Por Adriana Cotias — De São Paulo
08/11/2023 05h03 Atualizado há 5 horas
Depois de o CDI ter sido “o grande maratonista” nos últimos três anos e desbancar praticamente todas as classes de ativos, o cenário de juros para baixo no Brasil e de potencial estabilidade nos Estados Unidos é um sinal propício para ativos de risco. Segundo gestores que participaram do fórum de estratégia de investimentos do Bradesco, isso vale para a renda fixa, bolsa ou fundos imobiliários.
Na Bradesco Asset Management, as estimativas são que as taxas referenciais americanas (“fed funds rate”) fiquem em torno de 5% em 2024, caindo a 3,5% em 2025. No Brasil, o Comitê de Política Monetária (Copom) pode baixar a Selic a 9,5% no ano que vem e a 8,5% no seguinte. “O principal ponto é a política monetária americana, isso influencia não só a retomada da economia global, como a própria dinâmica de juros no Brasil”, disse Bruno Funchal, principal executivo (CEO) da gestora. “No fim de 2024, o mundo inteiro vai estar num ciclo sincronizado de queda.”
Após um aperto monetário severo pelos bancos centrais no pós-pandemia, que trouxe revisões importantes de preços, a mudança de ciclo pressupõe uma onda de valorização, segundo Philipe Biolchini, executivo-chefe de investimentos (CIO) da Bradesco Asset. “A gente entende que juro real [alto] faz efeito na economia. No movimento dos EUA, a taxa saiu de quase 3% negativos para quase 3% positivos. Foi agressivo, não houve muitos momentos na história que isso ocorreu e não trouxe reflexos na redução da atividade econômica e na inflação.”
Dados de emprego e o discurso do presidente do Federal Reserve (Fed, o BC americano), Jerome Powell, na semana passada deram um certo parâmetro para os juros nos EUA e a volatilidade tende a ser menor, disse Gustavo Salomão, executivo-chefe de investimentos da Norte Asset Management. E isso importa porque o Tesouro americano é o principal emissor de dívida, baliza a taxa livre de risco do mundo e o valor do dólar. “Agora eu consigo fazer conta, importa para investimentos”, diz.
Quando diminui a volatilidade desse mercado, uma série de fundos aumentam o apetite por risco, afirmou. Para ele, o Fed concluiu seu ciclo de alta com a taxa em 5,5% e em meados de 2024 pode começar a cortar. Esse é um risco que o BC brasileiro mapeia para suas projeções e medir potenciais repercussões no câmbio.
Com perspectiva de inflação abaixo de 4% em 2024, o gestor acha que o BC brasileiro tem condições de reduzir a Selic para até 9,75% ao ano. Essa é uma referência para as companhias listadas na bolsa porque mexe com as margens e com a alavancagem de empresas e famílias. “Os níveis de ‘valuation’ estão muito depreciados e a exposição a ‘equity’ [dos fundos], que estava em 16% em 2021, hoje está na mínima de 10%”, disse Salomão. “No momento em que o BC faz corte de juros e o mercado entende que o Fed parou [de aumentar], as ações vão subir.”
Ele citou que quando se compara o retorno total esperado na bolsa com o juro real da NTN-B, na média as ações podem proporcionar ganhos de 11% a 12% acima da inflação.
A ações na bolsa brasileira têm sido negociadas com um preço/lucro (P/L, que dá uma ideia do prazo de retorno do investimento) de 9 vezes, um dos menores da história, enquanto a NTN-B aponta juro real na casa dos 6%, um prêmio que não se via há muito tempo, citou Biolchini, da Bradesco Asset.
É um período em que a bolsa brasileira está num dos piores momentos de atração de investidores, após resgates da ordem de R$ 40 bilhões dos fundos dedicados. “E isso faz muito preço”, comentou Ricardo Eleutério, executivo-chefe de operações da Bradesco Asset. “O CDI continua muito alto, a verdade é que é difícil falar mal dele. O custo de oportunidade esperado num cenário volátil, de certa forma é confortável para o investidor.”
Na linha do tempo, períodos de redução de juros dão certa margem de segurança para a valorização das ações, disse Biolchini. Na média, depois do corte de juros, num horizonte de 24 meses, o Ibovespa sobe 64%, considerando-se os últimos cinco ciclos de redução da taxa básica. O período em que o índice subiu só 20% coincidiu com a fase de Selic em 2% ao ano.
Para André Raduan, sócio-fundador e gestor da Genoa Capital, apesar das dificuldades do Brasil no campo fiscal, as ações estão suficientemente baratas para aguentar incertezas ligadas à reforma tributária e que podem impactar diretamente as empresas. “Criou-se condições para a bolsa bater o CDI no ano que vem”, disse, referindo-se ao passo cauteloso do BC na redução dos juros. “Foi uma decisão correta, ele vai colher uma inflação melhor na frente e um prêmio de risco mais baixo. Estou otimista com o Brasil.”
Pela análise da Bradesco Asset, estratégias de renda fixa ligadas a prefixados e a títulos que asseguram um prêmio além da inflação são muito atraentes em ciclos de redução da Selic, considerando que o BC seguirá o script de corte mesmo com a inflação acima da meta, disse Biolchini. Ele prefere ativos com vencimentos mais curtos.
Nos últimos três anos, os ativos em geral renderam o equivalente a 70% do CDI, o referencial foi “o grande maratonista” de desempenho, à exceção do índice de crédito privado, disse Eleutério. Caso o futuro repita o passado, olhando à frente a perspectiva é outra.
Ao tomar por base os últimos cinco ciclos de queda da Selic, com uma média ponderada de prefixados carregados até o vencimento e de títulos públicos atrelados à inflação, a rentabilidade foi de 150% do CDI em média. Sem qualquer avaliação de cenário, quem tivesse segurado a renda fixa por cinco anos, em 95% das vezes esse índice hipotético teria batido o CDI. Pelo exercício da Bradesco Asset, se o investidor ficasse posicionado por 24 meses, na média ele ganharia CDI mais 4%; em 36 meses o retorno seria equivalente a CDI mais 5,8%, e em cinco anos, de CDI mais 12%. Mas o investidor tem que saber lidar com os períodos de instabilidade, disse Funchal.
Biolchini disse ainda ver um período promissor para os fundos imobiliários de tijolo, que na média pagam um retorno em dividendos de 9,4% – as carteiras com imóveis físicos do Ifix. “É razoável imaginar que na hora que o ciclo de juros [for incorporado aos preços] tenha uma compressão importante dos spreads, de pelo menos 100 pontos para voltar a média. E se for contundente, numa segunda pernada do ciclo global, os spreads podem vir abaixo da média.”
No crédito, o CIO da Bradesco Asset disse que nem todo ativo é igual, é preciso ter uma análise disciplinada de cada emissor e o gestor estar preparado para usar o secundário para mudar de opinião.
Fonte: Valor Econômico

