Por Marcelo Osakabe — De São Paulo
26/06/2023 05h02 Atualizado há uma hora
A melhora na perspectiva da nota de crédito soberano do Brasil pela S&P Global Ratings é o primeiro passo na busca pela retomada do grau de investimento, mas o caminho até lá é longo e precisa ser acompanhado de demonstrações mais claras de que o país tem capacidade de crescer mais consistentemente e também de avanços na agenda de reformas para a produtividade. A avaliação é do diretor da S&P e responsável pelos soberanos da América Latina, Manuel Orozco.
Em participação no Itaú Views, programado para ir ao ar nesta segunda-feira, Orozco comentou que a melhora da perspectiva fiscal entre 2017 e 2019 já fazia a agência de rating cogitar mudança na perspectiva da nota do Brasil, à medida em que o déficit primário foi passando de 2% do PIB para 1%. “Estávamos em posição de indicar uma potencial mudança de rating nos próximos semestres, mas houve a pandemia.”
Em relação à mudança recente na perspectiva para a nota brasileira, ele afirma que a decisão passou pela demonstração, por parte do novo governo, de dar sinais de que o “deslize fiscal” será enfrentado. “Estamos projetando um déficit primário mais perto de 1% do PIB, é uma piora ante 2022, mas claramente estamos vendo mudança na política fiscal, em que ele [o governo] quer mais gasto, porém está procurando mais fontes de financiamento, e isso é importante.”
Orozco citou também o novo arcabouço fiscal, que é mais frouxo que o antigo teto de gastos, mas é também um reconhecimento da falta de flexibilidade do Orçamento brasileiro. “O ajuste fiscal acontece um pouquinho mais devagar, a gente não está falando aí que a posição fiscal do Brasil vai melhorar dramaticamente, mas é importante também que certo esforço está sendo feito para manter essa tendência da dívida sem explodir.”
Ele admite que a melhora do rating, sob esse aspecto, poderia ser mais rápida, mas que essa é uma característica do marco institucional brasileiro. “É difícil de mudar e a implementação das mudanças são graduais”, pondera. Outro fator importante, diz o diretor da S&P, foi a aprovação da independência do Banco Central, que pôde elevar juros durante a eleição e também manter sua postura mais dura contra a inflação mesmo sob fogo cerrado do novo governo, como tem ocorrido agora.
Questionado sobre quais são os fatores que pesam na avaliação da S&P, Orozco afirma que a nota depende 50% da economia e da institucionalidade, 50% do perfil individual da dívida e da posição externa. Em relação ao primeiro, ele diz que o Brasil não cresceu nos últimos dez anos e, mesmo recentemente, seu desempenho ainda está abaixo da média dos emergentes. Ao mesmo tempo, nota, o ambiente institucional “não tem permitido uma maior flexibilidade fiscal e maior crescimento econômico”, em meio a questões como um Judiciário ativo e um Congresso não alinhado com o governo.
Já em relação ao segundo, o profissional afirma que a posição externa brasileira é como uma “grande força”, mas que a combinação de dívida grande e juros altos é uma fraqueza. De uma escala em que 1 é a melhor nota e 6 a pior, Orozco deu 5 para a economia, 4 para o arcabouço institucional e 5 para o quadro fiscal.
Questionado sobre quanto tempo pode levar para o Brasil atingir o grau de investimento, Orozco foi evasivo, mas ressaltou que o importante é o desempenho econômico. “O crescimento é chave, no sentido de que vai criar mais resiliência para enfrentar choques e manter o cumprimento das dívidas”, diz. “Nesse aspecto, a agenda de reformas é muito importante, porque isso que vai continuar tirando o custo Brasil.”
O diretor da S&P citou, como exemplo, a reforma tributária, mas comentou que o texto apresentado na semana passada pelo relator, deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), prevê uma transição muito longa. “Essa gradualidade tem um risco, pode atrapalhar o crescimento.” Atualmente, o Brasil tem nota “BB-” pela S&P, que foi colocada em perspectiva positiva.
Fonte: Valor Econômico

