Por Oliver Telling, Ian Johnston e David Sheppard, Financial Times — Londres
05/12/2023 16h15 Atualizado há 14 horas
Armadores estão pedindo mais proteção militar nas rotas marítimas do Oriente Médio, depois que ataques de rebeldes apoiados pelo Irã no Mar Vermelho suscitaram temores de novas interrupções no comércio global, inclusive no fornecimento de energia.
O Pentágono disse no domingo que um navio de guerra dos EUA e três embarcações comerciais foram atacados na costa do Iêmen, gerando preocupações de que rebeldes houthis — que atacaram navios israelenses em novembro — e seus apoiadores no Irã possam estar ampliando suas ações em reação à guerra na Faixa de Gaza.
Jacob Larsen, chefe de segurança da Bimco, que representa armadores globais, disse que os ataques mostraram que “mais recursos militares” precisam ser empregados. “Quando se vê três navios sendo atacados [no mesmo dia] na mesma área geográfica, isso implica que estamos com falta de recursos”, disse Larsen.
Na segunda-feira, o assessor de Segurança Nacional dos EUA, Jake Sullivan, disse que os ataques são “totalmente inaceitáveis”, acrescentando que os EUA está discutindo com outros países a criação de uma força-tarefa marítima para garantir a “passagem segura de navios pelo Mar Vermelho”.
A nova ameaça ao transporte marítimo — que poderá afetar o comércio de tudo que vai de petróleo a veículos motorizados — surge não muito tempo depois das rupturas nas cadeias de abastecimento provocadas pela pandemia de covid-19 e invasão da Ucrânia pela Rússia — elevando a inflação e esfriando a economia mundial.
Segundo analistas, os traders estão subestimando a ameaça de novas rupturas. “O mercado de petróleo ficou complacente demais com os riscos de o conflito na Faixa de Gaza se espalhar pela região e ameaçar a infraestrutura de petróleo e gás e o transporte marítimo no Mar Vermelho e no Golfo Pérsico”, disse Bob McNally, fundador da Rapidan Energy e ex-assessor de George W. Bush na Casa Branca.
Desde 2019, os houthis e outros apoiados pelos iranianos já atacaram vários navios no Oriente Médio, apreendendo navios petroleiros e organizando ataques clandestinos com o uso de minas-lapa presas aos cascos dos navios.
Os últimos ataques também aumentaram as preocupações com a ameaça representada por Teerã ao Estreito de Ormuz — a estreita via navegável que separa o Irã dos Estados do Golfo e que é um ponto de estrangulamento para as exportações de petróleo e gás.
McNally estimou as probabilidades de uma “interrupção material nos fluxos de energia regionais” em até 30%. “Embora Teerã Washington não queiram um conflito direto, eles podem não ser capazes de evitar confrontos não intencionais ou deter um aumento dos ataques retaliatórios.”
Cerca de 40% do comércio marítimo de petróleo passa pelo Estreito de Ormuz diariamente, junto com carregamentos de gás natural liquefeito (GNL) do Catar, que está ajudando a Europa a substituir o gás russo. A própria rota do Mar Vermelho transporta quase um décimo do abastecimento de petróleo comercializado por via marítima, segundo o Departamento de Energia dos EUA, sendo também um canal para mercadorias provenientes da Ásia. O Estreito de Bab El-Mandeb, que separa o Golfo de Aden do Mar Vermelho, é ainda mais estreito — e vulnerável a ataques — do que o de Ormuz.
“A rota do Mar Vermelho é importante”, diz Henning Gloystein da consultoria Eurasia Group. “Ela é ainda mais importante para os europeus que transportam todo o seu petróleo e GNL do Oriente Médio pelo Mar Vermelho.”
Em um ataque a um transportador de automóveis israelense em novembro, os rebeldes houthis abordaram o navio de helicóptero — uma tática “mais comumente usada pelo Irã”, diz Gabrielle Reid da consultoria especializada em segurança S-RM. “Isso aponta para uma maior capacidade de ruptura da marinha mercante na região.”
Os armadores estão agora explorando rotas alternativas mais seguras, mas mais caras, e pedindo mais proteção nas águas do Oriente Médio. A Zim, uma empresa israelense de transporte de carga com ações listadas em Nova York, disse na semana passada que está redirecionando alguns de seus navios e alertou os clientes para períodos de trânsito mais longos.
A rota alternativa, mais longa e cara, envolve contornar o Cabo da Boa Esperança, perto da Cidade do Cabo, na África do Sul, e navegar ao longo da África Ocidental. Os armadores já estão tendo que pagar seguros mais caros, além de desviar navios e investir em medidas adicionais de segurança.
Markus Baker, do departamento marítimo da corretora de seguros Marsh, disse que algumas seguradoras já aumentaram as taxas na semana que antecedeu os ataques de domingo no Mar Vermelho, em um caso em até 300%. Ele acrescenta que o mercado “terá que reagir” aos últimos incidentes.
Mas os armadores não tiveram outra escolha a não ser manter a rota existente, diz ele. “Se você está tentando transportar certas mercadorias ao redor do mundo, é quase obrigatória a sua passagem pela região do Mar Vermelho.”
Dimitris Maniatis, diretor operacional da Seagull Maritime, diz que o grupo de segurança está recebendo “mais e mais” pedidos de guardas armados da parte de armadores do mundo todo. Mas os grupos de segurança privada, muitos formados para conter a ameaça dos piratas somalis, podem “fazer muito pouco” contra ataques com mísseis e drones apoiados por um Estado, diz ele.
“O risco de dano colateral aumentou”, diz o chefe de segurança do proprietário de um navio petroleiro baseado em Cingapura, acrescentando que pelo menos um dos navios comerciais alegadamente atacados no domingo não tinha ligações claras com Israel.
“Contra ataques externos, somos alvos fáceis. Ninguém é capaz de combater tal ameaça, a menos que haja uma intervenção militar.”
Fonte: Valor Econômico

