Por Arthur Cagliari e Victor Rezende — De São Paulo
15/05/2023 05h02 Atualizado há 5 horas
No momento em que a tendência de desvalorização do dólar continua em vigor no exterior, ao se ter em vista uma pausa do Federal Reserve (Fed, banco central americano) no ciclo de aperto das taxas de juros, a apreciação do real pode ter continuidade. É a aposta de Emerson Codogno, sócio e gestor da Genoa Capital, que, em entrevista ao Valor, revela posições construtivas com os ativos brasileiros, ao menos no curto prazo.
“O arcabouço fiscal não é a melhor regra possível, mas tira do cenário o risco de um descontrole fiscal absoluto”, diz Codogno, ao justificar outras posições mais otimistas. A Genoa aposta em posições aplicadas (que ganham com a queda nas taxas) em juros nominais e em juros reais de longo prazo. “O cenário muito ruim que estava sobre a mesa não existe mais. E também estamos muito atentos aos dados de curto prazo. O resultado fiscal do ano está se mostrando melhor que o esperado pelo mercado, ainda que não seja nenhuma maravilha.”
Valor: Com a indicação de uma possível pausa no ciclo de alta de juros pelo Fed, o dólar tem se desvalorizado de forma generalizada. Esse movimento pode continuar?
Emerson Codogno: Faz sentido esse movimento de dólar fraco, principalmente frente a moedas de mercados desenvolvidos. Esse processo se iniciou com a crise bancária americana, quando o mercado fez uma reprecificação na curva de juros. Até então, o Fed tinha chegado a sinalizar que poderia levar [os juros] a 6% e até que poderia voltar a altas no ritmo de 0,5 ponto, mas, depois da crise, recuou e o mercado passou a precificar até queda de juros neste ano. Na Europa o movimento foi diferente, porque a situação da crise bancária foi resolvida lá de forma relativamente rápida. Vejo que o enfraquecimento do dólar faz sentido, principalmente em relação às moedas de [mercados] desenvolvidos, e o euro é um destaque. No caso dos emergentes, resta um pouco mais de dúvida.
Valor: Por quê?
Codogno: Normalmente, moedas emergentes têm uma ligação com crescimento mundial, porque muitos são produtores de commodities. Quando a crise [bancária] apareceu, tivemos um momento no mercado de risk-off [de fuga de ativos de risco]. Todo mundo zerando posição, chegando a piorar o desempenho de moedas emergentes em relação ao dólar. Mas, depois, a crise se mostrou menos aguda e as moedas emergentes começaram a andar. Foi esse movimento recente que vimos, com o dólar chegando a cair de R$ 5,30 para perto de R$ 5 aqui no Brasil.
Valor: Como a Genoa tem visto esse movimento do real?
Codogno: No caso do Brasil, tivemos uma ajuda local, em função da apresentação da regra fiscal. Teve um viés positivo, com diminuição do risco de cauda, como falou o presidente do Banco Central [Roberto Campos Neto]. A questão do descontrole de despesas ficou mais bem quantificada, porque, quando lemos essas novas regras fiscais, há alguma evolução em relação a outros governos do PT, no que se refere à questão das despesas. As exceções [do limite de gastos] caminham para ficar contidas ao que já havia no teto de gastos. Essa, então, tem sido uma surpresa positiva. A ressalva é como o governo vai conseguir fazer a recomposição de receitas para atingir o compromisso que estabeleceu. É uma melhora relevante terminar um governo com o resultado primário positivo, mas, para isso, estimamos que o governo precise de algo em torno de R$ 100 bilhões para recomposição das receitas.
Valor: Como esse cenário se reflete nas posições da Genoa em outras classes de ativos?
Codogno: Antes, nossa principal posição era aplicada em juros nominais [aposta na queda das taxas] e estávamos sem posições relevantes no real e em NTN-Bs. No entanto, temos visto uma atividade um pouco mais resiliente, um mercado de trabalho mais apertado e tivemos a indicação do Gabriel Galípolo para a diretoria de política monetária do BC, o que tira um risco de cauda do cenário. Uma vez definido o nome, o mercado tende a retirar aquela precificação de ser um cenário muito ruim, ou seja, tende a perder prêmio de risco. E, consequentemente, dado o cenário externo também, acreditamos que uma alternativa seria diminuir a posição aplicada em juros, que teve um desempenho muito bom e que andou bastante. O que fizemos foi alongar essa posição em juros nominais; aplicamos juros reais de longo prazo; e também começamos a vender dólar contra o real.
Valor: Pelas posições, ao menos no curto prazo, vocês estão mais otimistas com os ativos brasileiros
Codogno: Muito disso vem da questão fiscal, principalmente quando alongamos a nossa posição aplicada em juros. Temos a leitura de que o arcabouço fiscal não é a melhor regra possível, mas tira do cenário o risco de um descontrole fiscal absoluto. O cenário muito ruim que estava sobre a mesa não existe mais. E também estamos muito atentos aos dados de curto prazo. O resultado fiscal do ano está se mostrando melhor do que o esperado pelo mercado e, quando olhamos o comportamento da política fiscal de curto e de médio prazo, ela está significativamente melhor, ainda que não seja uma maravilha. Isso nos motivou a alongar nossas posições.
Valor: O fluxo comercial ajudou bastante o câmbio neste início de ano. É possível que isso continue a acontecer ao longo do ano?
Codogno: Enxergamos a questão do fluxo como algo neutro, que não chega a pesar para um lado ou para o outro nas nossas projeções. Não é uma grande preocupação. Foi algo que ajudou no começo do ano, que vai parar de ajudar, mas que não vai atrapalhar.
Valor: Há espaço para que os cortes na taxa de juros tenham início no segundo semestre?
Codogno: Estamos olhando mais para agosto e setembro. Temos que ter em mente alguns pontos. No caso das expectativas de inflação, acho que o Banco Central vai querer esperar um tempo após a definição do nível da meta de inflação para ver o impacto nelas. O BC vai precisar de algumas semanas para verificar se as expectativas se estabilizaram para ter alguma tranquilidade. Em função disso, achamos que uma queda nos juros é algo para ocorrer em setembro. Talvez em agosto, a depender de como as coisas vão se definir.
Fonte: Valor Econômico

