Ainda que o marco histórico dos 150 mil pontos atingido nesta segunda-feira seja um passo relevante para o Ibovespa, a pontuação não representa necessariamente o auge do otimismo, avalia Daniel Utsch, gestor de renda variável da Nero Capital. Ele lembra que, em 2008, quando o Brasil conquistou o grau de investimento, a bolsa local também alcançou máximas históricas, o que refletia o pico de confiança dos investidores no país. O momento atual, porém, “é completamente diferente”.
“É um movimento expressivo, mas, quando se amplia a janela de tempo, os ganhos não superam a inflação desde a máxima registrada em meados de 2021”, enfatiza. “O Ibovespa já deveria estar entre 60% e 70% acima do nível atual. A bolsa precisaria alcançar cerca de 300 mil pontos para realmente remunerar o investidor que comprou ações em 2019 ou em 2021, mas ainda estamos muito distantes disso”, completa.
Nos últimos cinco anos, o profissional da Nero destaca que o mercado de renda variável sofreu resgates expressivos. Embora o ritmo de saques tenha diminuído recentemente, o volume aplicado em fundos e ações permanece praticamente estável há cerca de um ano e meio.
“A indústria de fundos foi completamente castigada a nível de proporção dos investimentos. Quando se olha a composição do Ibovespa, anda tem efeito muito relevante, porque as empresas de setores mais ligados à economia doméstica foram muito mal: ou diminuíram a participação no índice ou saíram dele.”
O motivo, segundo Utsch, é que o investidor pessoa física não possuía, em média, ações que se destacaram nos últimos anos, como Weg ou Sabesp, na proporção do Ibovespa. Por isso, essa categoria de investidores não acumula retornos significativos — pelo contrário, muitos podem estar com prejuízos. “Provavelmente, eles tinham carteiras concentradas em varejistas e outras empresas de consumo, que foram muito mal. A carteira de um investidor médio que começou a investir em meados de 2021 ainda está 50% negativa, nominalmente, sem considerar a inflação”, explica.
O entusiasmo com a renda variável brasileira segue moderado, refletindo-se no volume financeiro do Ibovespa, que registra uma média de R$ 15,9 bilhões em 2025 — bem abaixo dos níveis observados nos últimos anos. Para o gestor da Nero, o rali recente do índice foi impulsionado principalmente por uma rotação global de carteiras, com investidores retirando recursos dos Estados Unidos e aplicando em mercados emergentes, ainda que em baixas proporções.
Nesse sentido, alguns fatores poderiam atuar como catalisadores para uma alta mais consistente, como a queda da Selic ou mudanças no cenário eleitoral. No entanto, ao comparar o desempenho brasileiro com o de outros emergentes, ele diz que os movimentos são praticamente idênticos. “Os gestores estão tentando ser um pouco criativos para comemorar, porque não há um sinal real de otimismo. A melhora existe, mas foi totalmente impulsionada por fatores externos”, completa.
Fonte: Valor Econômico

