O Brasil melhorou seu perfil de risco e o governo tem se mostrado comprometido com o controle da dívida, mas a falta de visibilidade em prazos mais longos gera ansiedade no mercado e se traduz na volatilidade dos preços dos ativos, afirma o presidente do Bank of America (BofA) no Brasil, Eduardo Alcalay. “Temos uma estabilidade sensível, porque o horizonte é de um ou dois anos. É preciso alongar essa estabilidade. O foco dos investidores é o indicador de solvência do Brasil”, afirma em entrevista ao Valor.
Há sete anos no comando do banco americano no Brasil, Alcalay diz que é natural essa ansiedade porque o mercado está “muito focado e preocupado com a boa gestão da responsabilidade fiscal”. E é isso o que explica o porquê de algumas falas ou notícias acabarem batendo diretamente nas cotações. Para ele, a consequência é que acaba havendo movimentos exagerados, como uma queda ou alta brusca de uma determinada ação.
Alcalay vê a condução da política econômica caminhando bem e diz que o Banco Central (BC) foi “exímio” em controlar a inflação. Falta dar um passo além. “O eixo dessa política do governo, liderada pelo Ministério da Fazenda, está bem ancorado. Tem ruídos aqui e ali, mas a direção é bem reconhecida. Agora precisamos avançar mais no médio prazo”, afirma.
O que o executivo quer dizer é que o país precisa entrar em uma rota de equilíbrio mais firme na relação entre dívida bruta e Produto Interno bruto (PIB). Na visão dele, a proporção atual, de 75%, é alta para “países do padrão de Brasil”. Ele observa que o Brasil até tem visto a percepção de risco cair, algo que fica evidente na trajetória do CDS (sigla em inglês para “credit default swap”), derivativo que oferece proteção contra calotes e é usado como medida de risco de um determinado país ou ativo.
No entanto, para que a relação dívida/PIB possa avançar, um dos pontos relevantes, de acordo com Alcalay, é dar continuidade às reformas estruturais – pilar que ajudará o governo a manter uma agenda positiva. Uma das reformas que precisam voltar à mesa, afirma, é a administrativa. “Não é uma reforma puramente de corte de custos, mas de buscar qualidade do serviço público”, diz.
Um avanço nessa frente também ajudaria a abrir um desejado espaço para um ritmo maior de queda das taxas de juros, acrescenta o executivo.
Mesmo com falta de clareza de mais longo prazo, há notícias positivas, na visão do presidente do BofA. Alcalay elogia a agenda do governo voltada à pauta microeconômica, como o apoio a projetos de lei que tentam facilitar o acesso a crédito e melhorar o ambiente de negócios. “São medidas para melhorar as condições dos negócios e buscar ganho de produtividade no país. Isso é música para os ouvidos”, diz.
Apesar dessas boas perspectivas, o executivo reconhece que o fluxo de capital estrangeiro para o mercado brasileiro tem sido tímido. A explicação, afirma, está na manutenção das taxas de juros americanas em patamar elevado e no adiamento das estimativas para o início do afrouxamento monetário pelo Federal Reserve, o banco central daquele país. Esse compasso de espera tem afugentado os investidores que normalmente olham para ativos de risco.
Alcalay pondera que o investimento direto no Brasil tem sido menos afetado, algo demonstrado no interesse de multinacionais no país. São os casos, por exemplo, dos anúncios de investimentos multibilionários das montadoras de veículos.
No entanto, sem o fluxo de capital para a bolsa, a esperada reabertura do mercado para ofertas iniciais de ações (IPOs, pela sigla em inglês) foi empurrada para o segundo semestre, diz Alcalay. Segundo ele, o interesse do investidor existe, mas é necessário um alinhamento entre juros mais baixos e expectativa sobre crescimento da economia. Essa combinação também deve influenciar na entrada de recursos nos fundos de investimento locais, que sofreram grande sangria nos últimos dois anos. “O mercado de IPOs tem potencial para reabrir em algum momento do ano”, afirma. “Está parando de sair dinheiro dos fundos.”
Uma boa notícia é que as ofertas subsequentes de ações (“follow-on”, em inglês) estão deixando de ter um viés tão forte em reestruturação de balanços, como se viu no ano passado. Segundo Alcalay, as operações que começam a sair agora estão mais voltadas a investimentos e expansão. O executivo cita os setores de infraestrutura, varejo, tecnologia e saúde como alguns dos que podem acessar a bolsa.
No comparativo com outros mercados, o Brasil está relativamente bem, amparado pelas pautas de segurança alimentar e energia limpa, observa Alcalay, que vê oportunidades nessas duas frentes. No entanto, pondera, o país tem competidores fortes na disputa pelo capital, principalmente o Sudeste Asiático, a Índia e o México.
A diversificação dos negócios do BofA, após uma decisão estratégica tomada há dez anos, ajudou o banco americano a driblar o cenário difícil para o mercado de capitais no país nos últimos dois anos, período em que as receitas do setor encolheram. A franquia no país, segundo Alcalay, cresceu “acima de dois dígitos”. O executivo atribui o desempenho ao fortalecimento da área de fusões e aquisições (M&A) do banco, que resultou em ganho de participação de mercado, e a serviços transacionais.
Uma das frentes que ganharam espaço ao longo desse processo é voltada a pagamentos e cobranças dos clientes, por exemplo. Outra é a gestão de caixa de empresas. Também entrou na prateleira o negócio de “prime brokerage”, destinado a grandes clientes, como gestoras e family offices. A volatilidade e a alta dos juros, por sua vez, propiciaram ganhos com operações estruturadas. Com essa combinação de ferramentas, o banco ganhou um colchão que amorteceu os efeitos da volatilidade e da paradeira no mercado de ações. “A gente não ficou parado, enquanto o mercado de equities se retraiu”, afirma.
Alcalay ressalta que o BofA manterá no Brasil a mesma linha que o banco segue fora dos Estados Unidos, exclusivamente com atividades de banco de atacado. “Dentro disso vamos fazer adições de produtos e linhas”, diz.
No mercado brasileiro, por exemplo, o BofA tem avançado nos serviços de pagamento corporativo por meio do Pix. O banco lançou, ainda, o financiamento ao comércio por meio de duplicatas.
Fonte: Valor Econômico

