O Tesouro Nacional captou ontem US$ 4,5 bilhões com a emissão de bônus no exterior, na maior operação soberana feita no mercado internacional desde 2005. O país aproveitou um início de ano muito aquecido para ofertas de dívida, com investidores buscando papéis antes do início da queda das taxas de juros nos Estados Unidos – cenário que também atrai a atenção de empresas brasileiras.
A demanda pelos títulos soberanos foi forte, superando US$ 12 bilhões, o que deu às companhias brasileiras uma prova do apetite dos estrangeiros. A lista de empresas que buscam recursos exterior na primeira “janela” de ofertas do ano só cresce. Depois de a Cosan iniciar reuniões com investidores na sexta-feira para uma oferta de até US$ 750 milhões, 3R Petroleum e Ambipar entraram na fila para captar US$ 500 milhões cada. Entre gestores, há uma expectativa de que, em breve, a Petrobras também anuncie uma operação.
A Cosan, que atua em setores como energia, álcool, açúcar e lubrificantes, precifica hoje a oferta, segundo fontes que acompanham a operação. Como são estreantes nesse mercado, 3R e Ambipar vão precisar de mais tempo nas apresentações feitas aos investidores e devem concluir a emissão na próxima semana.
Segundo bancos ouvidos pelo Valor, outras duas ou três empresas podem acessar o mercado internacional de dívida até a segunda semana de fevereiro, quando a primeira “janela” do ano se fecha e as empresas entram no chamado “período de silêncio” antes da divulgação de resultados financeiros de 2023.
“Os emissores brasileiros aproveitaram as três primeiras semanas do ano para terminar de colocar a casa em ordem e agora temos um fluxo interessante de anúncios de captações”, diz Miguel Diaz, responsável por captações externas do Santander Brasil.
Na emissão fechada ontem pelo Tesouro, foram vendidos títulos com prazo de 10 anos e de 30 anos. A demanda alta surpreendeu até mesmo a equipe do Tesouro e garantiu a redução das taxas. A remuneração da série mais curta ficou em 6,35% ao ano, abaixo dos 6,62% que funcionam como uma referência aos investidores no início da oferta. Na série mais longa, a taxa passou de 7,5% para 7,15%. Os objetivos da operação, segundo o órgão, eram dar liquidez à curva de títulos e promover referência de preços para empresas emissoras.
Depois de a Cosan iniciar reuniões com investidores na sexta-feira, 3R Petroleum e Ambipar entraram na fila para captar
As condições para captação no exterior são consideradas boas pelos bancos e refletem a leitura do fim do ciclo de alta de juros nos Estados Unidos, além do alívio na volatilidade das taxas longas. Os investidores esperam o início de uma queda relevante nos juros americanos nos próximos meses e correm para garantir títulos prefixados com as taxas de agora, explica Diaz. “O mercado está construtivo e com apetite para Brasil. “Dentre os emergentes, o país desponta, sendo visto como mais estável.”
Há uma expectativa de que este mês seja o mais aquecido para o mercado americano de dívida em pelo menos três décadas, segundo o “Financial Times”. Desde o início de janeiro, mais US$ 150 bilhões em bônus corporativos foram emitidos por lá.
Janeiro é um período que costuma ser forte para o mercado de bônus. Como dezembro há menos atividade, emissores se preparam para operações logo no comecinho do ano, quando os caixas das gestoras estão cheios e os investidores precisam sair em busca de opções de investimentos.
Tradicionalmente, as primeiras companhias a acessar o mercado no início de um ano são as emissoras frequentes, já conhecidas entre os investidores, e que costumam ter a documentação para os ofertas praticamente pronta.
Desta vez, porém, duas novatas decidiram aproveitar o cenário positivo. “Isso só prova como o mercado está forte, com títulos saindo com redução de taxas e negociando bem no secundário”, afirma Caio de Luca Simões, chefe do mercado de capitais de dívida do Bank of America (BofA) no Brasil.
A Ambipar, que atua com gestão de resíduos, tem reuniões agendadas até 29 de janeiro com investidores. A companhia busca US$ 500 milhões com títulos verdes (“green bonds”). O dinheiro deve ser usado para o pré-pagamento de debêntures que vencem de 2024 a 2028. Além de alongar a dívida – cujo prazo médio deve passar de três anos e meio para cinco anos – a Ambipar também busca acessar novos bolsos, como o de investidores focados em dívidas ESG (sigla em inglês para padrões ambientais, sociais e de governança), e liberar limites com bancos brasileiros, que têm em carteira as debêntures que serão pré-pagas.
“Não é todo mundo que consegue estrear nos bonds com uma operação verde, então estamos otimistas com essa oferta”, diz Simões, do BofA, que é um dos bancos que coordenam a operação, ao lado de Morgan Stanley, BTG Pactual e Itaú BBA. Segundo ele, a demanda de investidores por informações sobre a Ambipar “tem sido muito positiva.”
A 3R, que atua no setor de óleo e gás, busca US$ 500 milhões com títulos de sete anos e pretende usar os recursos para refinanciar as dívidas feitas para a compra do Polo Potiguar, no Rio Grande do Norte. O ativo, que antes pertencia à Petrobras, foi adquirido por cerca de US$ 1,09 bilhão no ano passado.
Os bônus da 3R terão garantia prestadas pela companhia e por subsidiárias, além de garantias reais como recebíveis e ações. Na operação, que deve ser concluída neste mês, atuam Morgan Stanley, BTG Pactual, Citi, Deustche Bank, HSBC, Itaú BBA, Santander e UBS.
No caso da Cosan, o dinheiro deve ser usado para amortizar parte dos empréstimos feitos para a compra de uma participação na Vale em 2022, conforme relatório da agência de classificação de risco Moody’s, que atribuiu nota “Ba2” à proposta de emissão. “Os recursos permitirão à Cosan melhorar sua flexibilidade financeira e realizar a gestão de passivos estendendo o cronograma de vencimento das dívidas”, diz o relatório.
Neste ano, o esperado pelos bancos é que as emissões de bonds ultrapassem R$ 20 bilhões, incluindo as ofertas do Tesouro. Em 2023, foram emitidos cerca de R$ 12 bilhões, considerando apenas operações corporativas. (Colaborou Eulina Oliveira)
Fonte: Valor Econômico

