Assim que a nova administração assumiu a Sabesp no ano passado, uma das primeiras negociações no departamento financeiro da companhia paulista de saneamento foi renovar um contrato de swap para uma dívida em dólar e em iene com bancos internacionais. O custo ficou abaixo do CDI, o que abriu precedente para a pressão sobre o CFO. “O conselho ficou mal acostumado e só quer CDI menos”, brinca Daniel Szlak, que assumiu a diretoria financeira em outubro.
A pressão sobre custos não é à toa. A Sabesp precisa investir mais de R$ 60 bilhões ao longo de cinco anos, o que significa que a companhia vai se tornar uma emissora ainda mais recorrente no mercado de dívida. Portanto, o desafio de Szlak, aos 36 anos, é viabilizar o financiamento para a universalização de água e esgoto na maior companhia de saneamento da América Latina, no estado mais populoso do país. A maior parte dos investimentos é em tratamento e esgoto.
“Um número que a nossa diretora de operações usa é que, se colocarmos todos os nossos tubos de água, um na frente do outro, temos três voltas na terra. Se a gente fizer o mesmo com esgoto, a gente tem uma volta e meia. Então, de uma forma muito simples, o que a gente precisa fazer é dar mais uma volta e meia na terra com estrutura de esgoto”, diz Szlak.
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Só nos dois primeiros meses do ano, a companhia já tem entre levantados e comprometidos cerca de R$ 6 bilhões. Entram nessa conta os R$ 3,7 bilhões em debêntures que a Sabesp acaba de liquidar – desses, R$ 2,7 bilhões são em debêntures de infraestrutura, carimbadas para investimento em ampliação e retrofit da estação ETE Barueri, que compõe o programa de recuperação do Tietê e atende a 11 milhões de pessoas.
A primeira série de R$ 1,4 bilhão tem prazo de 10 anos e pagamento no vencimento, com taxa de IPCA mais 7,4% (correspondente a NTN-B menos 0,12%), e a segunda série, de R$ 1,3 bilhão, tem prazo de 15 anos com amortização linear nos últimos três. Já os outros R$ 1 bilhão se referem a uma debênture corporativa com pagamento no vencimento, em sete anos, e taxa de CDI mais 0,51% – 220 bps abaixo da dívida tomada na pandemia que está sendo reperfilada.
No Brasil, ‘CDI menos’ para o conjunto de dívida é utopia, claro, para corporações que captam a mercado, limitadas pelo próprio rating soberano, e nem faz parte de qualquer modelagem de analista para a Sabesp. Mas é simbólico do objetivo da companhia de seguir reduzindo o custo.
A alavancagem líquida da empresa estava em 1,7 vez no último balanço e o limite nos covenants é de 3,5 vezes. Nas contas dos analistas, a companhia fica longe desse teto mesmo nos dois primeiros anos, que devem ser os mais pesados em captações – nos relatórios, a projeção média é algo em torno de 2,5 vezes para 2025 e um patamar similar ou menor em 2026.
“Pelo modelo de privatização, que tem reconhecimentos anuais de investimento na composição tarifária, a companhia não vai atingir um nível de alavancagem relativo muito alto, mas nos primeiros dois ou três anos vai ter que captar muito dinheiro”, diz o CFO. “Vamos buscar bolsos e formatos diferentes.”
Os diretores acabam de voltar de uma agenda de encontros com investidores em Nova York, na qual participou o governador Tarcísio de Freitas. A companhia tem analisado o mercado de bonds, se reaproximado do BNDES e também buscado outros bancos internacionais de fomento com os quais ainda não trabalha. Metade do endividamento da companhia é pulverizado no mercado, entre debêntures corporativas e de infra, e metade com órgãos multilaterais.
“Para universalizar, o Piani costuma dizer que todas as empreiteiras precisam participar, já que a base de fornecedores precisa ser robusta. Aqui do meu lado, todos os bancos também precisam participar”, diz o CFO, que foi sondado pelo então futuro CEO Carlos Augusto Piani antes mesmo do leilão de privatização.
Era ainda início de 2024 quando seu mentor na Heinz lhe chamou para um café: “há uma possibilidade razoável de a Sabesp ser privatizada. Se isso acontecer, há uma chance pequena de a Equatorial entrar na disputa e uma chance ainda menor de levar. Caso isso aconteça, quero você como meu CFO”. A Equatorial, como se sabe, acabou sendo a única a dar lance como acionista de referência e levou – os dois foram referendados pelo novo conselho.
A dupla trabalhou junta no Canadá, quando Piani presidia a Kraft Heinz naquele país e Szlak era o CFO. O paulistano formado em engenharia química na Poli começou a carreira em uma butique de M&A, mas foi nas investidas da 3G que rodou o mundo, até que decidiu criar família no Brasil. Nas conversas com headhunters ao longo da carreira, trabalhar num processo de privatização estava nos objetivos – ainda que, para companhias com cultura de estatal e recém-privatizadas, a diretoria financeira tenda a ser o terror dos funcionários e fornecedores.
Na Sabesp, a eficiência é logicamente um dos vetores para gerar valor ao acionista e viabilizar a meta de abastecimento. A companhia gasta, por exemplo, quase R$ 1,6 bilhão em energia elétrica, dos quais 40% no mercado cativo, que tem custo médio 1,5 vez mais alto do que o mercado livre, compara o executivo.
Também está concluindo um programa de demissão voluntária, buscando essa redução de custo de dívida e fez uma revisão de contratos de abastecimento corporativos que tinham desconto – os R$ 800 milhões em descontos vão ser substituídos por um allowance de R$ 300 milhões a partir de 2026, cujas diretrizes são definidas pelo governo do estado.
Mas a prioridade, no caso da companhia, está no aumento dos desembolsos para investimento, o que gera novos contratos com fornecedores e contratações no time. “Nosso foco é capex, capex, capex”, diz Szlak. “Fazer nosso capex é, de longe, o que adiciona mais valor para o acionista.”
Os analistas e investidores também estão de olho em qual vai ser a participação da Sabesp em leilões ou parcerias público-privadas que envolvam outros municípios de São Paulo fora da concessão da empresa (o escopo hoje é de pouco mais da metade das cidades do estado). “A prioridade é o plano de investimentos que já temos, mas M&A é uma questão de timing, que a gente não escolhe. No nosso setor, se ele passa, normalmente são 30 anos para voltar. Então, se fizer sentido, vamos olhar e levar para o conselho e para os nossos acionistas, entre eles o estado.”
Fonte: Pipeline

