.28 Mar 2024LUIZ GUILHERME GERBELLI GABRIEL HIRABAHASI/BRASÍLIA
A proposta apresentada pelo Ministério da Fazenda para aliviar as contas dos Estados não cria os incentivos necessários para que os governadores adotem medidas estruturais para resolver o dilema das contas públicas locais, de acordo com analistas consultados pelo Estadão.
Na terça-feira, a pasta apresentou um programa para refinanciar as dívidas dos Estados com o governo federal mediante o compromisso de investimentos no ensino médio técnico (EMT).
“É um tipo de saída muito complicada, porque não dá os incentivos corretos para os Estados reformarem o que precisam reformar, de ter uma agenda pelo lado dos gastos, de lidar com a rigidez dos gastos”, afirma Alessandra Ribeiro, economista e sócia da consultoria Tendências.
Batizado de Juros por Educação, o programa marca mais um capítulo nas várias vezes em que a União foi acionada pelos governadores para mitigar os problemas das contas públicas estaduais.
“Independentemente do mérito que é o gasto com educação, já é um modelo que admite que os Estados não vão se ajustar, porque vai se dar um alívio para gastar mais”, diz Marcos Mendes, pesquisador associado do Insper.
Outro ponto levantado pelos especialistas é que o Brasil já tem um gasto elevado com educação. “O Brasil até gasta mais do que a média da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico)”, diz Alessandra. O programa foi apresentado pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, a governadores do Sul e do Sudeste, que elogiaram a proposta.
Hoje, as dívidas dos Estados com a União são corrigidas pela Selic (a taxa básica de juros da economia) ou pela inflação mais 4%. Pelo novo programa, para os Estados que aplicarem ao menos 50% da economia proporcionada pela redução dos juros na ampliação de matrículas a taxa de juros será o IPCA mais 3% ao ano. Para os que aplicarem ao menos 75%, a taxa cai para o IPCA mais 2,5% ao ano. Por fim, para os que aplicarem 100%, a taxa cai para o IPCA mais 2%.
O governo estabeleceu um cronograma de 60 dias para chegar a um acordo com os Estados sobre a proposta, que também precisará passar pelo aval do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
MUDANÇA DE CENÁRIO. Em 2015 e 2016, na esteira da recessão enfrentada pelo País, muitos Estados deixaram de pagar servidores e ficaram sem recursos para concluir obras públicas. Nos últimos anos, no entanto, o quadro melhorou. Na pandemia, as transferências de recursos foram robustas e houve o congelamento de salários dos servidores. Ao mesmo tempo, os Estados se beneficiaram de uma recuperação mais rápida da atividade econômica e pelo aumento dos preços das commodities no cenário internacional.
Em maio de 2022, diante dessa conjuntura favorável, o superávit primário dos Estados chegou a R$ 102,3 bilhões, ou a 1,1% do PIB, de acordo com números do Banco Central compilados pelo Santander.
Os números mais recentes, no entanto, mostram um cenário bem diferente. Em janeiro deste ano, o superávit dos Estados recuou para R$ 30 bilhões, o que equivale a 0,2% do PIB.
“Os Estados aumentaram os gastos e os investimentos. Houve avanço nas reformas estruturantes ao longo dos últimos anos – com aprovação das reformas da Previdência e administrativa. Mas alguns precisam continuar nesse caminho”, afirma Ítalo Franca, economista do banco Santander. “O grande desafio é ter um ajuste mais estrutural para não ter problema mais à frente.” •
COLABORARAM FERNANDA TRISOTTO/SÃO PAULO
Fonte: O Estado de S. Paulo

