A aposta dos mercados na direção do ciclo de cortes da taxa Selic ganhou tração ontem com a divulgação da ata da última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom). Além de reiterar a mensagem do comunicado da semana passada, de que os juros básicos de 15% são suficientes para a inflação convergir à meta de 3%, o colegiado esclareceu que a suas próprias projeções já incorporam estimativas preliminares do impacto da reforma do Imposto de Renda (IR) aprovada pelo Congresso Nacional.
Para economistas e investidores, a revelação foi crucial pois tira uma incerteza relevante que pairava sobre o IPCA projetado pelo Copom em 3,3% para o segundo trimestre de 2027, atual horizonte relevante da política monetária. Assim, diante da desaceleração da inflação e da queda das expectativas do mercado, a ata alimentou a percepção de que a janela para o início do ciclo de cortes da Selic está se abrindo.
Essa percepção se refletiu em um forte recuo dos juros futuros na sessão de ontem, em especial dos vértices curtos e intermediários da curva a termo, que fecharam nos menores níveis do ano. A taxa do contrato de Depósito Interfinanceiro cedeu de 13,835% a 13,68%, ao passo em que a do DI de janeiro de 2029 recuou de 12,995% a 12,86%.
/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_63b422c2caee4269b8b34177e8876b93/internal_photos/bs/2025/A/Q/zxrfvzQiajwp55k4eD2A/arte12fin-102-ata-c2.jpg)
Alívio ainda maior foi observado nos juros reais das NTN-Bs, os títulos da dívida pública atrelados ao IPCA. A taxa do papel com vencimento em agosto de 2028, por exemplo, despencou de 8,15% a 7,99%, de acordo com dados da Ambima.
Alinhada ao consenso do mercado, a sócia-fundadora e chefe de investimentos (CIO) de estratégia macro da Jubarte Capital, Milena Landgraf, concorda que a ata suavizou a comunicação do Copom em relação ao comunicado da decisão da semana passada. Para ela, a revelação de que o BC já incorporou os impactos da ampliação da faixa de isenção do IR aos seus modelos de projeção de inflação foi o princpal ponto do documento.
“Dada a melhora da inflação corrente e das expectativas, caso isso se mantenha, abre-se um espaço para cortar a Selic em janeiro”, diz ela, que aposta em um corte inicial pequeno de 0,25 ponto percentual, a fim de não passar ao mercado a impressão de que o ciclo de flexibilização monetária será muito agressivo.
Já Michael Kusunoki, chefe de renda fixa e multimercados da BNP Paribas Asset Management no Brasil, entende que a comunicação do BC não mudou tanto na ata e ainda indica um Copom bastante conservador e focado em trazer a inflação à meta. De qualquer forma, ele reconhece que a incorporação da reforma do IR às projeções foi algo “revelador” e tira um risco de alta do caminho.
“Pouquíssimas pessoas tinham isso como expectativa. Tradicionalmente, o BC espera a medida ser aprovada e virar lei” antes de incorporá-la aos seus modelos, lembra Kusunoki. Ainda que falte a sanção do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o gestor entende que o Copom foi “sensato” ao considerar os potenciais efeitos da reforma do IR, uma vez que estava clara a sua aprovação.
Com esse risco tirado do caminho, espera-se que a projeção de inflação do BC para o horizonte relevante da política monetária se aproxime ainda mais da meta de 3%, fazendo com que o mercado antecipe a expectativa para o início dos cortes da Selic para a primeira reunião do Copom em 2026, argumenta Kusunoki.
Pouquíssimas pessoas tinham isso [IR] como expectativa. O BC espera a medida virar lei”
Por ora, os investidores ainda não embarcaram completamente na aposta de corte em janeiro, e a curva de juros futuros precifica uma redução de 0,2 ponto percentual da Selic para aquele mês – menos, portanto, que o corte “mínimo” usual de 0,25 ponto.
De qualquer forma, a chance de que isso ocorra aumentou signficativamente ontem, conforme mostrou o mercado de opções digitais de Copom. No fechamento de ontem, o mercado precificava uma chance de 40% para a manuntenção da Selic em janeiro, contra 32% para um corte de 0,25 ponto e 24% para uma redução de 0,5 ponto. Para o ciclo como um todo, a curva de juros futuros indica uma Selic ao redor de 12,25% no fim de 2026.
Para Landgraf, com as informações atualmente disponíveis, a precificação do mercado para o afrouxamento monetário do BC é “justa”. “Em todo ciclo de juros, seja de alta ou de queda, sabemos quando ele começa mas não quando termina. Acho que só teremos visibilidade sobre o total do ciclo mais para frente”, diz a sócia da Jubarte Capital, que ainda cita que possíveis medidas de estímulo à economia no ano eleitoral de 2026 podem ter efeito sobre a inflação e, portanto, nas decisões do BC.
Já Kusunoki entende que, por ora, ainda é cedo tanto para apostar em um início de ciclo de cortes mais célere quanto em uma extensão maior da queda da Selic. Ainda assim, o gestor diz ter a “sensação” de que o ciclo deve ser maior do que o mercado precifica e que o Copom poderia começar a reduzir o grau de aperto monetário já em dezembro. “Não acho que seria absurdo pelo comportamento da inflação e do câmbio, mas a comunicação dura do BC exclui essa possibilidade.”
Fonte: Valor Econômico

