Por Valentina Romei e Tommy Stubbington — Financial Times
18/07/2022 05h02 Atualizado há 4 horas
A série de grandes aumentos da taxa de juros implementada pelo Federal Reserve (Fed, o BC dos Estados Unidos) pressionou bancos centrais ao redor do mundo a seguirem seu exemplo para se contrapor à inflação em alta e ao dólar forte. Uma análise do “Financial Times” concluiu que hoje, mais do que em qualquer outro momento deste século, os bancos centrais têm optado por grandes aumentos das taxas, de 0,50 ponto percentual ou mais, o que expõe as dificuldades de lidar com as pressões dos preços e os juros nos EUA.
Os aumentos do Fed, que incluem a primeira elevação de 0,75 ponto desde 1994, e os temores a respeito da saúde da economia mundial apreciaram o dólar em relação a quase todas as moedas. Como muitos produtos são cotados em dólares nos mercados internacionais, o dólar forte amplia as pressões inflacionárias ao aumentar o custo das importações – e cria o que analistas descrevem como uma “guerra cambial reversa” entre os formuladores de políticas monetárias.
“O que vemos é um frenesi de aumentos das taxas de juros”, disse James Athey, gerente sênior de carteiras da Abrdn. “É o inverso do que observamos na última década… Hoje em dia, a última coisa que alguém quer é uma moeda fraca”, afirmou.
Na quarta-feira, as autoridades canadenses foram as últimas a surpreender os mercados com um aumento acima do esperado, de 1 ponto percentual, o maior já adotado por qualquer economia do G7 desde 1998. As Filipinas aumentaram sua taxa em 0,75 ponto no dia seguinte.
Nos três meses até junho, os 55 bancos centrais monitorados pelo Financial Times fizeram 62 aumentos da taxa básica de juro, de pelo menos 0,50 ponto. Mais 17 aumentos de 0,50 ponto ou mais foram adotados em julho até agora, o que marca o maior número de grandes movimentos de taxas em qualquer momento desde a virada do milênio e supera o último ciclo de aperto monetário mundial, nas vésperas da crise financeira mundial.
“Percebemos esse ponto de virada no mercado, em que 0,50 é o novo 0,25 [ponto]”, disse Jane Foley, chefe de estratégia de câmbio do Rabobank.
Os bancos centrais de países muito expostos à pressão do mercado cambial aumentaram as taxas em montantes especialmente elevados. A Hungria é o maior destaque, já que sua taxa básica de juros subiu 3,85 pontos em apenas dois meses, enquanto o país se defronta com a inflação e uma depreciação de sua moeda em relação ao dólar a taxas de dois dígitos.
Para muitos mercados emergentes, o componente taxa de câmbio é importante na tomada de decisões sobre a política monetária, segundo Jennifer McKeown, chefe do serviço de economia mundial da Capital Economics. Ela disse que entre eles estão várias economias emergentes da Europa, cujas moedas foram abaladas pelos temores sobre a guerra na Ucrânia, assim como por um clima geral de aversão ao risco.
Mas a tendência é generalizada e também afetou bancos centrais de países mais ricos. O banco central da Coreia do Sul fez seu primeiro aumento de 0,50 ponto percentual em julho.
Muitos desses grandes movimentos desorientaram os investidores, como na Austrália, na Noruega e na Suíça, onde o banco central adotou um aumento inesperado de 0,50 ponto em junho. Os mercados previam que o Banco Nacional Suíço, tradicionalmente tolerante quanto à inflação, esperaria até o fim do ano para aumentar as taxas, mas os temores sobre a inflação e a taxa de câmbio levou-o a agir mais cedo.
Na maioria das economias avançadas, as taxas subiram a partir de seus menores níveis históricos, na sequência do relaxamento agressivo que os BCs tinham adotado durante os primeiros meses da pandemia de covid-19. Com as taxas ainda baixas pelos padrões históricos, a expectativa de economistas é que vários bancos centrais importantes elevem os juros em 0,50 ponto ou 0,75 ponto percentual em suas próximas reuniões.
McKeown disse que os bancos centrais precisam agir rapidamente para tirar as taxas do território “estimulativo”, “especialmente em um ambiente em que o crescimento salarial e as expectativas de inflação estão em alta e existe o risco de que a inação permita o surgimento de espirais de preços e salários”.
O Banco da Inglaterra (BoE) e o Banco Central Europeu (BCE) ainda não adotaram aumentos tão grandes nas taxas. Mas Matthew Ryan, analista sênior de mercado da empresa de serviços financeiros mundiais Ebury, acredita que o BoE “provavelmente precisará se juntar ao ‘clube dos 0,50’ para elevar a libra de seus níveis deprimidos atuais”.
O euro atingiu a paridade com o dólar na semana passada, mas a previsão é que o BCE, que terá sua reunião em 21 de julho, aumente as taxas em apenas 0,25 ponto.
Dados fortes sobre empregos e uma inflação acima do esperado em junho reforçaram as expectativas de que o Fed faça outro grande aumento da taxa em sua próxima reunião, em 27 de julho. Os mercados até já embutiram uma probabilidade de 40% de que haja um aumento de 1 ponto percentual inteiro, e esperam que a meta da taxa dos fundos federais atinja entre 3,5% e 3,75% até o fim do ano.
Novos aumentos do Fed colocarão muitos mercados emergentes sob pressão para acompanhá-lo, embora vários deles tenham começado a apertar suas políticas monetárias no ano passado, antes das economias avançadas.
Agustín Carstens, gerente-geral do Banco de Compensações Internacionais (BIS), disse há pouco tempo que os mercados emergentes “aprenderam as lições” dos ciclos anteriores de aperto dos EUA. Ele afirmou que, ao contrário do movimento tradicional dos mercados emergentes, de aumentar as taxas depois das economias avançadas, “agora eles começaram muito cedo e o que se pode ver é que conseguiram manter suas taxas de câmbio bastante estáveis”.
Fonte: Valor Econômico