, destaca o relatório. “Isso é resultado de um alargamento importante da produção doméstica, e a expectativa é que essa tendência continue nos próximos anos”, escrevem Gazzano, Bast e Murrer. “As nossas simulações indicam que o volume total exportado estaria 7% ou 3% abaixo do atual caso as exportações de petróleo ficassem no nível médio de 2010-2014 ou na média de 2018-2019, respectivamente”, comparam.
As exportações de produtos agropecuários também têm crescido, num país em que a produtividade agrícola é um grande destaque, o que contribuiu para a safra recorde de 2023, nota os economistas do Bradesco. “Nos 12 meses encerrados em outubro, o volume vendido de produtos agropecuários aumentou quase 30%. Caso as exportações agrícolas tivessem subido no ritmo médio da última década, o total exportado seria 3% menor.”
Segundo eles, a diferença entre exportações e importações representa hoje quase 2% do PIB. “Elas seriam cerca de 1 ponto percentual [do PIB] menores caso não houvesse essa expansão das exportações de petróleo e de produtos agropecuários”, estimam os economistas. “Como os movimentos na produção de petróleo e a produtividade da agricultura são estruturais, é de se esperar que a força das exportações siga nos próximos anos”, destaca o relatório. A conclusão é que isso abre espaço para a demanda doméstica crescer acima do PIB sem colocar pressão sobre a conta corrente, que mostra o resultado das transações de bens, serviços e rendas do país com o exterior.
Em 2023, o déficit em conta corrente pode ficar perto de 1,5% do PIB, bem abaixo dos 2,8% do PIB do ano passado, resultado em especial do forte aumento do saldo comercial. “Assim, podemos ampliar os investimentos do país mesmo com uma baixa taxa de poupança”, avaliam os economistas do Bradesco. No terceiro trimestre deste ano, a taxa de poupança doméstica ficou em apenas 15,7% do PIB, abaixo dos 16,3% do PIB do mesmo período de 2022 e dos 17,2% do PIB de igual intervalo de 2021. Poupar pouco é um dos fatores que impedem o crescimento do Brasil a taxas mais elevadas de modo sustentado, pela dificuldade de financiar o investimento. A bonança externa, se confirmada, poderá compensar em parte esse problema.
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— Foto: Divulgação | GEPR
Fonte: Valor Econômico

