Por Daniela Braun, Valor — São Paulo
24/04/2024 13h55 Atualizado há 9 horas
O presidente americano Joe Biden sancionou, na quarta-feira (24), uma lei que dá um prazo de nove meses para que a companhia chinesa Bytedance venda a operação do TikTok, nos Estados Unidos, a uma empresa aprovada pelo governo americano. Caso contrário, a plataforma de vídeos será banida para 170 milhões de usuários nos EUA, seu maior mercado global.
A lei aprovada pelo Senado americano na terça-feira à noite (23) e sancionada um dia depois por Biden embarcou em um pacote mais amplo, que prevê uma ajuda de US$ 95 bilhões a Ucrânia, Israel e Taiwan, aliados dos EUA.
A pressão do governo americano sobre o TikTok reflete a crescente tensão geopolítica entre EUA e China.
“O Congresso está agindo para evitar que adversários estrangeiros conduzam espionagem, vigilância, operações difamatórias, prejudicando americanos vulneráveis, nossos militares e mulheres, e nosso pessoal do governo dos Estados Unidos”, disse na terça -feira (23) a presidente do Comitê de Comércio do Senado, Maria Cantwell.
O argumento de evitar que uma companhia chinesa tenha acesso a dados sensíveis sobre os Estados Unidos não é novo. Em 2020, durante a gestão de Donald Trump, o TikTok quase foi banido dos EUA, mas firmou parcerias locais para contornar a situação. No fim daquele ano, o TikTok entrou com uma ação na Suprema Corte americana alegando que a ordem executiva de Trump para banir a plataforma era inconstitucional, e ganhou a causa. Em maio de 2022, a plataforma informou ter criado uma organização interna chamada TikTok US Data Security, que, segundo a companhia, trabalha para garantir que os dados dos usuários americanos sejam armazenados em um serviço de nuvem da americana Oracle.
O TikTok foi lançado em 2017 pela Bytedance, empresa fundada em 2012, em Pequim.
O cofundador da Bytedance, Zhang Yiming, conta com 20% de participação e os 20% restantes pertencem a funcionários da companhia, disse Shou Chew, executivo-chefe do TikTok, em audiência na Câmara americana, no ano passado.
Investidores institucionais como os fundos americanos Carlyle Group, General Atlantic e Susquehanna International Group (SIG) detêm 60% do capital da Bytedance, informou Chew.
Atualmente, a SIG é dona de cerca de 15% da ByteDance, uma participação avaliada em cerca de US$ 40 bilhões, que representa uma boa parte do patrimônio do bilionário americano Jeff Yass, dono do fundo, informaram fontes ao “Financial Times”.
O TikTok promete brigar judicialmente para se manter nos EUA. O argumento é o mesmo adotado em 2020, contra a ordem de Trump. A empresa diz que a lei é “inconstitucional, é uma proibição do TikTok” e que vai “contestá-la em tribunal”.
“Fiquem tranquilos, não vamos a lugar algum”, disse Chew, em um vídeo publicado ontem na plataforma logo após a sanção da lei por Biden. “Os fatos e a Constituição estão do nosso lado e esperamos prevalecer novamente”, completou.
“O fato é que investimos bilhões de dólares para manter os dados dos EUA seguros e a nossa plataforma livre de influências e manipulações externas. Esta proibição iria devastar 7 milhões de empresas e silenciar 170 milhões de americanos”, comentou a plataforma em comunicado.
Com um prazo de 270 dias na costas, o TikTok terá de equilibrar o tempo entre uma briga judicial contra o governo Biden e a busca por um eventual comprador.
“O tempo já está correndo e qualquer comprador em potencial deve ter fundos e estômago forte”, diz Jasmine Enberg, diretora de análises da consultoria eMarketer. “Embora muitos queiram colocar as mãos no cobiçado algoritmo do TikTok, a maioria daqueles que têm dinheiro para comprar o aplicativo não conseguiriam superar os obstáculos antitruste.”
Entre os interessados em negociar com a Bytedance nos EUA está o ex-secretário do Tesouro americano Steven Mnuchin (da gestão Trump). Em março, ele anunciou que estava montando um consórcio para tentar assumir o controle do aplicativo. “É um ótimo negócio”, disse, em entrevista à CNBC. “Deveria ser propriedade de uma empresa dos EUA. Não há nenhuma maneira de os chineses permitirem que uma empresa americana administre algo assim na China.”
Depois dos EUA, a Indonésia é o segundo maior mercado do TikTok, com cerca de 126 milhões de usuários em janeiro, informa a consultoria alemã Statista. O Brasil é o terceiro, com 99 milhões de usuários.
Uma eventual saída dos EUA mexe diretamente com a receita de publicidade da plataforma, que deve somar US$ 18,5 bilhões este ano, alta de 30,7% em base anual, projeta a Statista.
Com a lei sancionada, a incerteza sobre a permanência do TikTok nos EUA pode estremecer as relações da plataforma com anunciantes, avalia Enberg, da e-Marketer. “O destino do aplicativo resiste nas mãos de influenciadores, usuários e marcas.”
Para Enberg, a batalha judicial que está por vir poderia afastar anunciantes do TikTok, mas a maioria das marcas não deixará a plataforma enquanto houver um público a alcançar. E o público segue seus influenciadores preferidos. “Os criadores de conteúdo permanecerão enquanto gerarem receita”, diz a executiva. “Os usuários irão onde seus criadores favoritos estão e os anunciantes seguirão seu exemplo.”
Os influenciadores não conseguiram impedir que o TikTok saísse do ar na Índia, que era um dos principais mercados para a plataforma de vídeos até 2020. Naquele ano, o governo indiano decidiu encerrar o TikTok e uma série de outros aplicativos de empresas chinesas, após um conflito na fronteira com a China. O resultado foi uma migração para plataformas de vídeos curtos como o Instagram, da Meta, e o YouTube, da Google, bem como o surgimento de aplicativos locais.
Nos EUA, agora, o TikTok também corre o risco de ver sua base de usuários entregue à concorrência. Para a diretora da eMarketer, a Meta e o Google “serão os maiores beneficiários no caso de uma potencial proibição da plataforma ou da incerteza em torno de sua permanência”, já que os aplicativos de vídeos curtos destas empresas “são as alternativas mais naturais ao TikTok”.
Caso a plataforma deixe de operar em 2025 nos Estados Unidos, na visão de Enberg, “será quase impossível replicar o algoritmo do TikTok , que mantém os usuários conectados 54 minutos por dia, em média, nos EUA”. No Instagram, os internautas ficam 35 minutos por dia, sendo 21 minutos gastos em vídeo.
Fonte: Valor Econômico

