Os principais bancos centrais do mundo estão se preparando para adiar as previsões dos investidores sobre a rapidez com que as taxas de juros irão cair, à medida que se reúnem neste fim de ano, num contexto de fortes números de emprego. Os investidores vêm apostando que as autoridades dos Estados Unidos, zona do euro e Reino Unido começarão a afrouxar suas políticas monetárias ainda no começo de 2024, alimentando uma flexibilização das condições financeiras para as empresas, enquanto se concentram na queda das leituras de inflação.
Mas essas expectativas serão testadas nos próximos dias nas reuniões do Federal Reserve (Fed, a autoridade monetária dos EUA), Banco Central Europeu (BCE) e Banco da Inglaterra (BoE), tendo todos os três já sinalizado que querem evidências mais claras do enfraquecimento dos mercados de trabalho antes de cortarem as taxas de juros.
“Eles não podem declarar vitória [sobre a inflação] e os dados são, na verdade, bastante úteis para contrariar a narrativa do mercado”, afirma James Knightley, principal economista internacional do banco ING. “Eles vão relutar muito em dar sinal verde ao mercado.”
O Federal Reserve, que se reúne antes do BCE e do Banco da Inglaterra esta semana, enfrenta uma tarefa particularmente desafiadora em meio à crescente especulação dos investidores de que o banco central americano mudará de rumo e reduzirá os custos dos empréstimos em 2024 mais cedo do que havia sido sugerido pelas autoridades para devolver a inflação à meta oficial de 2%.
O presidente da banco central americano, Jerome Powell, tentou moderar essas expectativas, observando que é “prematuro” dizer que as taxas de juros atingiram o pico, ou começar a esboçar o momento e os parâmetros sob os quais as autoridades de política monetária considerarão os cortes dos juros.
Eles [os BCs] vão relutar muito em dar sinal verde ao mercado”
Os dados econômicos recentes reforçam esse argumento. Números divulgados na sexta-feira mostraram que as contratações nos EUA continuam mais vigorosas do que o esperado, com a taxa de desemprego caindo para 3,7% e um crescimento salarial mensal sólido.
“Os mercados de trabalho estão se aguentando melhor do que o esperado, tendo em vista o que as taxas de juros têm feito”, diz Holger Schmieding, economista-chefe da Berenberg.
Novos dados sobre a inflação nos Estados Unidos a serem divulgados nesta terça-feira também deverão dar ao Fed cobertura para dissipar a noção de que uma mudança na política é iminente, afirma Knightley.
Há algumas evidências de que os investidores começam a titubear: os números divulgados na sexta-feira levaram operadores dos mercados futuros a reduzir suas apostas de que o Fed poderá começar baixar as taxas de juros já em março. A maior parte deles agora aposta que isso começará a acontecer no mês de maio.
Schmieding avalia que a queda dos rendimentos dos bônus é uma preocupação para as autoridades monetárias porque “os mercados estão aliviando as condições financeiras, o que os bancos centrais poderão querer fazer meio ano depois”.
O BCE e o Banco da Inglaterra se reúnem na quinta-feira. As autoridades monetárias da zona do euro e do Reino Unido também estão ansiosas por contrariar a narrativa do mercado de corte nos juros e podem apontar para os mercados de trabalho relativamente resilientes como lastro para os seus argumentos.
O desemprego na zona do euro continua próximo do patamar histórico de baixa de 6,5% e os custos unitários da mão de obra por hora trabalhada estão aumentando no ritmo mais acelerado desde que os registros do Eurostat (o Gabinete de Estatísticas da União Europeia) começaram em 1995. Com o aumento dos preços no setor de serviços da zona do euro ainda na casa dos 4%, as autoridades monetárias afirmam que querem ver mais evidências de que os custos mais altos com a mão de obra não provocarão uma segunda rodada de pressão inflacionária.
Várias grandes rodadas de negociações salariais coletivas com sindicatos deverão ser concluídas no começo do ano que vem, inclusive para 2,5 milhões de trabalhadores alemães do setor público, dando às autoridades monetárias um motivo para reagir aos pedidos de cortes iminentes nos juros. Isabel Schnabel, da autoridade monetária europeia, disse na semana passada que irá “observar atentamente os próximos acordos salariais”, uma vez que eles “certamente também serão importantes para as nossas decisões de política monetária”.
“Acredito que o Banco Central Europeu vai querer ver evidências de que o os aumentos salariais são consistentes com a inflação caindo para 2%, e de que as margens de lucro estão absorvendo os custos mais altos com mão de obra, antes de decidirem por qualquer corte nas taxas de juros”, disse Katharine Neiss, uma ex-autoridade do Banco da Inglaterra e hoje economista-chefe da PGIM Fixed Income para a Europa.
Os indicadores de crescimento dos salários no Reino Unido recuaram, assim como a inflação, que caiu para 4,7% em outubro. A expectativa é a de que o comitê de política monetária do Banco da Inglaterra manterá os juros em 5,25%, o maior nível desde a crise financeira, segundo os valores do mercado.
“Para tentar evitar que as condições financeiras se afrouxem ainda mais e para enviar um sinal antes da rodada salarial do ano novo, o Banco da Inglaterra deverá reforçar sua mensagem de ‘alto por mais tempo’”, diz Andrew Goodwin, da consultoria Oxford Economics.
Fonte: Valor Econômico
