Por Natasha White — Bloomberg
19/12/2023 05h03 Atualizado há 5 horas
Os maiores bancos de Wall Street alertam que as premissas existentes em torno do tão necessário financiamento verde deixarão de ser válidas se os Estados Unidos avançarem com requisitos de capital mais rigorosos.
O chamado “Basileia 3 Endgame”, termo usado para as regras planejadas, marca a fase final de implementação nos EUA de regulamentações criadas após a crise financeira de 2008. Os bancos terão de reservar mais capital, o que vai encarecer o crédito. Apresentadas em julho por autoridades dos EUA, incluindo o Federal Reserve, as regras propostas irão “alterar fundamentalmente” a forma como os bancos da maior economia do mundo abordam o risco, disse a EY.
O J.P. Morgan Chase estima que o plano deixaria o banco diante de um aumento de capital de 25%, o que “com certeza” afetaria sua capacidade de alocar fundos em projetos verdes, segundo o diretor de operações, Daniel Pinto. O CEO do Goldman Sachs, David Solomon, afirmou que os requisitos de capital do banco “quadruplicariam” para certos projetos de energia limpa.
O resultado é que Wall Street terá de repensar as estruturas existentes de financiamento climático, disse John Greenwood, codiretor de finanças estruturadas para as Américas do Goldman.
“Considerando todas as coisas que os bancos comerciais enfrentam no contexto de Basileia”, as estruturas financeiras dos acordos climáticos existentes começam a parecer um pouco “antiquadas”, disse. Isso é particularmente verdade no modelo de financiamento climático conhecido como misto, em que os riscos nos acordos são reduzidos pelo setor público, a fim de atrair capital privado. Esses incentivos terão agora de levar em conta os custos adicionais de capital dos bancos, afirmou.
Grande parte do financiamento tende a se afastar dos bancos e entrar no reino mais obscuro do sistema bancário paralelo
Os oito maiores bancos dos EUA têm requisitos de capital que variam entre US$ 9 e US$ 13 para cada US$ 100 em ativos ponderados pelo risco. Sob as novas regras, precisariam adicionar cerca de US$ 2.
“Com o capital incremental necessário para financiar a transição verde, os bancos procurarão trabalhar com outros setores do crédito privado que talvez não estejam sujeitos às mesmas regulamentações”, disse Greenwood. “O que vemos agora em novos investimentos em energia e infraestrutura é realmente uma necessidade de saber como atrair e apoiar investidores institucionais, dadas as restrições que os bancos comerciais têm sob o regime de Basileia.”
De acordo com Jeff Berman, sócio e líder do grupo regulatório de serviços financeiros dos EUA no escritório de advocacia Clifford Chance, de Nova York, Wall Street agora “está olhando para um compromisso entre a segurança e a solidez do sistema bancário e os objetivos da política climática”.
A mensagem clara dos banqueiros é que será mais difícil alcançar retorno quando os requisitos de capital aumentarem. Isso significa que grande parte do financiamento tende a se afastar dos bancos e entrar no reino mais obscuro do sistema bancário paralelo, onde risco não é monitorado tão de perto, de acordo com o setor.
Solomon, do Goldman, disse que o financiamento ocorrerá em áreas do mercado sobre as quais “os reguladores têm muito menos visibilidade”, o que significa que os riscos poderão aumentar e “em última análise, levar a choques financeiros”.
Bancos multilaterais de desenvolvimento concordam que os modelos de financiamento verde poderão ter que ser ajustados devido ao ambiente regulatório.
Hendrik du Toit, CEO da gestora de ativos Ninety One, sediada na África do Sul, disse que sua preocupação é que credores americanos e europeus já são muito avessos ao risco, e qualquer obstáculo extra acabará por atingir mercados emergentes mais necessitados de financiamento climático.
Fonte: Valor Econômico

