Por Letícia Simionato e Igor Sodré — De São Paulo
04/08/2023 05h03 Atualizado há 3 dias
As constantes frustrações com o desempenho da atividade econômica na China e os riscos elevados de o país enfrentar um ambiente deflacionário têm aumentado a expectativa entre os participantes do mercado sobre novos estímulos monetários à frente. Até o momento, o Banco Popular da China (PBoC, o banco central chinês) tem efetuado reduções tímidas nas taxas de juros e de empréstimos, assim como vem controlando a liquidez dos mercados por meio do manejo da taxa de compulsórios, que cortou por duas vezes neste ano.
No entanto, embora o mercado espere a adoção de novas medidas, o consenso é que o governo não está disposto a tomar decisões robustas, visto que as autoridades estão buscando a desalavancagem da economia, principalmente do setor imobiliário.
O índice de preços ao consumidor chinês surpreendeu o mercado ao anotar deflação de 0,8% na passagem de maio para junho, enquanto ficou estável na base anual. O desempenho da inflação vem na esteira de uma sequência de dados de atividade abaixo do esperado no país.
Neste cenário, em julho, o banco central chinês injetou liquidez no sistema, ao colocar 103 bilhões de yuans por meio do instrumento de empréstimo de médio prazo (MLF) de um ano, a uma taxa de juros de 2,65%. O banco também forneceu 33 bilhões de yuans em fundos por meio de acordos de recompra reversa (chamados de “repo”) de sete dias, a uma taxa de juros de 1,90%. Ambas as taxas de juros permaneceram estáveis em relação à operação anterior, depois de o PBoC ter promovido, em junho, um corte de 0,10 ponto.
Lucas Zaniboni, economista da Garde, explica que a China é o país que mais tem instrumentos de política monetária, de inserção e retirada de liquidez. Para ele, a gestão de liquidez tem uma importância dual para o país asiático atualmente. Por um lado, a economia está muito fraca e precisa de estímulo – já que a meta de crescimento de 5% está sendo colocada em cheque e a inflação está “anêmica” no país. Dito de outra forma, toda a parte macroeconômica pressiona por estímulos fiscais, monetários e de crédito. Por outro lado, há um processo de busca de desalavancagem da economia chinesa, principalmente do setor imobiliário, que cresceu muito nos últimos anos devido ao investimento pesado.
“Desse equilíbrio de forças vem a importância do manuseio da gestão de liquidez e da política monetária da China no contexto atual. A busca pela desalavancagem vem pesando mais, assim, as autoridades devem prezar pela cautela no médio prazo. Isso não significa que não vão estimular a economia, mas vão deixar a desejar, com cortes mínimos nas taxas de juros daqui até o fim do ano.”
Economistas do Goldman Sachs têm opinião semelhante. “Dada a trajetória demográfica desafiadora, os níveis de endividamento já elevados e o mantra ‘moradia é para morar, não para especulação’, qualquer estímulo será apenas direcionado e moderado”, dizem em recente relatório. Em seu cenário base, o banco americano projeta nova redução de 0,25 ponto percentual no compulsório bancário, que em março já foi reduzido em 0,25 ponto, e um corte de 0,10 ponto nas taxas de empréstimo.
O sócio da BRCG e pesquisador associado do FGV IBRE, Livio Ribeiro, defende que, no segundo semestre, deve haver movimento mais amplo de liberação de liquidez. “Não vai ser o suficiente para colocar a economia de pé, mas pode ser bem visto pelo mercado”, diz. Ele acredita que o governo não está somente injetando mais liquidez, mas sim fazendo uma “sintonia fina da liquidez”, suavizando os movimentos entre demanda e oferta.
Investidores também esperam por estímulos fiscais do governo de forma a impulsionar o crescimento do gigante asiático. Analistas, contudo, acreditam que a segunda maior economia do mundo está falhando em não apoiar a demanda de forma eficaz, uma vez que a confiança do consumidor está baixa.
Após a reunião do Politburo, órgão que reúne as principais lideranças do Partido Comunista, em julho, o governo emitiu uma declaração citando várias pequenas medidas destinadas a impulsionar o setor imobiliário, incluindo uma promessa de aumentar a habitação a preços acessíveis.
A economista-chefe do Bocom BBM, Cecília Machado, defende que qualquer estímulo que se concretizar daqui para a frente não será muito diferente do que foi visto até agora. “O que a gente viu ao longo de décadas do modelo de crescimento chinês é que o governo tem uma grande capacidade de mobilização de recursos para investimento, e não tanto para consumo, que ocupa apenas cerca de 40% do PIB.”
Fonte: Valor Econômico

