Por Álvaro Campos e Mariana Ribeiro, Valor — São Paulo
04/08/2023 17h47 Atualizado há um dia
Nas teleconferências com investidores realizadas nesta sexta-feira, após a divulgação do resultado do segundo trimestre, o CEO do Bradesco, Octavio de Lazari Jr, tentou passar uma mensagem de recuperação gradual nos números do banco. A forte queda das ações e os relatórios de analistas de sell-side, no entanto, mostram que a instituição ainda terá um árduo caminho pela frente.
Lazari disse que o momento de redução do retorno sobre o patrimônio (ROE) da instituição é conjuntural, não estrutural. O retorno do banco ficou em 11,1% no segundo trimestre, ante 10,6% no primeiro trimestre e 18,1% no segundo trimestre do ano passado.
Segundo ele, o impacto conjuntural foi causado pelo aumento da iandimplência e pelos resultados negativos da margem com mercado. “É lógico que existe uma mudança de comportamento do cliente, de maior competição no mercado, que temos de nos adaptar e estamos nos adaptando. Mas estamos trabalhando trimestre a trimestre para entregar um ROE maior e não tenho dúvida, vamos perseguir isso, voltar para o retorno de dois anos atrás.”
O executivo reforçou que o processo de recuperação dos resultados do banco será gradual. A jornalistas, ele disse que os números continuam pressionados pela despesa com provisões para devedores duvidosos (PDD), mas que há avanço no controle de inadimplência, com melhora no indicador de curto prazo.
As novas safras mostram melhora da qualidade, o que tem permitido retomada na originação, disse Lazari. Ele acrescentou que a retomada continuará nos próximos trimestres, expandindo-se para outras linhas. “A margem com mercado continuará evoluindo ao longo do próximo semestre e 2024.”
O presidente do Bradesco indicou que o desempenho da carteira de crédito no segundo trimestre reflete a “demanda ainda restrita” e ajustes feitos no portfólio. Os créditos originados a partir de 2022 têm perfil de risco melhor e já representam 53% da carteira, afirmou.
Ele destacou que o “guidance” (projeções) para a despesa com PDD continua válido. “Temos tendência de estabilização da inadimplência, mesmo com efeito denominador desfavorável”, disse.
Lazari afirmou ainda que a linha de receita de prestação de serviços é um desafio para todo o mercado, inclusive para o banco. Para as receitas de mercados de capitais, a expectativa é boa para o segundo semestre, acrescentou. “Mantivemos o ‘guidance’ de receita de tarifas, com indicação mais para o piso da faixa”, comentou.
Em um cenário de maior digitalização, a instituição tem feito ajustes nas agências, afirmou o presidente. No segundo semestre, há mais “100 ou 150 para transformar”, ou seja, converter em postos de atendimento, que têm uma estrutura de gastos bem menor. Segundo o banco, atualmente 98% das transações são feitas nos canais digitais.
Em relação à oferta de crédito, ele disse que, em julho, já foi observada uma originação maior e que “certamente” isso vai continuar no segundo semestre. As linhas de grandes e médias empresas são o destaque positivo e devem ter demanda maior. Já em pequenas empresas e em pessoas físicas de mais baixa renda, haverá crescimento menor do crédito.
Ele afirmou ainda que o Desenrola, programa de renegociação de dívida implementado pelo governo, deve ter um impacto muito pequeno no balanço do banco. “Não vai mexer o ponteiro, porque os valores das dívidas são muito baixos.” Ainda assim, ele ressaltou que o programa é positivo, ajuda os clientes, e disse que o Bradesco já fez 85 mil renegociações e tirou 580 mil CPFs do negativo.
Questionado sobre as lições que o banco aprendeu com o ciclo anterior de afrouxamento monetário, para não repetir os mesmos erros agora que uma nova fase de queda da Selic se inicia, Lazari afirmou que o cenário é diferente, com projeções mais animadoras para a economia, e que na ocasião anterior os desdobramentos da pandemia afetaram a capacidade de pagamento dos clientes. “Também tivemos melhoria em ferramentas, modelos de crédito, até uso de inteligência artificial generativa, tudo isso contribiu para um melhor processo de avaliação e concessão. Mas temos que observar o cenário.”
Para os analistas, o salto da inadimplência no Bradesco no segundo trimestre e a alta nas projeções para devedores duvidosos (PDD) indicam que um ponto de inflexão na qualidade dos ativos, que permita uma aceleração nas concessões de crédito, ainda não é uma certeza. Mesmo com o banco alegando queda na inadimplência de curto prazo (15 a 90 dias) e melhora nas novas safras. Seja como for, ainda que o pico da inadimplência tenha sido batido, a retomada na rentabilidade para patamares mais normais, como o ROE perto de 20% de dois anos atrás, será demorada.
Na visão do Itaú BBA, a estrada para a recuperação da rentabilidade do Bradesco será longa e lenta. Eles apontam que as mudanças gerais no guidance para 2023 implicam um lucro líquido de R$ 19 bilhões, se fosse atingido o ponto médio, mas observam que muitos indicadores tendem a ficar perto do piso das projeções, como margem e provisões. “Um resultado mais perto do piso do guidance implicaria lucro de R$ 18 bilhões, com um ROE de 10% a 11% para os próximos dois trimestres, além de um efeito de carregamento negativo em 2024”.
Os analistas do BTG explicam que, embora o Bradesco venha dizendo que a queda da Selic vai ajudar a impulsionar o ROE, na última vez em que o banco teve um retorno de 18%, no início do ano passado, o lucro antes de impostos foi duas vezes maior que o atual. “Sim, os resultados de tesouraria e a inadimplência se normalizarão, mas a margem financeira e a receita de tarifas provavelmente estarão sob pressão, e uma vez que o lucro melhora, a alíquota efetiva de impostos sobe”, argumentam. “Reforçamos nossa visão de que a recuperação do ROE será um processo lento, que agora parece ainda mais demorado do que o que temos em nosso modelo”.
As ações PN do Bradesco recuaram quase 7% nesta sexta-feira, entre as maiores baixas do Ibovespa.
Fonte: Valor Econômico


