Por Matheus Prado, Gabriel Caldeira, Arthur Cagliari e Gabriel Roca — De São Paulo
03/05/2023 05h04 · Atualizado há 6 horas
Os mercados globais e locais refletiram na sessão de ontem uma aversão generalizada a ativos de risco, diante da preocupação de que a crise no setor bancário nos Estados Unidos se intensifique e resulte em um enfraquecimento acentuado da atividade econômica americana, já em desaceleração. Além disso, a perda de ritmo da economia chinesa também pesou nos preços das commodities, o que gerou impacto adicional nos preços dos ativos domésticos.
No mercado de ações, o índice Dow Jones fechou em queda de 1,08%; o S&P 500 cedeu 1,16%; e o Nasdaq recuou 1,08%, enquanto o Ibovespa perdeu 2,40%, a 101.927 pontos, pressionado justamente por bancos e exportadoras.
Já o rendimento da T-note de dez anos despencou, ao cair de 3,572% para 3,429%. Por aqui, a taxa do contrato de Depósito Interfinanceiro (DI) para janeiro de 2025 recuou de 12,07% para 11,985%.
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O dólar, por sua vez, não exibiu um sinal único, ao se valorizar contra emergentes, mas perder espaço para divisas centrais. Em relação ao real, a moeda americana exibiu apreciação de 1,18%, a R$ 5,0462. O real, assim, teve o pior desempenho diário em relação ao dólar em uma lista de 33 divisas acompanhadas pelo Valor.
Na véspera das decisões de política monetária nos Estados Unidos e no Brasil, a crise do setor bancário americano voltou ao foco. Após a falência do First Republic Bank, ações de outros bancos regionais americanos, como PacWest (-27,78%) e Western Alliance (-15,12%), despencaram, o que mostra uma crescente preocupação dos investidores com o setor. Como efeito, ações de bancos ao redor do globo foram penalizadas.
De acordo com o economista-chefe da RPS Capital, Victor Candido, o movimento setorial é natural nos EUA por se tratar de uma economia que teve muitos estímulos fiscais em um passado recente, com juros próximos a zero. Agora, para ele, investidores buscam com lupa as empresas com maior fragilidade para ajustar suas posições. Candido afirma que o movimento pode ficar restrito ao setor, mas que o mercado deve se manter atento às nuances, como a evolução dos dados de crédito e a interpretação dos números pelo Fed.
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“Os efeitos imediatos são a precificação de uma recessão mais forte, com quedas mais fortes nos juros, e a queda das commodities. Pensando localmente e nos próximos passos da política monetária, se o juro longo começar a cair lá fora por conta da aversão a riscos, os ativos locais tendem a acompanhar. A queda do preço de commodities também ajuda em termos de inflação, assim como a recomposição de impostos também ajuda no fiscal”, diz o economista.
Ainda nos EUA, o relatório Jolts registrou o quarto mês consecutivo de queda no número de vagas de trabalho em aberto nos EUA, a 9,6 milhões em março. Também foram divulgados os números de encomendas ao setor industrial, que avançaram 0,9% no mesmo mês, abaixo das estimativas do mercado, o que deu sustentação à leitura de que a economia americana está em desaceleração.
A perspectiva agravada de piora da atividade nos EUA fez com que investidores passassem a projetar um caminho mais ameno para os juros do Federal Reserve (Fed, o banco central americano) neste ano. Uma alta de 0,25 ponto percentual hoje – para a faixa de 5% a 5,25% – é dada como certa e isso não mudou. No entanto, o mercado precifica chance de mais de 70% de que os juros fiquem entre 4,25% e 4,75% em dezembro, nível que só se confirmaria com dois a quatro cortes de juros ainda em 2023 (considerando o juro esperado após a reunião de hoje do Fed).
Essa, contudo, é uma perspectiva otimista segundo a avaliação do economista-chefe da Lombard Odier, Samy Chaar, e do estrategista de macro Homin Lee. Em relatório, os analistas do banco suíço ponderam que o Fed, assim como outros bancos centrais de economias desenvolvidas, terá de manter os juros altos ao menos até o fim do ano “para permitir que o ciclo de aperto monetário se infiltre completamente nas economias”. Para eles, o custo para levar os preços a um nível mais aceitável será uma recessão moderada nos EUA.
Na China, o PMI industrial de abril caiu a 49,2 pontos, abaixo da expectativa do mercado, e anotou a primeira contração desde dezembro. Assim, ao somarem o aumento dos riscos de recessão nos EUA e a decepção com os dados chineses, as commodities e ações correlatas sofreram. Os papéis ordinários da Vale caíram 3,95%; os da Petrobras recuaram 4,46%; e as ações preferenciais da estatal cederam 4,05%.
“O mercado de commodities está precificando, para além de um maior risco de recessão, os dados da China. Existiu expectativa em relação a um possível rali do PIB chinês com foco na indústria, como foi no passado, mas a recuperação se deu pelo consumo. Houve uma antecipação de uma recuperação que não ocorreu e agora temos essa correção”, diz Gilberto Cardoso, analista de commodities da OHMResearch, que reforça não ser possível, por ora, ter grande otimismo em relação ao segundo semestre.
Em segundo plano, o mercado segue atento à disputa entre o governo democrata e o Congresso dos EUA, com maioria republicana na Câmara, para elevar o teto da dívida. O risco de default da dívida do país, embora remoto, segue afetando os rendimentos dos Treasuries de curtíssimo prazo, que subiram a despeito do movimento geral do mercado. O juro do T-bill de três meses saltou, ao passar de 5,185% para 5,242%.
Fonte: Valor Econômico

