O governo Luiz Inácio Lula da Silva apresentou, nesta quarta-feira (6), pedido de consultas aos Estados Unidos na Organização Mundial do Comércio (OMC) sobre o “tarifaço” promovido pelo presidente americano, Donald Trump, ao Brasil. Segundo nota conjunta divulgada pelo Itamaraty e pelo Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (Mdic), a solicitação questiona as medidas adotadas pelos Estados Unidos em 2 de abril e em 30 de julho, que, somadas, resultam na aplicação de tarifas de até 50% sobre diversos produtos brasileiros. O próximo passo é a realização de consultas entre representantes do Brasil e dos Estados Unidos em Genebra.
Na visão da administração Lula, ao impor as sobretaxas ao Brasil, “os Estados Unidos violam flagrantemente compromissos centrais assumidos por aquele país na OMC, como o princípio da nação mais favorecida e os tetos tarifários negociados no âmbito daquela organização”.
A tarifa de 50% a produtos brasileiros foi adotada com base em legislações dos Estados Unidos, como a Lei dos Poderes Econômicos de Emergência Internacional e a Seção 301 da Lei de Comércio norte-americana de 1974.
As consultas entre representantes dos Estados Unidos e Brasil são a primeira etapa formal no âmbito do sistema de solução de controvérsias na OMC e visam, segundo o governo brasileiro, uma “solução negociada para a disputa antes do eventual estabelecimento de um painel”. A data e o local da consulta deverão ser acordados entre as partes nas próximas semanas.
“O governo brasileiro reitera sua disposição para negociação e espera que as consultas contribuam para uma solução para a questão”, escreveram o Itamaraty e o Mdic em nota.
Apesar do pedido de consulta, nos bastidores, interlocutores da gestão Lula não esperam resultados concretos do organismo, mas veem a ação como um posicionamento importante do ponto de vista geopolítico. Segundo fontes do Valor, o objetivo principal do Brasil em recorrer ao órgão é fazer uma defesa enfática do multilateralismo e do respeito a um comércio entre países baseado em regras, após o “tarifaço” dos Estados Unidos.
A possibilidade de o Brasil recorrer à OMC era avaliada pelo governo Lula 3 desde o início do segundo mandato de Trump nos Estados Unidos, quando o americano deu início a um “tarifaço” global. No entanto, a gestão brasileira já via como improvável que os Estados Unidos aceitassem qualquer determinação do organismo e, portanto, apostava que recorrer ao órgão era um ato mais simbólico que prático.
Um dos argumentos do Brasil é que, atualmente, a OMC tem entre seus principais quadros diversas pessoas ligadas ao governo americano, o que diminui as chances de um resultado concreto. A decisão de levar o tema do “tarifaço” ao fórum, porém, tornou-se unânime no governo Lula após Trump anunciar a tarifa de 50% a produtos brasileiros, em julho. A taxa entrou em vigor nesta quarta-feira.
Durante reunião do Conselho Geral da OMC realizada em Genebra no fim de julho, o Brasil reiterou a necessidade de defesa contínua do sistema multilateral de comércio. Além disso, condenou o recurso a tarifas arbitrárias que violam os princípios fundamentais da OMC e ameaçam a economia mundial.
Na ocasião, o Brasil também saiu em defesa para que os países redobrem seus esforços em prol de uma reforma estrutural do sistema multilateral de comércio e da plena recuperação do papel da OMC como “foro de resolução de disputas e de defesa de interesses legítimos de seus membros por meio do diálogo e da negociação”. Após o pronunciamento brasileiro, 40 países (a União Europeia representando 27) manifestaram apoio ao sistema multilateral de comércio com regras comuns e importância de reforma da organização.
A OMC foi criada em 1995, após a “Rodada do Uruguai”, uma série de reuniões de países signatários do Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio (GATT, na sigla em inglês), que entre 1948 e 1994 era o principal conjunto de normas para o comércio multilateral. Os princípios básicos da OMC são não discriminação, previsibilidade, concorrência leal, proibição de restrições quantitativas e tratamento especial e diferenciado para países em desenvolvimento.
Fonte: Valor Econômico

