Por Victor Rezende e Marcelo Osakabe — De São Paulo
15/07/2022 05h03 Atualizado há uma hora
O processo de aperto monetário nos EUA, os temores renovados de recessão global e a última rodada de piora na percepção de risco fiscal no Brasil fizeram o dólar voltar a operar nos maiores níveis desde janeiro, na casa de R$ 5,40. Dados da B3 sobre a posição no mercado futuro de câmbio, minidólar e cupom cambial (DDI) mostram que, entre o início de junho e a última quarta-feira (13), os fundos locais reduziram em US$ 4,75 bilhões a posição vendida (aposta na queda do dólar) e, no mesmo período, os estrangeiros aumentaram em US$ 5,34 bilhões a posição comprada (que ganha com a alta).
“Não é um bom sinal, mas não é algo sem sentido. O fundamento piorou bastante de dois meses para cá. Os preços das commodities estavam bem, mas isso virou e o diferencial de juros tem diminuído, além de o cenário externo estar bem negativo”, observa Daniel Tatsumi, sócio e gestor de moedas da ACE Capital. Ele nota que o dólar tem operado em níveis bastante altos de forma generalizada e observa que moedas como o peso colombiano e o peso chileno foram às mínimas históricas nos últimos dias em relação ao dólar.
“Quando as outras moedas começam a ir muito mal, é natural a desvalorização do real. E, internamente, não tem motivos para acreditar que o Brasil está fazendo a lição de casa. Toda a questão fiscal não é boa. Até vamos ter um cenário benigno de inflação nos próximos meses por causa da redução do ICMS, mas vai ser algo de dois, três meses”, afirma Tatsumi. Para ele, se, em alguns momentos passados os fatores favoráveis à moeda brasileira estavam alinhados, “agora está tudo apontando para uma desvalorização do real”.
Na avaliação de Marcelo Curvello, gestor de moedas na ASA Investments, o aumento da posição comprada em dólares na B3 está mais relacionado ao exterior e à cautela do investidor local em relação ao noticiário fiscal. “Existia ao menos uma foto positiva do quadro fiscal no Brasil, mas pode não sobrar nem isso. Com o recesso do Congresso, nós achávamos que esse tipo de noticiário poderia acabar, mas pode ser que não seja esse o caso”, afirma o profissional, ao lembrar que a redução do IPI independe de aprovação no Congresso Nacional.
“Em relação ao real, é muito difícil ter uma opinião muito direcional no momento. Eu imaginava que o segundo semestre seria difícil pelo lado externo e pelas eleições, mas a dificuldade atual não está sendo por causa da discussão em relação aos candidatos [à Presidência], e sim por conta das medidas fiscais em discussão atualmente”, afirma Curvello.
Tatsumi, da ACE, avalia que apenas dois fatores, neste momento, seriam favoráveis a uma apreciação do real: o posicionamento técnico, já que as apostas favoráveis ao dólar ganharam força; e o nível já elevado da moeda americana, que ontem chegou a R$ 5,49 na máxima do dia. “Tirando esses dois detalhes, tudo diz que a moeda vai se enfraquecer”, afirma o gestor.
“E alguns [fatos] anedóticos têm levado a mais saída, como a recompra de dívida pela Petrobras e o desempenho negativo das outras moedas, além das commodities afastadas do pico. O medo de recessão fez os preços do minério de ferro e das commodities agrícolas perderem força”, afirma Tatsumi. “Claro que o posicionamento técnico está pior, mas o fundamento também está bem mais negativo”, enfatiza.
Em relatório semanal enviado a clientes, os gestores da Vinland Capital também apontam que estão comprados em dólar contra o real. “Com o [cenário] externo mais desafiador e as contas públicas ainda frágeis, medidas que aumentam os gastos públicos afetam negativamente o risco do país. O risco fiscal e as medidas em vias de aprovação no Congresso fizeram com que a taxa de câmbio se depreciasse e que as expectativas de inflação se deteriorassem”, observa a Vinland.
Da mesma forma, José Tovar, sócio-fundador da Truxt Investimentos, revela que os fundos multimercado da casa têm posições compradas em dólar contra o euro e contra o real. “Com os juros americanos subindo, claramente existe um ambiente de dólar mais forte. É o que estamos vendo acontecendo nos últimos dias [no mercado local]. Um pouco do movimento é fortalecimento do dólar no mundo, mas outra parte se deve a essa política fiscal um pouco mais frouxa que tem sido adotada no Brasil”, diz.
Fonte: Valor Econômico

